14 Abril 2020
Na semana passada, anunciamos que estaríamos coletando práticas e subsídios espirituais relacionados ao público LGBTQ que sejam particularmente significativos ou úteis durante a pandemia da Covid-19, quando as rotinas espirituais normais foram interrompidas.
A nota foi publicada em New Ways Ministry, 13-04-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Um recurso a compartilhar desde já é o site “Praying Eucharistically”, lançado recentemente pelo Pe. James Alison, um teólogo gay e proeminente defensor LGBTQ, que espera que ele ajude a levar a novas formas de comunidade em uma Igreja renovada.
Alison lançou o site em resposta ao distanciamento social que levou a maioria dos cristãos a abandonar os ritos comunitários no tempo mais santo do ano no cristianismo. Alison disse que as missas transmitidas pareciam “bizarramente clericais e sem sentido”, levando-o a “tentar algo um pouco mais ousado”.
O resultado é o site, atualizado semanalmente, que apresenta os textos necessários para celebrar a Eucaristia na tradição católica, uma homilia de Alison e algumas notas úteis sobre diferentes pontos da liturgia. Tudo isso se baseia na crença de que todos os cristãos são sacerdotes. Alison explica:
“Então, pareceu-me que poderia valer a pena colocar as minhas ordens presbiterais a seu serviço, oferecendo uma estrutura que permitisse uma nova forma de rezar eucaristicamente por parte de qualquer membro do sacerdócio (ou seja, todos nós batizados, lembremos) que queiram experimentar isso. Uma estrutura especialmente adaptada às circunstâncias exigentes destes dias, em que não é possível para a grande maioria dos fiéis de qualquer denominação participar presencialmente de uma liturgia presidida por um presbítero ou pastor ordenado. Essa nova forma de rezar eucaristicamente também será, espero, uma fonte de enriquecimento para o que quer que venha a surgir quando estas circunstâncias exigentes passarem.”
Uma parte do gesto de rezar eucaristicamente de novas formas significa reafirmar as pessoas queer, acrescentou Alison em um pós-escrito em que reconhecia sua própria orientação e compromisso com a criação de espaços seguros:
“P.S.: Isto não surpreenderá quem me conhece, mas eu acho que vale a pena dizer: este site e muitas das ferramentas de culto envolvidas são obra de um padre católico abertamente gay e de seus amigos. Você pode ter certeza de que não ouvirá nenhuma pregação homofóbica neste site – eu até tentarei o meu melhor do ponto de vista ecumênico para ser amigável aos heterossexuais. Estou tentando providenciar um espaço seguro a partir do qual, entre outros, cristãos gays e lésbicas possam rezar como somos. Se, no entanto, o fato de rezar na companhia de pecadores como nós lhe incomodar, então você pode encontrar outros sites mais adequados para as suas necessidades.”
Ser inclusivo neste projeto mais recente é algo típico do antigo compromisso de Alison com a igualdade LGBTQ na Igreja. Suas recentes intervenções têm chamado a questão da homossexualidade no sacerdócio de “elefante na sacristia” e convocado os leigos a ajudarem os padres gays a saírem da “armadilha da mentira”.
A luta e a reflexão teológica de Alison que têm desafiado o ensino da Igreja acabaram por deixá-lo em um limbo eclesial, exercendo o ministério somente às margens da Igreja. Até o ano passado.
Em 2019, Alison recebeu um telefonema do Papa Francisco, que restaurou o padre ao ministério. Ele refletiu sobre essa experiência em dezembro passado no blog Bondings 2.0 [disponível aqui, em inglês] e recentemente na revista U.S. Catholic também [disponível aqui, em inglês].
Alison reconheceu o escândalo causado pelo tratamento da Igreja às pessoas LGBTQ, citando estatísticas que apontam essa como a principal razão pela qual os católicos abandonaram a Igreja, mais do que a crise dos abusos sexuais.
Como resposta a esse escândalo, o teólogo voltou às pequenas comunidades de fiéis, semelhantes àquelas para as quais o site “Praying Eucharistically” pode ser um recurso:
“A presença real de Jesus em tais eucaristias, como algo que muitas vezes pode ser sentido e conhecido pelas pessoas reunidas, vai tão além da definição escolástica a ponto de ser surpreendente. Foi meu privilégio descobrir isso em primeira mão.”
Mais especificamente para as pessoas LGBTQ, Alison escreveu sobre a “Igreja dos confessores: aqueles que se mantiveram firmes em sua fé e a confessaram em meio à grande perseguição”, algo agora central nessa renovação da Igreja em novas formas de comunidade. Ele continuou:
“Essa grande perseguição ocorreu quando, durante um período de 35 anos, todo o peso da retórica odiosa foi brandido por uma Igreja aparentemente forte e triunfante, rica em certezas falsas, apóstolos falsos e uma liderança que agora sabemos que era extraordinariamente corrupta e covarde. No entanto, a ‘Igreja dos confessores’ teve que passar pelo árduo trabalho de aprender a distinguir entre o que era de Jesus e o que era do ódio hipócrita, e em um tempo em que não era tão óbvio quanto agora como a reação ao Vaticano II estava criando uma gigante miragem pintada com cafonices eclesiásticas.”
“Agora que a miragem explodiu, eu constato que, em todos os lugares que vou (e nos últimos meses eu estive com grupos maravilhosos no Peru, Chile e México, e estou descobrindo mais o tempo todo), as pessoas que já passaram pela perda de tudo o que gostavam em uma Igreja que não os consideravam como pessoas queridas são as que estão excelentemente bem posicionadas para iniciar a criação de novas formas de comunidade e de vida cristãs compartilhadas. E muitas, muitas pessoas heterossexuais – incluindo alguns maravilhosos pais católicos de filhos LGBT – descobriram que há honestidade e transparência fundamentais entre esses grupos. É um prazer compartilhar com eles a tranquila redescoberta do que é ‘ser Igreja’.”
Onde está o Papa Francisco em tudo isso? Alison disse que isso parece “inteiramente coerente” com a visão do papa de que “as periferias levarão o Evangelho para o centro” como parte de uma “nova descoberta do cristianismo”.
Alison é claro sobre a necessidade de espaços de fé afirmativos das pessoas LGBTQ e o dom que as pessoas e simpatizantes LGBTQ oferecem à Igreja em geral. O blog Bondings 2.0 espera que você compartilhe esses dons espirituais que trazem sentido e ajudam a sua vida durante a pandemia da Covid-19, não apenas como um recurso para a nossa comunidade, mas também para a Igreja em geral.
Pense de maneira ampla quando pensar em “práticas e subsídios espirituais”. Podem ser reflexões espirituais, livros, videoclipes, citações, músicas, fotografias, poemas, versículos das Escrituras, autores, memes, santos e outras pessoas inspiradoras, liturgias, oração e muito mais. Para enviar suas práticas e subsídios espirituais, use o formulário disponível aqui. O prazo para envio é esta quarta-feira, 15 de abril.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Pe. James Alison lança site para liturgias eucarísticas inclusivas para pessoas LGBTQ - Instituto Humanitas Unisinos - IHU