07 Agosto 2019
“Os EUA podem ter cometido um erro em sua escolha de estratégia para lidar com a China no comércio.”
O artigo é do sinólogo italiano Francesco Sisci, professor da Universidade Renmin, em Pequim, na China. O artigo foi publicado por Settimana News, 05-08-2019. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Para o governo de Pequim, a crise de Hong Kong está ganhando força e está chamando a atenção mundial com suas fortes imagens de jovens manifestantes desafiando policiais vestidos de preto. A greve geral do dia 5 de agosto foi, pelo menos em parte, um fracasso, mas à noite os manifestantes atacaram uma delegacia de polícia dando início a um incêndio. Muitos acreditam que a polícia pode intervir em breve para restaurar algum tipo de paz com consequências insondáveis.
Isso está ofuscando as negociações comerciais EUA-China, que há poucos dias manteve o mundo em suspense com suas enormes implicações. As negociações comerciais não foram bem-sucedidas, e não está claro se e quando haverá algum progresso. O renmimbi [moeda chinesa] subiu para 7 para cada dólar. Aparentemente, a China quer usar a desvalorização da sua moeda para compensar as novas tarifas. A Dow Jones reagiu em queda livre de 750 pontos, a maior queda em 2019.
Na verdade, como Edward Alden argumentou, os EUA podem ter cometido um erro em sua escolha de estratégia para lidar com a China no comércio.
Na verdade, existem três conjuntos de problemas entre os EUA e a China, além da questão da tecnologia da internet que paira sobre os três:
1. Comércio: acesso ao mercado, apoio estatal às indústrias, dumping, dívidas, transparência do mercado financeiro, roubo de DPI [direitos de propriedade intelectual];
2. Direitos humanos e transparência política: liberdade religiosa; direitos das minorias, incluindo muçulmanos e cristãos; mais opacidade política, liberdade para defensores dos direitos humanos, falta de democracia;
3. Estratégico-militar: questões de fronteira com vizinhos, desenvolvimento militar;
4. Ciberespaço: novos desafios de segurança, desenvolvimento tecnológico, 5G e futuro 6G, novas dimensões de negócios e segurança.
Esses problemas são específicos para os EUA e a China. Mas a China não tem só esse tipo de problemas com os EUA. Além disso, esses problemas estão interligados. Até meados de junho de 2018, a China subestimou a importância das negociações comerciais. No entanto, assim que os líderes chineses perceberam a sua importância, Pequim também começou a compreender que o comércio não era uma preocupação isolada, como ocorreu com as discussões comerciais com a Alemanha ou o Japão, mas tinha consequências extensas para as outras áreas listadas acima.
Além disso, há consequências mais graves para o comércio e a economia globais, afetando, assim, a China também. Se a China impedir um acordo, grande parte da atual ordem econômica e comercial cairá e entrará em colapso, já que o desacoplamento comercial da China com os EUA perturbaria todo o comércio global (que está centrado nas regras dos EUA) por causa do tamanho da China. Ou seja, a China se colocaria contra a maior parte do mundo, ou pelo menos contra grande parte do PIB global. Por causa do tamanho do desafio, isso seria muito ruim para a China, enquanto “China contra EUA” já seria muito ruim para Pequim.
A China também não espera ganhar muito mais tempo para se mover de um jeito ou de outro em questões comerciais e outras. As manifestações de Hong Kong têm uma dinâmica própria, e a narrativa, que está além do controle de qualquer governo, poderia obrigar o mundo em breve a escolher o seu lado entre a polícia local e os manifestantes, apropriando-se, assim, do que quer que seja que o governo dos EUA (que é diferente dos EUA em geral) queira conquistar com a China, e vice-versa para o governo chinês. Algo tem que ocorrer rapidamente; algum acordo mínimo sobre o comércio seria melhor, pelo menos jogaria um pouco de água no fogo.
Tudo é ruim para todos – para os EUA, mas especialmente para a China, que tem uma economia menor e está politicamente mais isolada do que os EUA. Talvez Pequim deveria começar a pensar fora da sua caixa tradicional e se concentrar em enfrentar todas essas questões de maneira criativa e em coordenação com o mundo.
Aqui há duas instituições que estão em uma posição mais neutra em relação a ambos os lados: a ONU ou a Santa Sé. A influência da ONU, infelizmente, tem diminuído ao longo dos últimos 30 anos. Enquanto isso, a Santa Sé está ganhando mais credibilidade em todo o mundo. É uma instituição religiosa, mas também é altamente reconhecida por sua autoridade. Ela poderia dar uma mão para encontrar algumas soluções para todos os problemas atuais.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Uma série de problemas para EUA e China. Artigo de Francesco Sisci - Instituto Humanitas Unisinos - IHU