25 Janeiro 2019
Uma mudança rápida. Lima tem novo arcebispo, um sacerdote diocesano. Chama-se Carlos Gustavo Castillo Mattasoglio e é o novo primaz do Peru. O Papa aceitou hoje a renúncia (por limite de idade) apresentada pelo cardeal Juan Luis Cipriani Thorne, há apenas 29 dias. Uma mudança rapidíssima, fora de todo protocolo e que esconde situações alheias, por exemplo, à saúde do purpurado. Com a chegada do novo pastor, prenuncia-se uma mudança de 180 graus no estilo pastoral na Igreja de Lima.
A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi, publicada por Vatican Insider, 25-01-2019. A tradução é do Cepat.
Nascido no dia 28 de fevereiro de 1950, na capital peruana, o novo arcebispo recebeu a ordenação sacerdotal no dia 15 de julho de 1984 pelas mãos do cardeal Juan Landázuri Ricketts. Estudou sociologia na Universidade Nacional Maior de São Marcos e conta com uma licenciatura e um doutorado em teologia, ambos pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma.
Foi vigário paroquial em vários templos e responsável das paróquias Virgem Medianeira (2002-2009) e São Lázaro (2010-2015). Atuou como responsável arquidiocesano da pastoral universitária, vigário para a pastoral juvenil, organizador do vicariato para a juventude e responsável pela pastoral vocacional, entre outras coisas.
Na atualidade, atua como docente principal, em tempo integral, na Pontifícia Universidade Católica do Peru (PUCP), onde oferece as disciplinas Revelação de Deus na história, Teologia 1 e Teologia 2. É autor, além disso, de alguns livros entre os quais se destacam: Libres para creer: La conversión según Bartolomé de las Casas en la historia de las Indias (1993), Joven, a ti te digo: Levántate (1996), Teología de la regeneración (2001, com edição em italiano) e La Opción por los jóvenes en Aparecida (2009).
A notícia da mudança de direção havia vazado nas últimas horas e, no Peru, os principais meios de comunicação faziam notar a evidente mudança de tom na arquidiocese primaz. Destacam, sobretudo, as diferenças entre Castillo Mattasoglio e Cipriani, que sai de cena após 20 anos conduzindo a Igreja em Lima.
Este último, inegável figura do episcopado peruano, membro da prelatura do Opus Dei e integrante do Conselho de Economia do Vaticano, tornou-se primaz graças à nomeação que recebeu do Papa João Paulo II, no dia 9 de janeiro de 1999. Antes havia sido, primeiro, bispo auxiliar de Ayacucho (1988) e, depois, arcebispo auxiliar titular nessa diocese, a partir de 1991. O próprio pontífice polonês o fez cardeal no dia 21 de janeiro de 2001.
É lembrado como uma figura midiática por várias de suas intervenções públicas. Entre elas, sua participação como mediador no assalto perpetrado pela organização terrorista Movimento Revolucionário Tupac Amaru (MRTA) à embaixada do Japão no Peru. Um episódio ocorrido em dezembro de 1996 e relatado em seu livro Doy fe (2012). Seguido e questionado igualmente, caracterizou-se por ser um bispo incômodo. Duramente criticado por sua proximidade com o ex-presidente Alberto Fujimori (ainda preso por corrupção), a quem defendeu em várias ocasiões.
Não obstante seu protagonismo, esteve longe de “hegemonizar” a Conferência do Episcopado Peruano, como alguns órgãos informativos próximos ao Vaticano escreveram, nas últimas horas, em Roma. Nunca foi presidente desse corpo episcopal. Foram notáveis suas desavenças com alguns de seus responsáveis, como o jesuíta Luis Bambarén Gastelumendi e Miguel Cabrejos Vidarte.
Como arcebispo promoveu uma exitosa Marcha pela Vida, uma manifestação que se repete todos os anos e que chegou a reunir mais de 500.000 pessoas. Durante boa parte de seu episcopado enfrentou o conflito na Pontifícia Universidade Católica do Peru (PUCP), cujos dirigentes se rebelaram contra sua autoridade e acabaram sendo desconhecidos pela Santa Sé, que lhes proibiu o uso dos títulos de “pontifícia” e “católica”. Uma controvérsia civil e canônica que durou anos e que se solucionou somente com a chegada ao papado de Jorge Mario Bergoglio, que ordenou recuar na proibição e enviou Giuseppe Versaldi para encontrar uma saída.
A crise na PUCP e outras situações explosivas, entre elas sua proximidade com o Sodalício de Vida Cristã (cujo fundador, Luis Fernando Figari, cometeu abusos de todo tipo), desgastaram a imagem pública do cardeal. No ponto mais alto do conflito com a universidade, Cipriani revogou as permissões para lecionar teologia a todos os docentes, entre eles a seu sucessor Carlos Gustavo Castillo Mattasoglio. A posterior intervenção vaticana devolveu essas licenças e retirou a casa de estudos do âmbito de influência do arcebispado limenho.
A mudança de rumo na arquidiocese primaz do Peru parecia inevitável e consolida uma tendência nas nomeações episcopais realizadas pelo Papa argentino. Exemplos sobram: Bolonha, Chicago, Madri, Cidade do México, La Plata. Todas estas são demarcações eclesiásticas fundamentais, de grande extensão e peso. Em todas elas, Francisco colocou homens com um perfil e com uma missão muito precisos: expoentes da “Igreja em saída”, que ele mesmo prega. Eles substituíram a notáveis bispos “conservadores”. Além disso, suas transições não foram simples e geraram numerosas resistências. Situação que, previsivelmente, se repetirá em Lima.
Jorge Mario Bergoglio conta com homens de confiança no episcopado peruano, capazes de lhe sugerir e lhe orientar na hora de escolher bispos. O mais destacado deles é Pedro Barreto, arcebispo de Huancayo, a quem o próprio pontífice elevou à dignidade de cardeal.
O verdadeiramente chamativo é a velocidade com a qual o Papa Francisco aceitou a renúncia de Cipriani. Considerando que não tem problemas de saúde, a tradição estabelece uma espera prudencial de – ao menos – vários meses. Outros cardeais permaneceram em seus postos até mesmo durante anos, antes que o Pontífice ratificasse suas renúncias. Um exemplo recente é o do cardeal Norberto Rivera Carrera, cuja renúncia como arcebispo de Cidade do México foi aceita seis meses após sua apresentação e foi rotulada como rápida por acreditados observadores do Vaticano.
No caso do arcebispo limenho de saída, passaram-se apenas 29 dias desde que enviou a Roma sua carta de saída, no dia 28 de dezembro passado, quando completou os 75 anos. Segundo a lei fundamental da Igreja católica, o Código de Direito Canônico, nessa idade todos os bispos devem apresentar suas renúncias e esperar o que for determinado pelo pontífice. Contudo, para escolher um sucessor, é necessário um processo de consulta que dura de quatro a seis meses, no mínimo.
É ponderável que a mudança para Lima não tenha sido precipitada e que conta com semanas de preparação. A última vez que Cipriani esteve em Roma foi em novembro de 2018, justamente nos mesmos dias em que ocorreu uma cerimônia convocada para o condecorar “por seu destacado serviço em defesa da vida”. Em seu lugar, compareceu à premiação o bispo auxiliar de Lima, Adriano Tomasi. Ainda que não tenha sido incluída nas agendas papais públicas desses dias, várias fontes confirmaram ao Vatican Insider que o cardeal foi recebido – então – pelo Pontífice em particular. No momento, o motivo daquela reunião permanece desconhecido, mas ninguém pode descartar que logo se tornem conhecidos os detalhes. Talvez por meio de uma bomba informativa.
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Peru. Com rapidez, Papa substitui cardeal Cipriani, arcebispo de Lima - Instituto Humanitas Unisinos - IHU