27 Março 2018
Na noite de 4 de Abril de 1968, aos trinta e nove anos, Martin Luther King Jr., liderança carismática e decisiva para o sucesso do movimento pelos direitos civis nos Estados Unidos, estava em Memphis para dar apoio a uma greve de trabalhadores negros da limpeza urbana e encontrou a morte, assassinado a tiros por James Earl Ray na sacada do Lorraine Motel.
A reportagem é de de Gabriel Santoro, publicada por Il Messaggero, 26-03-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.
Cinquenta anos atrás, desaparecia assim não só o homem que liderou várias campanhas de desobediência civil, mas o principal estrategista, teórico, interprete e ícone da luta contra o racismo e a desigualdade nos Estados Unidos. A viúva Coretta Scott King nos lembra que o marido, que se tornou o que ele queria, um pregador batista em uma grande congregação urbana no sul dos Estados Unidos, transmitiu para os afro-americanos, principalmente uma nova e grande consideração pela própria dignidade e a consciência de um poder político até então desconhecido para os negros. E King Jr. também sabia falar com os brancos, como em 28 de agosto de 1963, quando animou duzentas mil pessoas na Marcha sobre Washington por liberdade e trabalho, que como esperado passou para a história como a maior demonstração pela liberdade em seu próprio país que ele sonhava unido.
Martin Luther King Jr. tinha amadurecido em tenra idade as consciências e políticas e sociais através do exemplo de seus pais, que abominavam a segregação na esteira de uma resistência radicada no combate ao racismo das leis Jim Crow. O pai, Martin Luther King Sr., também pastor batista, de quem o filho admirava o verdadeiro espírito cristão, foi presidente da National Association for the Advance of Colored People de Atlanta.
"Sabemos por experiência dolorosa que a liberdade nunca é voluntariamente dada pelos opressores, deve ser exigida pelos oprimidos", escreveu o Pastor Martin Luther King Jr. naquele documento fundamental que é a Carta da prisão de Birmingham. Em abril de 1963 King Jr, preso por violar a lei proibindo manifestações de protesto em Birmingham, a maior cidade industrial do Sul e símbolo de lutas muito duras, disse ao seu país e ao mundo que o tempo de espera havia terminado: "Esperamos por mais de trezentos e quarenta anos os nossos direitos naturais garantidos pela Constituição". Ele usou essa carta para responder aos que o censuravam pela ação: "A justiça demasiado atrasada é justiça negada".
Ele em sua Atlanta natal, onde vigorava um rigoroso regime de segregação, aos quatorze anos, se não fosse pela preocupação do professor Bradley com que estava viajando de volta de Dublin, muito antes de Rosa Parks não teria cedido seu lugar no ônibus a um branco. Ele ficou furioso por esse absurdo: o motorista os obrigou a ficar em pé no corredor do ônibus por cento e quarenta quilômetros.
No quinquagésimo aniversário do assassinato de King Jr., assassinado quatro anos após a atribuição do Prêmio Nobel da Paz, as razões da luta pelo sonho de plena igualdade política, econômica e social que animou o Movimento pelos direitos civis não estão esgotadas. O racismo está vivo. Em 4 de abril haverá muitas celebrações como o evento comemorativo principal justamente no Lorraine Motel, que hoje é o Museu Nacional dos Direitos Civis. Essa comemoração é particularmente esperada no atual clima social turbulento, marcado pelo redespertar do suprematismo branco e de formas de discriminação e tensões raciais nunca totalmente desaparecidas.
Como aconteceu em Birmingham, em 1º. de fevereiro de 1965 King Jr., recém condecorado com o Nobel e após a aprovação em 1964 da Lei dos Direitos Civis, foi preso junto com outras duas centenas de pessoas em Selma, no Alabama, onde o protesto visava o direito voto negado. A tal respeito escrevia justamente
Teju Cole, "Selma é um reflexo assustador da América branca que já existiu. Mas vamos dizê-lo: que ainda é. Selma hoje é pobre, segregada e deprimida". Em Baltimore nascer em dois bairros que estão distantes menos de três milhas é equivalente a uma diferença de dezenove anos na expectativa de vida: 84 em Roland Park, 65 em Downtown/ Seton Hill. O mesmo abismo que divide o Japão do Iêmen.
Malcolm X defendia que a principal causa do preconceito racial era em grande parte dependente do sistema escolar americano. Na infância, o principal companheiro de brincadeiras de King Jr. era um garoto branco da mesma idade. E na autobiografia, editada pelo estudioso Clayborne Carson, encontramos justamente no tempo da escola o momento da ruptura: "Sempre nos sentimos livres para compartilhar todos os nossos divertimentos infantis. Aos seis anos nós dois começamos a escola: evidentemente, em duas escolas distintas. Lembro-me que a nossa amizade começou a se estragar bem nessa época. O clímax chegou no dia em que ele me disse que seu pai tinha lhe ordenado para não brincar mais comigo. Eu jamais esquecerei o trauma violento".
Como poder amar alguém que o odiava e segregava desde a infância pela cor da pele diferente? Nessa questão há o legado do Reverendo, que, usando as suas palavras, durante os anos de formação encontrou na filosofia de resistência não-violenta defendida por Gandhi aquela satisfação intelectual e moral que não tinha conseguido encontrar em nenhum outro lugar. É inevitável a dimensão religiosa, espiritual da figura de King Jr, que em 8 de maio de 1951 formou-se em teologia no seminário de Crozer.
Ele sabia reconhecer os limites da ação diante de desafios complexos, sabia elaborar a derrota, mas um sonho que desvanecia ou uma batalha perdida nunca equivaliam a uma rendição.
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Luther King, o sonho ainda está vivo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU