Reconhecer a luz no meio da obscuridade. Comentário de Ana Casarotti

Foto: canva

15 Novembro 2024

A leitura que a Igreja propõe neste domingo é o Evangelho de Jesus Cristo segundo Marcos 13,24-32 que corresponde ao 33° Domingo do Tempo Comum, ciclo B do Ano Litúrgico. O comentário é elaborado por Ana Maria Casarotti, Missionária de Cristo Ressuscitado.

Naquele tempo, Jesus disse a seus discípulos: “Naqueles dias, depois da grande tribulação, o sol vai se escurecer, e a lua não brilhará mais, as estrelas começarão a cair do céu e as forças do céu serão abaladas. Então vereis o Filho do Homem vindo nas nuvens com grande poder e glória. Ele enviará os anjos aos quatro cantos da terra e reunirá os eleitos de Deus, de uma extremidade à outra da terra. Aprendei, pois, da figueira esta parábola: quando seus ramos ficam verdes e as folhas começam a brotar, sabeis que o verão está perto. Assim também, quando virdes acontecer essas coisas, ficai sabendo que o Filho do Homem está próximo, às portas. Em verdade vos digo, esta geração não passará até que tudo isto aconteça. O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não passarão. Quanto àquele dia e hora, ninguém sabe, nem os anjos do céu, nem o Filho, mas somente o Pai”.

O relato do Evangelho deste domingo é do 13º capítulo do Evangelho de Marcos. Nele, o evangelista procura incentivar a fidelidade das comunidades cristãs a um Jesus que está prestes a ser crucificado. É importante contextualizar o texto que lemos neste domingo dentro de um discurso que deve ser interpretado com uma perspectiva esperançosa, com otimismo em relação ao que está sendo construído. Antes da nossa história, Jesus prediz a destruição das instituições judaicas – simbolizada pela grandiosidade do Templo –, adverte sobre os falsos messias, sobre a violência política e econômica e sobre a perseguição daqueles que procuram fazer o bem. A presença de Deus nessa dura realidade é destacada, incentivando a esperança, a confiança e, apesar das dificuldades, convidando-nos a seguir Jesus e a construir o reino de Deus.

O texto apresenta a vinda do Filho do Homem, precedida por uma grande tribulação, e o faz em uma linguagem típica da literatura profética e apocalíptica. Vai ocorrer uma mudança importante, de tal magnitude que se reflete nos eventos naturais, no sol, na lua, nas estrelas: “o sol vai se escurecer, e a lua não brilhará mais, as estrelas começarão a cair do céu e as forças do céu serão abaladas”. A vinda do Filho do Homem não passa despercebida e gera mudanças importantes na história. Mas, em meio a tudo isso, Jesus nos ensina a reconhecer a vida que está germinando.

No primeiro século, as comunidades cristãs estavam passando por perseguições, mudanças de paradigmas, dificuldades e o desânimo batia à porta de muitas delas, convidando-as a abandonar a fé. Isso acontece com a comunidade que recebe essas palavras de Jesus e é por isso que Ele os incentiva a reconhecer a vida que está surgindo: “Aprendei, pois, da figueira esta parábola: quando seus ramos ficam verdes e as folhas começam a brotar, sabeis que o verão está perto”. De maneira clara e simples, Jesus nos ensina a reconhecer a vida que está germinando, a novidade que está despertando. A maneira de desestimular a vida nas pessoas é fechar a porta de saída, obstruindo a entrada do ar novo que está nascendo, de modo que as pessoas se fechem em seu ambiente seguro. Dessa forma, qualquer iniciativa de mudança, de novidade, é deslocada, porque tentam obscurecer a visão com o que está acontecendo: muitas notícias sobre o “abominável” que acontece ao nosso redor e em outros lugares e pouca informação sobre a vida que está surgindo. Essas são formas de manipular a comunicação e o conteúdo que as diferentes populações recebem a fim de mantê-las “fechadas no seu espaço seguro”.

Neste domingo, Jesus nos convida a não ficarmos atordoados com as dificuldades, com as guerras que testemunhamos constantemente e com os drones carregados de morte que, infelizmente, caem sobre comunidades inteiras. Sabemos de todas as coisas ruins que acontecem do outro lado da terra. Conhecemos em detalhes cada movimento de injustiça, de políticas falsas, sabemos sobre a falsidade de certas palavras e comportamentos. Mas tudo isso chega até nós como uma nuvem que cobre o brilho do sol e nos imobiliza. São notícias que procuram relatar apenas uma parte do que está acontecendo e, dessa forma, obscurecem a luz da esperança. Mas Jesus nos chama a levantar os olhos para reconhecer onde surgem os sinais de vida. Como se diz popularmente: olhar para a parte cheia do copo e não apenas para a parte vazia.

Nós nos perguntamos: até onde vai o nosso olhar? Se tivermos uma visão curta, nossa esperança também será limitada... e não faremos parte de algo que trará mudanças.

Estamos submersos na escuridão, onde não há sol nem estrelas para nos guiar. O Evangelho de hoje nos convida a ampliar nosso horizonte, a reconhecer os sinais de vida, a não permanecer sob a falsidade de um monstro impossível de mudar, mas a aprender a olhar para a vida que está germinando.

Fazemos nossas as palavras de Dom Mauro Morelli: “A minha visão é esta: as mudanças só virão – sempre vieram – lá de baixo, das comunidades, das periferias e do mundo dos descartados. Eu sou testemunha disso. Durante a ditadura, antes que a classe média acreditasse no que estava acontecendo – só acordaram depois que mataram o (Vladimir) Herzog, lá na periferia tinha tanta gente que já vivia numa garra imensa, sonhando, buscando e marcando presença na esperança do amanhecer do novo”. Pastor das periferias e dos descartados. Entrevista com Dom Mauro Morelli.

Neste domingo que celebramos a oitava edição da Jornada Mundial dos Pobres, deixemo-nos desafiar por essas palavras de Jesus e perguntemo-nos pessoalmente e como comunidade: Podemos reconhecer os sinais de vida que surgem ao nosso redor e nos diferentes ambientes em que estamos? Somos comunidades que saem dos muros da sua segurança em busca do encontro com os mais pequenos e necessitados, lá onde a vida está brotando?

Lembremos que a Jornada Mundial dos Pobres “é uma oportunidade para tomar consciência da presença dos pobres em nossas cidades e comunidades e compreender suas necessidades. Como sempre, o Papa também menciona os 'novos pobres', que surgem da violência das guerras, da 'má política feita com as armas' (n. 4), que provoca muitas vítimas inocentes. Não nos esqueçamos, no entanto, dos voluntários que, em nossas cidades, continuam dedicando grande parte de seu tempo a ouvir e apoiar os mais pobres. São rostos concretos que, com seu exemplo, ‘dão voz à resposta de Deus’ à oração de quem se dirige a Ele” (n. 7). A Jornada Mundial dos Pobres é também uma oportunidade para lembrar a cada um deles e agradecer ao Senhor. Francisco almoçará com 1.300 pessoas necessitadas no âmbito da VIII Jornada Mundial dos Pobres

Deixemos ressoar na nossa vida e nas nossas comunidades o lema desta jornada: “A oração dos pobres se eleva a Deus” (cf. Eclesiástico 21,5).

 

Leia mais