08 Mai 2020
Publicamos aqui o comentário de Enzo Bianchi, monge italiano fundador da Comunidade de Bose, sobre o Evangelho deste 5º Domingo de Páscoa, 10 de maio de 2020 (João 14,1-12). A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Nos últimos domingos do Tempo Pascal, ouvimos algumas palavras extraídas dos “discursos de despedida” do quarto Evangelho, proferidos por Jesus ao término da sua última ceia com os discípulos. Por meio desses discursos, o Senhor glorioso ressuscitado e vivo fala conosco, com palavras que condensam toda a mensagem do Evangelho e lançam uma ponte entre a vida terrena de Jesus e a sua vinda na glória.
A separação entre Jesus e seus “amigos” (cf. Jo 15,13-15) está próxima, e ele acaba de pré-anunciar a traição de Judas (cf. Jo 13,21) e a negação de Pedro (cf. Jo 13,38). Para que os discípulos não se entristeçam diante da separação, Jesus se dirige a eles com grande ternura – “Não se perturbe o vosso coração” – e os convida à fé: “Tendes fé em Deus, tende fé em mim também”.
Jesus já havia dito que a verdadeira obra agradável a Deus é a fé (cf. Jo 6,29); aqui, em um contexto de crise para a sua comunidade, desorientada diante do futuro que a espera, ele fortalece novamente a sua confiança com uma promessa: “Na casa de meu Pai há muitas moradas. Vou preparar um lugar para vós”.
Jesus está prestes a entrar na casa do Pai, o Reino, mas primeiro promete aos seus discípulos que a separação deles será apenas temporária: “Quando eu tiver ido preparar-vos um lugar, voltarei e vos levarei comigo, a fim de que onde eu estiver estejais também vós”.
Eis a grande consolação reservada àqueles que aderem a Jesus e vivem com ele uma relação de intimidade: nada nem ninguém pode tirá-los da sua mão (cf. Jo 10,28-29), já agora e depois no fim dos tempos, quando ele vier na glória e os levará consigo.
Mas Jesus sabe muito bem que não basta indicar a meta, é preciso também mostrar o caminho para alcançá-la. Por isso, acrescenta: “Para onde eu vou, vós conheceis o caminho”.
Mas Tomé não compreende e lhe pergunta: “Senhor, nós não sabemos para onde vais. Como podemos conhecer o caminho?”. Porém, precisamente ele, pouco antes, havia exortado os outros discípulos a caminharem com Jesus, a irem morrer com ele (cf. Jo 11,16)... Jesus então lhe responde: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vai ao Pai senão por mim”.
Essas palavras tão solenes expressam a singularidade do cristianismo: desde que Deus se fez homem em Jesus, esse homem abriu um caminho único para ir a Deus; agora, para conhecer a Deus, deve-se conhecer Jesus; para crer em Deus, deve-se crer em Jesus.
A verdade é uma pessoa, Jesus Cristo: é ele quem, com a sua vida, nos mostrou o caminho a ir ao Pai, portanto o caminho é o modo de viver de Jesus, e, vivendo como ele, nós podemos participar da sua vida, que é vida verdadeira em plenitude, “vida eterna”!
É por isso que, logo depois, a Filipe, que lhe pergunta: “Mostra-nos o Pai, isso nos basta”, Jesus responde: “Quem me viu, viu o Pai (...) eu estou no Pai e o Pai está em mim”.
“Quem vê Deus, morre” (cf. Ex 33,20), diz o ditado bíblico: esse é o modo para expressar a santidade de Deus, a verdade do Deus que não pode receber um rosto do homem, mas que eleva, ele mesmo, o véu sobre si.
O fiel do Antigo Testamento pede repetidamente a Deus que lhe mostre o seu rosto, esse é o desejo mais profundo que o habita: é o pedido de Moisés (cf. Ex 33,18), é a invocação do salmista (cf. Sl 43,3); porém, o rosto de Deus aparece além da morte...
Mas a humanização de Deus em Jesus tornou possível essa visão, de modo que o prólogo do quarto Evangelho pôde afirmar: “Ninguém jamais viu a Deus; o Filho único foi quem o contou” (cf. Jo 1,18). Sim, Jesus é o último e definitivo relato de Deus, e quem vê o rosto de Jesus vê o Pai.
Mas o que os discípulos viam senão um homem, nada mais do que um homem, que com a sua vida contava Deus? Aqueles que viram Jesus viver e morrer daquele modo tiveram que crer que aquele homem havia realmente narrado Deus: e Deus, ressuscitando-o dos mortos, declarou que, na existência vivida por Jesus, havia sido dito tudo o que era essencial para conhecê-lo.
Quando o nosso Deus quis se revelar completamente, sem opacidade, ele o fez em um homem, Jesus, “a imagem do Deus invisível” (Col 1,15): essa é a nossa fé firme e o caminho pelo qual vamos ao encontro do Senhor Jesus, à espera da sua vinda na glória, quando ele nos levar consigo.
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