22 Outubro 2016
Foi o que o pontífice disse ao receber em audiência os participantes de um congresso de pastoral vocacional. A advertência: "Não reduzir a fé a um livro de receitas ou a um conjunto de normas a serem observadas". Aos bispos: vigilantes e prudentes em relação a quem entra no seminário.
A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi, publicada no sítio Vatican Insider, 21-10-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
"Confesso-lhes que eu sempre tenho um pouco de medo ao usar algumas expressões comuns da nossa linguagem eclesial..." O papa iniciou assim a audiência aos participantes de um congresso de "pastoral vocacional" promovido no Vaticano pela Congregação para o Clero.
"É bonito que vocês tenham vindo aqui, de muitas partes do mundo, para refletir sobre esse tema, mas, por favor, que tudo não acabe com um belo congresso!", disse Francisco, que exortou os bispos a não se fecharem "na fortaleza segura da casa paroquial, da sacristia ou do grupo restrito dos 'fidelíssimos'", a acompanhar as pessoas "sem se apossarem da sua consciência, nem pretender controlar a graça de Deus", sem "rótulos" nem "superficialidades", e a vigiar, sem "leviandade ou superficialidade", para que, no seminário, entrem pessoas que possam se tornar sacerdotes "maduros e equilibrados" e sem "reduzir a fé a um livro de receitas ou a um conjunto de normas a serem observadas".
O tema do congresso retoma o lema episcopal de Jorge Mario Bergoglio, tirado das "Homilias de São Beda, o Venerável, sacerdote", que, comentando o episódio evangélico da vocação de São Mateus, escreve: "Vidit ergo lesus publicanum et quia miserando atque eligendo vidit, ait illi Sequere me" (Viu Jesus um publicano e, olhando-o com sentimento de amor e escolhendo-o, disse-lhe: Segue-me).
"Vocês sabem, eu já disse isto outras vezes, que eu escolhi esse lema fazendo memória dos anos juvenis em que senti fortemente o chamado do Senhor: não aconteceu depois de uma conferência ou por uma bela teoria, mas por ter experimentado o olhar misericordioso Jesus sobre mim."
A partir do relato evangélico do publicano Mateus, o papa fez três indicações: "Antes, Jesus sai de novo para pregar, depois vê Levi sentado no banco dos impostos e, por fim, o chama. Podemos nos deter sobre esses três verbos, que indicam o dinamismo de toda pastoral vocacional: sair, ver, chamar".
Acima de tudo, "a pastoral vocacional precisa de uma Igreja em movimento, capaz de alargar as próprias fronteiras, medindo-as não a partir da estreiteza dos cálculos humanos ou do medo de errar, mas a partir da medida larga do coração misericordioso de Deus".
Nesse sentido, "devemos aprender a sair da nossa rigidez, que nos torna incapazes de comunicar a alegria do Evangelho, das fórmulas padronizadas que muitas vezes são anacrônicas, das análise preconcebidas que encaixotam a vida das pessoas em esquemas frios. Peço isso especialmente aos pastores da Igreja, aos bispos e aos sacerdotes: vocês são os principais responsáveis pelas vocações cristãs e sacerdotais, e essa tarefa não pode ser relegada a um escritório burocrático".
Portanto, é preciso sair: "Ouvindo os jovens – é preciso paciência, hein – vocês podem ajudá-los a discernir os movimentos do seu coração e a orientar os seus passos. É triste quando um padre vive apenas para si mesmo, fechando-se na fortaleza segura da casa paroquial, da sacristia ou do grupo restrito dos 'fidelíssimos'. Ao contrário, somos chamados a ser pastores no meio do povo, capazes de animar uma pastoral do encontro e de passar tempo para acolher e ouvir a todos, especialmente os jovens".
Depois, é preciso lembrar, recomendou o papa, que, "ao passar pelas ruas, Jesus para e cruza o olhar do outro, sem pressa". O publicano Mateus "não recebeu sobre si um olhar de desprezo ou de julgamento, mas se sentiu olhado dentro com amor. Jesus desafiou os preconceitos e os rótulos das pessoas; criou um espaço aberto, em que Mateus pôde rever a própria vida e iniciar um novo caminho. Assim eu gosto de pensar o estilo da pastoral vocacional. E, permitam-me, do mesmo modo, eu imagino o olhar de cada pastor: atento, não apressado, capaz de parar e ler em profundidade, de entrar na vida do outro sem nunca fazê-lo se sentir nem ameaçado nem julgado. É um olhar, o do pastor, capaz de suscitar estupor pelo Evangelho, de despertar do torpor em que a cultura do consumismo e da superficialidade nos imerge e de suscitar perguntas autênticas de felicidade, especialmente nos jovens. É um olhar de discernimento – ressaltou o papa – que acompanha as pessoas, sem nem se apossar da sua consciência, nem pretender controlar a graça de Deus".
O olhar, enfatizou Francisco, deve ser "atento e vigilante e, por isso, chamado constantemente a se purificar. E, quando se trata das vocações sacerdotais e do ingresso no seminário, peço-lhe para fazer discernimento na verdade, para ter um olhar astuto e cauteloso, sem leviandades ou superficialidades. Digo isso em particular aos irmãos bispos: vigilância e prudência. A Igreja e o mundo – salientou o papa – precisam de sacerdotes maduros e equilibrados, de pastores intrépidos e generosos, capazes de proximidade, escuta e misericórdia". Palavras proferidas no dia em que, em Palermo, um sacerdote foi preso sob a acusação de violência sexual.
Por fim, destacou o papa, "Jesus não faz longos discursos, não entrega um programa para se aderir, não faz proselitismo, nem oferece respostas pré-confeccionadas. Voltando-se para Mateus, Ele se limita a dizer: 'Segue-me!'", porque o Seu desejo é "pôr as pessoas a caminho, movê-las de um sedentarismo letal, romper a ilusão de que é possível viver felizmente permanecendo comodamente sentado entre as próprias seguranças".
Assim, "nós também, em vez de reduzir a fé a um livro de receitas ou a um conjunto de normas a serem observadas – enfatizou o papa – podemos ajudar os jovens a se fazerem as perguntas certas, a se porem a caminho e a descobrirem a alegria do Evangelho".
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Papa: "É triste quando um padre vive fechado na fortaleza da casa paroquial" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU