18 Abril 2016
"Os habitantes de Lampedusa, de Lesbos e das outras regiões hospitaleiras do Mediterrâneo abrem as suas casas e os seus corações aos nossos irmãos e irmãs, seguindo o exemplo dos santos da Igreja", destaca o Patriarca Ecumênico Bartolomeu. Mais alta autoridade religiosa do mundo ortodoxo, Bartolomeu estará neste sábado em Lesbos junto com o papa, para encontrar os migrantes e os habitantes da ilha. Uma visita que, de acordo com Bartolomeu, "fará milhões de pessoas refletirem".
A reportagem é de Teodoro Andreadis Synghellakis, publicada no jornal Il Messaggero, 15-04-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
Santidade, neste sábado, o senhor vai visitar a ilha de Lesbos junto com o seu irmão em Cristo, Sua Santidade Papa Francisco. O objetivo de vocês é de enviar uma clara mensagem de solidariedade e humanismo, pedindo a todos aqueles que têm a possibilidade de se mobilizarem concretamente sobre o drama dos refugiados?
Sim, é isso. O nosso encontro em Mitilene com o Papa Francisco e com o arcebispo ortodoxo de Atenas e de toda a Grécia, Hieronymos, será uma forte mensagem para todas as direções. No atual momento histórico e no modo pelo qual está se desenvolvendo o drama dos refugiados, é necessário que as pessoas que podem exercer uma influência trabalhem com esse espírito. O amado irmão em Cristo, Papa Francisco, é um líder espiritual carismático, reconhecido em todo o mundo, e a sua visita à ilha de Lesbos fará milhões de pessoas refletirem. Esse encontro vai representar certamente um convite à comunidade internacional para que realize tudo o que seja necessário, diante de um fenômeno tão doloroso, que ofende a consciência do ser humano e da nossa cultura.
Tanto o senhor quanto o pontífice se mobilizam incessantemente em favor da paz, da proteção da criação e da dignidade humana. A Palavra de Deus deve ser ouvida de modo mais eficaz pelos poderosos que governam o nosso planeta?
A secularização pode nos afastar de Deus, enquanto, ao contrário, a nossa Igreja nos encoraja a ir rumo a uma vida de santidade. É um fenômeno que não é novo. Desde sempre, os poderosos da terra ou ouviam com atenção a palavra de Deus, ou se mostravam indiferentes. Queremos chamar a atenção de vocês, porém, para o fato de que todos nós, poderosos e sem poder, devemos cuidar e rezar ao Senhor para que a paz e a justiça possam prevalecer, pelo sustento e promoção dos direitos humanos. Mas também, como você justamente lembrou, pela proteção da nossa casa comum, do planeta Terra, que é um dom de Deus para todos nós. No entanto, o sucesso de tudo isso está diretamente conectado ao nosso amor por Deus. É assim que o nosso esforço adquire uma nova dinâmica e um sentido mais profundo, já que é fruto da nossa maturidade e da consciência espiritual, e é também fruto do nosso dever ser humildes, amar os nossos semelhantes e agradecidos ao Senhor Jesus Cristo.
Há aqueles que, na Europa de hoje, constroem muros, barreiras e fecham as fronteiras. Ao mesmo tempo, os habitantes de Lesbos e de Lampedusa abrem as suas casas e ajudam refugiados e migrantes com rara generosidade.
Com essa sua pergunta, vem à mente a carta de São Paulo aos Hebreus, em que, dentre outras coisas, ele lembra: "Não se esqueçam da hospitalidade, pois algumas pessoas, graças a ela, sem saber, acolheram anjos" (Hebreus 13, 2). A hospitalidade é um exemplo concreto de amor ao nosso próximo e de conduta de vida para todos os cristãos, de acordo com a palavra do Evangelho: "Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma, com toda a tua força e com toda a tua mente, e ao próximo como a ti mesmo" (Lucas 10, 27). Os habitantes de Lampedusa, de Lesbos e também das outras ilhas e zonas hospitaleiras do Mediterrâneo abrem suas casas e os seus corações para os nossos irmãos e, desse modo, seguem o exemplo dos santos da nossa Igreja.
A sua relação fraterna com o Papa Francisco é muito estreita, e, com a sua ação, o senhor inspirou a última encíclica do pontífice, dedicada ao ambiente. A realidade social em que vivemos exige um esforço ainda maior, incansável, em favor da unidade dos cristãos?
Não há dúvida de que o mundo sofre por causa de divisões, guerras e miséria. A mensagem comum dos cristãos diante dos males que afligem a humanidade pode se tornar muito mais forte, precisamente porque é comum e é dirigida aos cristãos de todo o mundo e a todas as pessoas de boa vontade. Devemos trabalhar todos nesse sentido. A Igreja Ortodoxa reza "pela união de todos" e promove o diálogo como único meio para chegar, precisamente, a essa unidade desejada, assim como ela é descrita pelo Apóstolo dos Gentios na sua Carta aos Efésios: "A meta é que todos juntos nos encontremos unidos na mesma fé e no conhecimento do Filho de Deus, para chegarmos a ser o homem perfeito que, na maturidade do seu desenvolvimento, é a plenitude de Cristo" (Efésios 4, 13).
Santidade, está certo que se faça uma divisão entre as necessidades dos migrantes econômicos e as dos refugiados? As crises de hoje nos dizem que também se devem rever os modelos de desenvolvimento?
Os modelos de desenvolvimento atuais criaram desequilíbrios econômicos que determinam, como consequência, convulsões sociais. O irmão Papa Francisco repetidamente fez referência aos erros dos modelos de desenvolvimento contemporâneos, e nós compartilhamos o seu ponto de vista. A economia globalizada cria uma séria crise de identidade no mundo contemporâneo, fome e miséria em muitas partes do nosso planeta, e isso é uma ofensa à própria pessoa de Deus. O isolamento de alguns grupos sociais em favor de outros não responde à Sua vontade, e, nesse contexto, deveremos buscar formas novas e mais justas de economia.
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"Os habitantes de Lampedusa e de Lesbos são santos." Entrevista com o Patriarca Ecumênico Bartolomeu - Instituto Humanitas Unisinos - IHU