12 Julho 2011
A cidade italiana não esqueceu as violências de 2001 e celebra seu aniversário. Esperando uma reconciliação difícil. Os policiais condenados pelas violências foram depois promovidos.
A reportagem é de Massimo Calandri, publicada no jornal La Repubblica, 12-07-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
De um lado da praça Alimonda, ainda está, totalmente amassado e oxidado, um dos cestos de lixo de alumínio que frearam o Defender dos policiais, antes que Mario Placanica apertasse o gatilho.
Na escola Diaz, pais e filhos deixam o carro mais longe, porque na rua Battisti, como de costume, não se encontra uma vaga. Depois, ficam conversando no pátio do instituto: foram roubadas aqui as duas bombas molotov falsas que deviam justificar o massacre dos 93 ativistas antiglobalização. No quartel da Repartição Móvel de Bolzaneto, onde 252 pessoas foram torturadas durante três dias e três noites, respira-se um silêncio irreal e perturbador.
O mesmo silêncio relatado por Valérie Vie, a mãe de Avignon que havia "violado" a Zona Vermelha com os braços levantados e que, depois das algemas, havia recebido um belo soco na cara de uma policial. Em Gênova, nada mudou. Sim, talvez um pouco de revestimento e algumas demãos de verniz nos muros: mas em julho elas reaparecem por causa do sol, deixando a descoberto as feridas profundas daquela época. Que não cicatrizam.
São 10 anos desde aquele G8 blindado, desde a repressão do movimento pacifista, desde a ilusão de um outro mundo possível. Desde a guerrilha urbana, desde os Black Bloc e desde as Tute bianche [macacões brancos, movimento responsável por várias ações antiglobalização] de Luca Casarini. Dez anos desde a morte de Carlo Giuliani. O aniversário de uma parte da história italiana não resolvida. Um luto que a capital da Ligúria e o universo antiglobalização celebram na cidade com três semanas de exposições, debates, exibições de filmes, shows. E com uma marcha, no dia 23 de julho, sobre a qual alguns já engrossam nuvens escuras.
Dez anos. Um aniversário na esperança de recomeçar a partir daquele cortejo dos 300 mil que, em 2001, encerrava as manifestações de protesto contra os Grandes e que foi brutalmente disperso pelas forças da ordem. Um aniversário na obstinada espera de desculpas e que se assuma a responsabilidade – por parte do Estado e da sua polícia – que não chegarão. Nunca. Assim como a instituição de uma comissão parlamentar.
Nada mudou. A prefeita Marta Vincenzi é a primeira dos genoveses que fala de um "buraco negro" original das instituições da cidade, culpadas de "violências e ambiguidades" durante a cúpula internacional. "Gênova era e ainda é uma cidade ferida. Ofendida. Que perdeu um filho. Um ícone. Carlo Giuliani". Uma cidade que enfrenta essa década "unida", acrescenta. "Na esperança de poder finalmente retomar, justamente a partir de Gênova, aquele discurso de paz e de solidariedade que havíamos começado em 2001".
Naquela época, Vincenzi, presidente do partido Democratici di Sinistra da província, participou da primeira marcha, a dos migrantes: "Naqueles dias, a minha cidade era o umbigo de um mundo diferente, de um pensamento novo restituído à política. Havia uma grande fermentação e atenção aos desequilíbrios econômicos mundiais. Depois, veio a violência, a ambiguidade do Estado. E o 11 de setembro transformou o confronto entre Islã e Ocidente no problema global".
A primeira cidadã retoma e compartilha o duro comentário feito pelo procurador-geral de Gênova, Luciano Di Noto. "Gênova é uma cidade que não esquece. Que é orgulhosa do seu passado. Balilla, o Renascimento, um 25 de abril único na Itália", confidencia Di Noto. Mas o G8 ainda corre nas veias de todos. E faz mal. É um veneno que o destino dourado dos superpoliciais responsáveis pela gestão da ordem pública de 2001, condenados nos tribunais mas promovidos à cúpula do Ministério do Interior (incluindo o médico do quartel de Bolzaneto, tristemente conhecido como o "doutor Mengele", que há pouco tempo obteve o bônus de produtividade da sua Agência de Saúde Local), tornou mortal.
"Admira que, diante de fatos tão graves, não tenha havido, por parte do Estado, uma tomada de consciência, mesmo que por respeito pela cidade", diz o procurador." Talvez, é por isso que ainda há contas por acertar. Alguém deveria assumir a responsabilidade institucional, que é diferente da pessoal. Eu esperava que alguém pedisse desculpas. E que quem tinha altas responsabilidades se demitisse. Mas lhes parece possível que, depois de 10 anos, não tenhamos conseguido entender quem é uma das pessoas que assinou o mandado de prisão da escola Diaz?".
Di Noto e Vincenzi, Gênova e todo o movimento antiglobalização pedem um presente para esse 10º aniversário. No fundo, temos o direito, dizem eles. A instituição de uma comissão de inquérito parlamentar. O que surpreende é que, como eles, a chamada "tropa", a polícia genovesa também acha isso. Ela jura ter sido "encarregada", há dez anos, por funcionários provindos de Roma. E que jura ter que pagar ainda hoje – em termos de cortes de pessoal e de meios, em comparação com realidades semelhantes – pelo pecado mortal de 2001. "É preciso virar a página, pôr fim ao G8. Recuperar a confiança das pessoas. E, para fazer isso, é preciso um sinal do centro, de Roma. Eles são o anel `forte` nessa corrente", diz Roberto Traverso, secretário local do sindicato da categoria, o Silp. "O procurador disse coisas justas. Certas promoções foram inoportunas, especialmente depois das condenações".
Nada mudou. Traídos duas vezes. Deslegitimados, socialmente excluídos. Gênova e aqueles que, durante o G8, haviam saído para manifestar ainda se sentem assim. E 10 anos pesam muito. Dois psicólogos, Adriano Zamperini e Marialuisa Menegatto, apresentaram um livro (Cittadinanza ferita e trauma psicopolitico), que é o resultado de uma pesquisa sobre as vítimas de abuso e das violências daqueles dias. A partir da campanha que antecedera a cúpula, em que informativos fantasmagóricos dos serviços secretos lançavam alertas absurdos falando de "sacos de sangue infectado lançados sobre a polícia".
Os autores procuraram várias vezes ouvir também os representantes das forças da ordem, "mas o Ministério do Interior bateu a porta na nossa cara". Nando Dalla Chiesa os apresentou "para lembrar os dias em que os direitos foram impunemente suspensos". Eles contaram as histórias daqueles que, 10 anos depois, ainda têm medo de entrar em um trem, porque entreviram um controlador de uniforme. E a história de um médico do pronto socorro de Gênova que não conseguia mais atender agentes, porque, 10 anos antes, havia visto alguns deles perseguir no hospital jovens gravemente feridos.
Antonio Bruno, do comitê Verdade e Justiça para Gênova, disse que Gênova "ainda não elaborou o seu luto". A cidade gostaria de sair desse buraco negro, mas não pode. Não lhe é permitido. "Para uma reconciliação, é preciso a boa vontade de todos. E uma admissão de responsabilidade". São necessários os pedidos de desculpas. "Aconteceu com o Holocausto. Aconteceu com o percurso feito na África do Sul para ir além das leis raciais, e na Austrália para superar a marginalização aborígene". Mas não na Itália, não em Gênova. Ainda não.
Cassandra (subtítulo: Loro la crisi. Noi la speranza) é o nome do projeto que envolve uma cidade que insiste em não querer esquecer. Entre os organizadores, está também Haidi Gaggio Giuliani, mãe de Carlo. "Cassandra dizia a verdade, e ninguém queria acreditar nela. Gênova e o movimento diziam a verdade há 10 anos, quando falavam de direitos e de desequilíbrios sociais. Os fatos nos deram razão. O drama da repressão escondeu a mensagem. Mas hoje podemos recomeçar. Desde aqueles dias".
Alguns, com oportuna antecedência, já temem possíveis incidentes e infiltrações dos Black Bloc na marcha do dia 23 de julho. A prefeita Vincenzi responde agradecendo justamente aos pais de Carlo Giuliani, que nos últimos anos foram um "ponto de referência para a capacidade de dialogar com todos, pela coragem em continuar tendo confiança e não aprofundando o sulco".
Porque Gênova é uma cidade que não esquece, mas ainda tem confiança. E vontade de se reconciliar.
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Gênova, 10 anos depois: os dias da raiva - Instituto Humanitas Unisinos - IHU