27 Fevereiro 2011
Corpulento, afável e ilustre, o general Suleimán Mahmud se uniu aos rebeldes do leste da Líbia no último dia 21 de fevereiro e se proclamou seu chefe militar. Dois dias antes, foi informado da sangria que estava se produzindo em Bengasi. Convocou seus oficiais e pôs sua cabeça ao alvo ao dar as costas a Gadafi. Afirma que foi ameaçado de morte, mas não está preocupado, "um dia, vou morrer de qualquer jeito". Mahmud, que fala "em nome dos militares e não das pessoas", e seus homens permanecem agora em algum lugar da Líbia oriental, esperando poder se coordenar com seu quartel-general e propiciar a queda de Muamar el Gadafi. "É uma questão de tempo e paciência", assegura.
A reportagem é de Nuria Tesón, publicada no jornal El País, 26-02-2011. A tradução é de Anne Ledur.
Eis a entrevista.
Como o senhor tomou a decisão de se unir à revolução?
No dia 19, me reuni com meus oficiais e lhes perguntei o que queriam fazer. Lembrei-lhes que todos enfrentaríamos a pena capital se decidíssemos enfrentar o regime. A maioria estava de acordo. Dois dias depois, me dirigi à mesquita, na praça, para me unir aos manifestantes.
O senhor lutou como sargento na revolução liderada por Gadafi em 1969. Por que agora enfrenta o regime?
A revolução foi necessária e foi boa quando a fizemos, mas Gadafi enlouqueceu e se tornou um ditador. Não é o homem dos velhos tempos. Suas prioridades mudaram e começou a falar que era o rei da África e em dar o poder a seu filho. Quando soube o que estava ocorrendo em Bengasi e em outros pontos do país, os assassinatos... um líder massacrando seu próprio povo com mercenários, soube que não podia continuar lhe dando respaldo.
Quem é mais forte nesse momento?
Gadafi, claramente. O dinheiro é sua força. Dinheiro para pagar armas e mercenários.
Crê que o oeste do país cairá em mãos rebeldes?
É questão de tempo e paciência.
Mesmo que ganhem terreno e os enfrentamentos sejam cada vez mais em torno de Trípoli, pode haver réplicas dos ataquem em zonas que já tem baixo controle dos revolucionários?
Esperamos qualquer coisa. Ataques aéreos... Gadafi está sedento de sangue. É Nero botando fogo em Roma e estou certo de que queimará a Líbia antes de perder o poder. Ele gosta muito.
Tem um número aproximado dos efetivos com que os rebeldes contam?
Essa informação é reservada. Mas temos tudo o que necessitamos para começar a batalha. E estamos formando civis da reserva.
Que contato tem com o resto das zonas rebeldes?
O quartel-general se encontra em algum lugar de Sirte, e as comunicações são impossíveis. É como se tivesse tido um terremoto e nos tivesse partido em sete pedaços impossíveis de cruzar. Mas estamos tentando manter um encontro, que poderia ser feito em horas.
Acha que é possível que alguém do círculo de Gadafi acabe o matando?
Não, sua guarda é absolutamente fiel e sabe que ele conta com o apoio de centenas de milhares de homens. Além disso, conta com um exército de mercenários africanos que farão o que lhes diga.
Quanto pode aguentar?
Como muçulmanos, cremos no destino. Assim, creio que o destino decidirá. Mas estou certo de que está acabando.
O que acontecerá no país se o Gadafi cair?
Conseguiremos trazer a democracia. Somos um país grande, com muitos recursos e riquezas, e pouca população. Poderia levar décadas ou mais, mas conseguiremos.
Pode haver uma luta interna pelo poder?
Será o próprio povo que vai unir o país. Todas as tribos são uma mesma família.
Teme que o integrismo islâmico ou o terrorismo possam tomar vantagem dessa situação de instabilidade?
Nós, líbios, somos muçulmanos, mas não somos terroristas. Posso lhe assegurar que não há a presença da Al-Qaeda na Líbia.
Espera alguma ajuda das potências ocidentais ou das Nações Unidas?
Não esperamos nada deles. Faz uma semana que os líbios estão sendo assassinados e não fizeram nada. Creio que lhes preocupa mais a economia do que as pessoas. Deveriam saber, já que vivem em países democráticos, que nós também precisamos de democracia e liberdade. As pessoas querem mudança. Inclusive Obama vai deixar de ser presidente um dia. Os Estados Unidos levam anos negociando com ditadores, deveriam saber como lidar com eles.
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"Gadafi é como Nero, botará fogo na Líbia antes de deixar o poder" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU