12 Dezembro 2008
13 de dezembro de 1968. O governo militar decreta o Ato Institucional número 5, um instrumento que deu ao regime poderes absolutos ao fechar o Congresso Nacional, decretar recesso do mandato de senadores, deputados e vereadores, autorizar a intervenção dos estados e municípios, suspender a possibilidade de qualquer reunião de cunho político, recrudescer a censura e suspender o habeas corpus. A liberdade de qualquer brasileiro estava, portanto, vigiada, não se podia ir e vir ou falar (e quase pensar) sobre política. Em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line, o historiador Ricardo Mendes diz que o AI-5 foi instituido para por fim as diversas mobilizações oriundas da sociedade civil contrária ao governo de Costa e Silva. "O estabelecimento do AI-5 buscou interromper esta mobilização, tanto no âmbito da sociedade civil quanto no plano da produção cultural, o que representou um relativo e momentâneo sucesso." No plano cultural, explica, o impacto sofrido não foi resultado apenas do Ato, mas "contou ainda com a colaboração da afirmação da Indústria Cultural no Brasil".
“Os ventos do Concílio Vaticano II, a emergência da Teologia da libertação e a denúncia das torturas e arbítrios por parte do governo militar imposto fizeram com que aquela geração de bispos e lideranças leigas (não todas!), assumissem posturas ao lado das bandeiras dos movimentos sociais de esquerda”, conta o professor Lyndon de Araújo Santos, que também concedeu a entrevista, por email, à IHU On-Line. Nela, o historiador fala sobre a participação da sociedade civil durante esse período na política brasileira e da atuação da Igreja a partir da instituição do AI-5.
Ricardo Mendes é graduado em História, pela Universidade Santa Úrsula, mestre em História Social, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e doutor em História, pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), o pesquisador também participa do grupo de pesquisa História, memória e relações interculturais, na mesma instituição.
Lyndon de Araújo Santos é historiador, pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Realizou mestrado em Ciência da Religião, pela Universidade Metodista de São Paulo, e doutorado em História, pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. É, atualmente, professor na Universidade Federal do Maranhão. Escreveu As outras faces do sagrado: protestantismo e cultura na Primeira República Brasileira (São Luís: EDUFMA/Edições ABHR, 2006) e é organizador de Religião e violência em tempos de globalização (São Paulo: Paulinas, 2004).
Os pesquisadores participam do livro Tempo negro, temperatura sufocante: Estado e sociedade no Brasil do AI-5 (Rio de Janeiro: Contraponto, 2008), organizado por Oswaldo Munteal Filho, Adriano de Freixo e Jacqueline Ventapane Freitas.
Confira a entrevista.
IHU On-Line - Por que o AI-5 se tornou o mais violento e mais lembrado dos atos institucionais?
Ricardo Mendes - Mesmo que alguns autores considerem que o AI-5 tenha representado um “golpe dentro do golpe”, e tenha sido neste sentido um marco, perspectivas revisionistas assinalam que o momento foi muito mais o resultado de uma lenta escalada em direção ao poder dos setores que genericamente são denominados por “linha-dura”. Esses acabaram por implementar uma perspectiva específica de segurança nacional que salientava muito mais os aspectos políticos centrados no combate ao comunismo.
Isto por um acaso significa que o AI-5 perdeu relevância dentro da historiografia nacional? Não, mas indica que o momento deva ser considerado um marco por caracterizar-se não pelo início, mas pela institucionalização e sistematização da tortura como recurso adotado pelo Estado para garantir a segurança. Este setor, que se tornou hegemônico, valorizava a repressão, o nacionalismo, a hegemonia militar e, por incrível que pareça, possuía uma perspectiva social mais aguçada que outros segmentos envolvidos no março de 1964. Foi um grupo que procurou levar às últimas conseqüências o combate à ameaça comunista que muitos deles tinham como extremamente crível.
IHU On-Line – Quais os impactos do AI-5 no âmbito cultural?
Ricardo Mendes - 1968 foi um ano de efervescência cultural significativa e que apresentava uma clara conotação de esquerda. Além disso, diversas mobilizações oriundas da sociedade civil ocorriam e colaboravam para dificultar as coisas para Costa e Silva. O estabelecimento do AI-5 buscou interromper esta mobilização, tanto no âmbito da sociedade civil quanto no plano da produção cultural, o que representou um relativo e momentâneo sucesso. No plano cultural o impacto sofrido não foi resultado apenas do Ato. Contou ainda com a colaboração da afirmação da Indústria Cultural no Brasil. Mas a perspectiva que ficou foi a de que o “estrago havia sido” feito pela medida aprovada por Costa e Silva.
Outro aspecto que deve ser considerado, ao pensarmos na importância com o qual o AI-5 é lembrado, diz respeito à memória. Parcelas da historiografia sobre a esquerda armada dos anos 1960 e 1970 relembram do AI-5 como sendo um elemento fundamental para o desencadeamento da luta armada no Brasil. Em parte, isto deve ser considerado como resultado de uma releitura daquele período. Uma leitura memorialística que busca no AI-5 a pretensa justificativa para a opção pela “revolução” capitaneada pela vanguarda guerrilheira. Neste sentido, a tentativa é a de buscar apresentar que esta opção teria sido resultado de uma “ausência de opções” [sic] diante da truculência do AI-5. Outro objetivo seria o de vincular a luta armada com um pretenso desejo de redemocratização, relegando ao limbo outras questões que teriam colaborado para esta opção.
IHU On-Line - Como a sociedade da época reagiu à instituição do AI-5?
Ricardo Mendes - De diferentes maneiras. Parte expressiva daqueles que estavam participando das movimentações no ano de 1968 era oriunda da classe média. E, se por um lado vários eram os que estavam efetivamente engajados, de outro, muitos mais foram os que se deixaram seduzir pelo momento de bonança econômica que começava a apresentar seus primeiros sinais já no ano de 1969: o “milagre econômico”. Neste sentido, o AI-5 apresentou-se como um estímulo a mais para a desmobilização. Outros passaram a considerar que o momento já não era propício para confrontar o regime e, neste sentido, recolheram-se ou para canalizar esforços em torno da oposição consentida (postura capitaneada pelo PCB), ou esperando um momento mais adequado de luta. Por último, mas não menos importante, devemos considerar que mesmo que o AI-5 não tenha sido o fator “gerador” da opção pela guerrilha armada, naquele momento foi um importante colaborador para o aumento das adesões a esta opção política.
IHU On-Line - Qual sua opinião sobre as memórias da ditadura apresentada no cinema?
Ricardo Mendes - A pergunta está formulada da forma correta: memórias e não memória. Primeiramente porque esta não é elaborada de forma monolítica. A memória sobre o regime civil-militar brasileiro encontra-se ainda como objeto de disputas entre vários grupos. Basta olharmos para a presença de reportagens que são apresentadas, algumas como matéria de capa de determinados periódicos de circulação nacional. O assunto vem adquirindo, nos últimos tempos um pouco mais de destaque, embora não se possa afirmar que seja tema de discussão por parcelas expressivas da sociedade, tal qual se observa no Chile e na Argentina. Mesmo assim, apresenta-se como objeto da atenção de grupos ou diretamente envolvidos no embate dos anos 1960, ou de outros setores que, embora não tenham participado diretamente daquele momento histórico, apresentam um interesse direto pelo assunto. Exemplo disto encontra-se em reportagens como a que Carta Capital publicou em junho de 2008. A mesma aborda a questão da responsabilização daqueles que participaram, como torturadores, do processo de repressão. Isto É, por sua vez, publicou uma matéria em novembro de 2008 (“Tropa de extermínio”) e que fala sobre a repressão ao movimento armado no Araguaia. Ou mesmo a reportagem presente na Revista Veja, intitulada “Questão Fora do Lugar” (12/11/2008) e que versa sobre a revisão do principio da Lei de Anistia, decretada em 1979. A presença deste debate geral, que de certa forma foi revitalizado a partir da rememoração dos 40 anos do março de 1964, está diretamente relacionado com as disputas em torno da memória do período.
Memórias apresentadas pelo cinema
O cinema acaba por colaborar significativamente para isto. No Brasil, o filme que de certa forma apresentou-se como representativo de uma perspectiva cinematográfica que buscava discutir sobre este período foi Prá Frente Brasil (Roberto Farias – 1982). Contudo, diferentemente do caso argentino (onde observa-se nos anos 1980 a proliferação de filmes sobre o regime civil-militar no país), no Brasil somente a década de 1990 irá marcar uma produção mais expressiva sobre o período. Cito aqui Lamarca (Sérgio Rezende – 1984) e a obra de Bruno Barreto intitulada Que é isso companheiro? Mas, efetivamente, a produção mais intensa tem se dado a partir de princípios do século, com dois momentos de destaque. Em 2004, ainda como desdobramento da efeméride dos 40 anos de 1964, obras como Cabra cega (2004), ZuzuAngel (2006) e Quase dois irmãos (2004) foram produzidas.
2006 também apresentou-se com uma produção expressiva, com filmes como Zuzu Angel (2006), O ano em que meus pais saíram de férias (2006) e Hércules 56. Alguns destes filmes apresentam uma ênfase nos aspectos relativos à repressão. De outro lado, um caminho que acaba por ser seguido também é o do enfoque às utopias que estavam presentes dentre aqueles que se engajaram na luta armada, e cujo exemplo belíssimo é dado pela obra Cabra cega, de Tony Ventura. Ambos dizem respeito aos anos do regime civil-militar. Mas, como em todo e qualquer filme, tratam-se de representações e não de reconstituições históricas. Parte significativa destas produções é, foi e está sendo elaborada por diretores/roteiristas diretamente ou indiretamente vinculados com o cinema político que surgiu no final dos anos 1950 na América Latina, conhecido como Nuevo Cine Latinoamericano.
IHU On-Line - Como entender que muitos presos políticos ainda são vistos como criminosos pela sociedade brasileira?
Ricardo Mendes – Se sua pergunta diz respeito à criminalização dos presos políticos acho que é interessante observar-se a reportagem que a Revista Veja, citada anteriormente, apresenta. Para o autor da dita reportagem, o desejo de responsabilização criminal dos torturadores só seria legítimo se o mesmo movimento fosse feito em direção à responsabilização criminal daqueles que pegaram em armas contra o regime e, muitos deles, a favor do estabelecimento de um regime socialista no Brasil. Neste sentido, e de forma equivocada, o autor da reportagem sugere que apresentaria o mesmo peso a violência realizada por um agente do Estado, sob a chancela deste Estado, e a atitude adotada pelos envolvidos na luta armada. Aliás, mais do que um equívoco, representa a permanência e atualidade do debate que esteve presente naqueles anos. Significa que, apesar das transformações que sofreu a sociedade brasileira ao longo de quase 40 anos, aspectos relativos à violência perpetrada a partir do Estado, à distribuição da riqueza e à construção de uma sociedade mais justa ainda são profundamente atuais.
IHU On-Line – Depois de 40 anos, a sociedade, de fato, conseguiu resgatar a democracia atualmente?
Ricardo Mendes – Acho que os últimos vinte anos representam um avanço significativo no que diz respeito à valorização da democracia como regime político. Embora entenda que isto não signifique a garantia da sua existência. Em segundo lugar, para podermos falar efetivamente de democracia no Brasil devemos pensar que, apesar desta valorização, ainda estamos distantes de uma sociedade calcada na justiça social e econômica. E isto também significa democracia, pois como pensar na liberdade de escolha se os requisitos mínimos de sobrevivência não são oferecidos? Nos anos 1960, a questão também se colocava, e a alternativa pensada foi: “tiremos, então, o direito de voto deles”. Ao se pensar que, mesmo com a profunda diminuição da desigualdade que se observou nos últimos anos, ainda uma parcela muito pequena responde pela maior parte da geração e controle das riquezas do país. E um fator que deve ser observado é a resistência e o discurso que se encaminha contra várias medidas que tem garantido e buscado avançar nesta redistribuição. Obviamente que tenho algumas restrições quanto a determinados programas encaminhados pelo governo atual, mas elas dizem respeito não à cessação desta redistribuição e sim ao desenvolvimento de mecanismos que garantam que a mesma seja mais duradoura e consistente.
Entrevista com Lyndon de Araújo Santos
IHU On-Line – Como o senhor avalia a participação da sociedade civil nos anos de chumbo? Ela foi conivente com a ditadura?
Lyndon de Araújo Santos – Falar de sociedade civil no Brasil nos remete à questão histórica de sua efetiva participação nos destinos políticos do país. O Brasil desenvolveu-se enquanto nação de acordo com o sentido da "estadania", segundo o historiador José Murilo de Carvalho, ou seja, com a ação formadora do estado sobre o conjunto da sociedade, obstruindo as manifestações de uma cidadania ou participação popular. Em nossa história, as insurgências populares foram reprimidas ou suprimidas pela repressão, pelos discursos e pelas cooptações dos grupos dominantes. Nos anos de chumbo, a sociedade civil organizada ensaiava tornar-se um agente protagonista de suas reivindicações, embora dentro das condições que as décadas após a Segunda Guerra Mundial e a Guerra Fria colocavam. Entendo, contudo, que quando falamos de sociedade civil precisamos dizer de um conjunto plural e heterogêneo, atuante fora, em relação ou mesmo em aliança com o Estado, mas que contém diferentes tendências de interesses. Dessa forma, nos anos de chumbo, os setores mais conservadores alinharam-se ao ideário do golpe, outros setores mais progressistas em diferentes graus de radicalismo, opuseram-se ao golpe e foram reprimidos, presos, torturados e exilados. Mas parte da população assistia aos acontecimentos com graus diferentes de consciência e informação do que estava ocorrendo nos bastidores da ditadura.
IHU On-Line – Como as diferentes Igrejas atuaram em relação à instituição do AI-5, em especial a Igreja Católica?
Lyndon de Araújo Santos – A Igreja Católica assumiu uma postura inicial de adesão ao golpe até por conta de sua trajetória histórica de proximidade com o Estado. Os católicos participaram da “marcha da família com Deus”, que reuniu milhares de pessoas em favor dos valores religiosos e morais, e pelo conservadorismo político. Após a Segunda Guerra Mundial, contudo, a Igreja conhecia tendências internas conflitivas, embora estivesse reunida institucionalmente em torno da recém-fundada CNBB. O discurso do desenvolvimentismo e a releitura da experiência integralista pós-Vargas, fez com que alguns bispos, com Hélder Câmara, avançassem em questões sociais, políticas e ideológicas e fizessem uma auto-crítica histórica da própria Igreja. Os ventos do Concílio Vaticano II, a emergência da Teologia da Libertação e a denúncia das torturas e arbítrios por parte do governo militar imposto fizeram com que aquela geração de bispos e lideranças leigas (não todas!) assumissem posturas ao lado das bandeiras dos movimentos sociais de esquerda. A Igreja pôde, naquela conjuntura, alçar sua voz em defesa dos perseguidos políticos e aprofundar a crítica social, não sem conflitos internos, fazendo surgir um catolicismo engajado que resultou nas comunidades eclesiais de base.
Os evangélicos, do modo geral, acataram as diretrizes dos governos militares e redefiniram uma postura ideologicamente mais conservadora. Esta análise caberia, sobretudo, às cúpulas das denominações que reproduziram os discursos e os mecanismos de controle do pensamento, da vigilância e até da denúncia de seus próprios membros. No entanto, um significativo registro deve ser feito quanto à participação de não poucos evangélicos em lutas sociais, no campo e na cidade. Lideranças e leigos construíram uma outra consciência social, munida de pressupostos políticos e teológicos. O setor de responsabilidade social da Confederação Evangélica do Brasil realizou em 1962 um Congresso intitulado “Cristo e o processo revolucionário brasileiro”. Posteriormente, muitos intelectuais e lideranças evangélicas foram expulsas de instituições e igrejas. Eram ecumênicos e voltaram-se para a defesa dos direitos humanos no Brasil denunciando lá fora os desmandos da ditadura.
IHU On-Line – Qual a importância da Igreja Católica e de movimentos como a Teologia da Libertação na luta pela redemocratização do país?
Lyndon de Araújo Santos – Foi fundamental por conta da capacidade desse catolicismo galvanizar um capital político e religioso, que desembocou na participação em movimentos de base e de conscientização política. Pela primeira vez, a América Latina e o Brasil elaboraram uma teologia a partir de seu contexto e realidade social, não sem críticas, mas que partia das vivências cotidianas da fé e da pobreza. Tanto a hierarquia afinada com a defesa dos direitos humanos e da cidadania quanto as comunidades reunidas em torno do debate político foram de grande importância para a discussão e a prática de processos mais democráticos. A Teologia da Libertação foi o discurso ou o contra-discurso de uma igreja que entendia e desejava, ao mesmo tempo, ser profética para o mundo e reformar-se internamente, refazer-se enquanto povo de Deus. Leonardo Boff escrevia de forma muito significativa no título de um de seus livros: “E a Igreja se fez povo”. Ora, se essa igreja se fez povo, o que ela era antes? Esse catolicismo engajado não era homogêneo ou harmônico, mas contribuiu efetivamente na formação de lideranças envolvidas com movimentos de juventude, que viriam, mais tarde, assumir lideranças partidárias e de movimentos sociais. Enfim, essa igreja e seu discurso libertador formou quadros que se inseriram na formação do Partido dos Trabalhadores, por exemplo, nos fins da década de 1970 e início da de 80, e o próprio MST.
IHU On-Line – A Igreja, outras instituições e até mesmo a sociedade se manifestaram contra a ditadura após a instituição do AI-5?
Lyndon de Araújo Santos – O AI-5 foi a reação extrema do governo militar em conter a sociedade civil organizada, que reivindicava o volta à democracia e denunciava os arbítrios praticados pelos militares. A linha dura do militarismo venceu as disputas internas e impôs em definitivo o seu modelo de controle repressor das liberdades civis. Houve manifestações contrárias até dentro das patentes militares, mas o processo engendrado de violência do estado vinha sendo gestado e tomou forma naquela conjuntura favorável. As reações foram ainda mais reprimidas porquanto a ação violenta do estado estava legitimada legalmente. Deu-se início a um tempo de obscuridade destas ações repressoras. A principal reação foi a radicalização da luta política por parte de partidos tornados clandestinos e de guerrilhas organizadas no campo e nas células urbanas. A Igreja manifestou-se contra os desdobramentos da aplicação do Ato, antecipando com muita clarividência os tempos de terror que viriam e, de fato, vieram.
IHU On-Line – Em que sentido a ditadura militar influenciou na questão econômico-desenvolvimentista do país?
Lyndon de Araújo Santos – Um Estado centralizado e com a legitimidade da violência foi um fator decisivo para a adequação do país à ordem capitalista naquele momento. Foi implementado um tipo de capitalismo de estado voltado para as exportações e para a industrialização, favorecido inicialmente pela conjuntura internacional. O discurso e a ação desenvolvimentista se favoreceram pela facilidade de captação de recursos por meio de empréstimos dos organismos econômicos internacionais (FMI). A baixa inflação e o aquecimento interno do consumo formado por uma emergente classe média contribuíram para o crescimento das demandas da produção, tendo o Estado como o grande investidor e aliado ao grande capital, cujo papel foi o de repassador de recursos às instituições privadas (bancos, empresas, financiadoras, multinacionais etc.). O surto de crescimento econômico fortaleceu o governo militar no início da década de 1970, tirando o Brasil de um ciclo econômico negativo após o governo de Juscelino. O Estado foi o agente principal também na construção de grandes obras de infra-estrutura visando o maior desenvolvimento e integração entre as regiões do país, sob a justificativa nacionalista da segurança nacional. No entanto, sabemos que tais ações eram estratégicas também para o controle do território nacional e criava as condições para a entrada das empresas multinacionais.
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AI-5. 40 anos depois. Entrevista especial com Ricardo Mendes e Lyndon de Araújo Santos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU