04 Dezembro 2023
"Mitigar sem agir nas causas ao mesmo tempo é de pouca utilidade, reunir-se em conferências onde é mais importante não pisar nos calos de uma economia destrutiva do que o estado de saúde da biosfera que nos sustenta serve ainda menos. Apenas nos pouparia da zombaria, ainda que disfarçada", escreve Mario Tozzi, geólogo italiano e divulgador científico, em artigo publicado por La Stampa, 01-12-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
O fracasso anunciado da Conferência das Partes sobre o Clima (COP28) de Dubai reside inteiramente nos seus frágeis e ambíguos pressupostos, que se concretizam no procrastinar indefinidamente qualquer ação estrutural para agir sobre as causas da crise climática. Afinal, quando nunca se chama diretamente em causa a responsabilidade gravíssima e reiterada das corporações de gás e petróleo e dos Estados que se identificam com elas, e nunca são colocadas no banco dos réus chamando-as a um substancial ressarcimento, não se pode esperar, no máximo, mais do que algum sucesso de fachada. Mas em Dubai, provavelmente, nem mesmo esse será registrado. Não sendo possível sair incontaminados de um confronto com Lúcifer em pessoa na própria casa do diabo.
Todas as grandes empresas de combustíveis fósseis sabiam muito bem o que iria se enfrentar continuando a extraí-los e queimá-los: estudos encomendados a pesquisadores pelas próprias empresas, desde a década de 1970, tinham destacado impiedosamente como se chegaria a 420 ppm (partes por milhão) de dióxido de carbono por volta de 2020, o que pontualmente ocorreu.
A demonstração mais clara de que a ciência é unânime sobre as causas da crise climática mesmo quando é paga pela indústria que desejaria resultados mais moderados. Claro esperamos ser desmentidos, mas isso só aconteceria se no final do trabalho fossem tomadas medidas estruturais, não mais negociáveis, obrigatórias e imediatas. Isto é, se se pusesse fim ao escândalo dos subsídios públicos para o setor de petróleo e gás (calculados em cerca de 7 trilhões de dólares/ano segundo o FMI), independentemente de estarmos falando de formas de apoio diretas ou indiretas; caso se impedisse de continuar a perfurar alegremente até mesmo nos santuários de proteção da natureza ou nos polos; caso se impusesse um preço de reconversão que leve em conta o custo social da carbono, na prática se uma percentagem desses lucros fosse destinada às energias renováveis. E se a tudo isso se impusesse um controle realizado por uma entidade apartidária e se essas operações começassem imediatamente, porque já perdemos tempo suficiente.
Porém não fazemos nada disso e vemos serenamente fracassar a previsão que até agora nos manteve pendurados à esperança de uma mudança de direção, isto é, que teríamos contido as emissões de forma a não ver incrementar a temperatura média atmosférica em mais de 1,5°C no futuro próximo, conforme sinalizado diversas vezes durante os encontros econômicos internacionais (incluindo o G20 e o G7).
Em vez disso, avaliando os investimentos e os programas de desenvolvimento das companhias de gás e carvão, o que se constata é que o aumento será de 2,7°C, valor temido por todos os especialistas porque prenúncio de consequências irreversíveis não apenas para os ecossistemas, mas também para a biologia dos seres vivos, incluindo sapiens. Defender as florestas restantes, plantar bilhões de árvores, proteger as baleias (sim, contribuem fortemente para armazenar o excesso de CO2), são todas operações positivas, mas agem sobre os efeitos, não tocam nas causas da crise climática, portanto correm o risco de não serem proporcionais a uma mudança que promete ser muito mais conspícua do que o previsto.
Mitigar sem agir nas causas ao mesmo tempo é de pouca utilidade, reunir-se em conferências onde é mais importante não pisar nos calos de uma economia destrutiva do que o estado de saúde da biosfera que nos sustenta serve ainda menos. Apenas nos pouparia da zombaria, ainda que disfarçada.
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COP28 não aborda as causas da crise. Artigo de Mario Tozzi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU