“Vamos mudar o mundo”. Entrevista com o cardeal Matteo Zuppi

(Foto: Reprodução | Istituto Cavazza)

11 Agosto 2022

 

Matteo Zuppi poderia ser um daqueles padres nos círculos das fotografias de Mario Giacomelli.

 

Alto, magro, movimentos rápidos, a batina preta esvoaçando enquanto ele se apressa em perguntar: "O que temos para o quarto de hora acadêmico?" Porque sempre tem alguém que tem que encontrar, ver, ouvir. E você poderia confundi-lo com um qualquer "Dom Matteo", se não fosse uma das figuras-chave da Igreja do Papa Francisco - há pouco mais de dois meses o presidente da CEI, há dois anos e meio cardeal, há sete arcebispo de Bolonha, onde vive feliz, amando a cidade e sendo amado em troca.

 

Todos os dias ele reza missa em San Petronio, porque optou por não fazer celebrações privadas. Ele não usa as redes sociais (exceto o Whatsapp) porque "não é o meu jeito", mas "sei que criaram uma página no Facebook onde zombam de mim de forma legal". A página, com seis mil seguidores, chama-se "Zuppi fazendo coisas" e zomba da imprensa, que desde que se tornou bispo em 2012 o exalta por qualquer coisa que ele faça.

 

A entrevista com Matteo Zuppi é editada por Silvia Bombino, publicada por Vanity Fair, 04-08-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.

 

Eis a entrevista.

 

Você gosta da definição: "um padre de rua que se torna presidente da CEI"?

 

Não, porque é uma banalização e, como tal, sempre perigosa. Tudo é muito mais complexo.

 

Então vamos começar do início. Família grande, a sua.

 

Éramos cinco irmãos e cada um diferente do outro. Temos apenas uma irmã, uma terna vice-mãe sendo a segunda, a lugar-tenente do "general"...

 

Sua mãe?

 

Claro! Obrigatoriamente! Fumagalli, de Brianza, de Seveso, tinha a arte de mandar. Com facilidade, eu acho, ela conseguia nos gerir.

 

Vocês ainda são muito unidos hoje?

 

Temos relações muito profundas, mesmo que não sejam contínuas, afinal o sentido de ser irmãos não reside apenas na convivência. Nunca conseguimos brigar de verdade, nem mesmo quando houve a divisão das coisas do "general", quando ela morreu. Além disso, ela havia dado instruções sábias em seu testamento.

 

Quais?

 

"Lembrem-se que quando nos casamos não tínhamos nada: tudo isso é fruto do trabalho do vosso pai e da ajuda da vossa mãe." Post Scriptum: "Acertem-se apenas entre irmãos, sem maridos e mulheres várias."

 

Seus irmãos são todos casados, você tem sobrinhos?

 

Sim claro. Temos de tudo: casados, divorciados... O "general" não queria em casa aquelas que chamava de "concubinas", mas havia Natais um pouco tristes, com meus irmãos chegando sem companheira. No final propusemos uma anistia.

 

Lembra quando você disse ao "general" que queria se tornar padre?

 

Que um dos filhos se tronasse padre era motivo, por um lado, de felicidade, por outro, de grande preocupação: eu não era da tipologia tradicional. Lembro-me que na minha primeira missa, aos 26 anos, vieram todos os meus parentes a Santa Maria Maggiore. Mas eu, depois da missa e dos cumprimentos pela ordenação, fugi e fui para Primavalle.

 

"Fugi"?

 

Sim, porque talvez devesse ter estado mais com eles, mas devido a um certo radicalismo da época não permiti muito: tinha pressa de ir para a periferia, para celebrar a "segunda primeira missa" numa pequena capela num subsolo.

 

Por que você só entrou no seminário após a formatura?

 

Sempre digo a mim mesmo que cursei três seminários, sendo um pouco cabeça-dura. O primeiro foi em casa. A mãe e o pai eram muito devotos, ele ligado a uma experiência de laicato comprometido. Sua tese de graduação, por exemplo, foi sobre os primeiros escoteiros, movimento que, na década de 1930, tinha uma forma diferente de se aproximar dos jovens, que combinava perfeitamente com a visão do "general": se trabalha e não se desperdiça tempo. Em nossa casa, a uma certa hora, rezava-se o rosário: e não é que nós, crianças, ficássemos felizes em parar de brincar para rezar.

 

Segundo seminário?

 

A comunidade de Santo Egídio, onde me formei e aprendi o Evangelho herdado em casa, mas vivo, como a oração junto com meus colegas, no ensino médio. Depois houve o terceiro seminário, em sentido estreito.

 

Era o início dos anos 1970, que tipo de garoto você era?

 

Comecei o ensino médio em 1º de outubro de 1968. Na época, como nos grupos extraparlamentares, a adesão, o envolvimento em uma comunidade era algo muito forte. Era um momento de questionamento, tínhamos que mudar o mundo, ser jovem tinha um sentido e uma responsabilidade precisos.

 

Você ainda mantém contato com seus colegas de escola?

 

Sim, ainda nos vemos uma vez por ano. E é interessante, porque toda vez sentimos uma confiança imediata, não há reverência, é bom, é um banho de realidade. Agora estão todos aposentados, alguns obcecados pelos netos.

 

Já pensou em ter uma família?

 

Eu diria que sim, porque tinha o exemplo do casamento dos meus pais, enquanto a minha geração era aquela em que nas famílias já havia tantas dificuldades. Porém, eu queria uma família maior, essa era a ideia da comunidade. Sem aquele grupo, talvez eu não tivesse me tornado padre.

 

Com Santo Egídio, em 1992, foi mediador para a paz em Moçambique. A paz na Ucrânia está longe?

 

A paz nunca é garantida. Mas todos podem e devem fazer a sua parte, porque a única forma de resolver os conflitos é trabalhar para remover as sementes da divisão, do ódio, do preconceito, da ignorância que são o terreno para a cultura da violência, porque a justificam. Só o diálogo pode neutralizar o ódio. Esperamos que os fios de diálogo que levaram ao acordo sobre o trigo cresçam e que a ONU consiga abrir outros espaços de encontro.

 

Nos últimos dez anos tornou-se bispo, arcebispo e cardeal nomeado pelo Papa Francisco. Você se lembra do seu primeiro encontro com ele?

 

Foi há muitos anos para a apresentação de um livro em Buenos Aires, onde ele se desculpou muito porque chegou um pouco atrasado devido ao subte, o metrô!

 

O que o impressiona no Santo Padre?

 

O imediatismo. Olha nos olhos, escuta, ele tem uma memória "afetiva" surpreendente, ou seja, ele lembra o que transmite sentimento. Deixa-se tocar pelo que ouve.

 

Ainda não conseguiu se encontrar com Mario Draghi, cujo governo, nesse meio tempo, caiu. O ius scholae, sobre o qual a CEI se pronunciou a favor, também foi trancado.

 

Há certos temas de interesse nacional. Estão em jogo os direitos fundamentais das pessoas e, portanto, os deveres. As soluções se encontram com consciência e olhar aberto para o futuro, não marcado por preconceitos e medo. A cidadania para as crianças que frequentaram as aulas das nossas escolas permite vinculá-las ao nosso país, torná-las "nossas", oferecer o orgulho de ser italianos e talvez o redescobrir também em nós. O ius scholae representa um passo para sair da abordagem emergencial e assistencialista e começar - com um atraso médio de quarenta anos - a enfrentar o fenômeno migratório de forma estrutural.

 

A campanha eleitoral traz essas questões. O que você responde a quem diz: "Leve você para a sua casa o migrante"?

 

Quem não conhece o acolhimento que é típico da Itália. No interior se fala: "Somos dez, traz mais dois que fazemos uma dúzia." A solidariedade é algo que faz parte da nossa verdadeira tradição.

 

Votamos em 25 de setembro: você que é filho de 1968, o que diria aos jovens para convencê-los a votar?

 

Para Paulo VI, a política é a mais alta forma de caridade. Para muitos, e principalmente para os jovens, porém, a palavra assumiu uma conotação negativa, que remete a jogos de poder, interesses pessoais, corrupção. Mas a desilusão e a raiva podem nos levar a acreditar que sejam reais as soluções gritadas, fáceis, a qualquer preço. O mundo precisa ser mudado e fazer isso não é apenas algo bom, mas indispensável, e ainda por cima possível. Posso ser um incurável "garoto", já velho, mas não perdi esse sonho. E reaparece cada vez que escuto o Evangelho e com os sentimentos de Jesus olho o mundo e os tantos sofrimentos dos menores. Como se pode deixar a situação assim?

 

Falando em sofrimento, pela primeira vez na história, a sua CEI iniciou uma investigação independente sobre a pedofilia dentro da Igreja nos últimos 20 anos.

 

É uma das muitas coisas que estamos fazendo. Queremos que os fatos apareçam e sejam examinados com critérios científicos.

 

Foi definida como revolucionária também a sua abertura à comunidade LGBTQ+, e a todas as famílias não “regulares” para a Igreja, que o Istat nos mostra que são cada vez mais numerosas: casais de fato com ou sem filhos, famílias alargadas, uniões civis.

 

A minha posição não é diferente daquela da Igreja, que é a de acompanhar e acolher, já indicada por Bento XVI, e que o Papa Francisco reiterou mais explicitamente. Como conta o Evangelho, Jesus deixa-se aproximar por uma "pecadora" e não a julga. Olhando bem, ele se zanga apenas com os religiosos ou com aqueles que se aproveitam de Deus, enquanto vai à casa dos cobradores de impostos e dos pecadores. Ele nos libertou de todos os preconceitos... E nós não?

 

A CEI, no entanto, se manifestou contrária ao projeto de lei Zan. Muitas pessoas homossexuais e católicas se perguntam até que ponto são acolhidas pela Igreja.

 

O acolhimento não tem prazo nem hora, desde que "ande direito". Se você é filho, é filho. Se você é irmão, é irmão, esta é sempre a sua casa. Contudo, posso não estar de acordo, posso discordar completamente. Dentro da Igreja houve muita discussão sobre o projeto de lei Zan. Por exemplo: a maternidade de substituição é um problema? Sim, é um problema. Mas se você me pedir para batizar uma criança nascida assim, eu te respondo: claro! Vou fazer. Já fiz isso.

 

A Welby foi negado o funeral. Se uma pessoa morresse com suicídio assistido, você realizaria o funeral?

 

Sim. No entanto, devo esclarecer um ponto: a Igreja não admite a eutanásia, mas pede a aplicação de cuidados paliativos. Permanece-se próximos do amado até o fim, fazendo de tudo para tirar o sofrimento do corpo e do espírito, portanto sem nenhuma obstinação, mas sempre defendendo a dignidade da pessoa. A complexidade requer inteligência, misericórdia e amor para compreender os acontecimentos da vida.

 

Por que você disse: "Todos repetimos o ano no amor"?

 

Caramba! Olhe para mim! E também você se torna analfabeto novamente quando pratica muito amor para si mesmo e nada para os outros. Realmente nunca paramos de aprender o amor, nunca entendemos que se transforma e tem uma força tremenda. Uma das coisas mais ternas são as bodas de 50 anos. Quanto amor, poderoso, muito humano, muito diferente daquele do início, é um destilado, menos misturado com outras coisas. E depois repetimos o ano porque somos um pouco tontos: tem o pecado, fruto do mal que banaliza, torna insípido, estraga o amor.

 

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