08 Agosto 2022
Para a imprensa internacional, faltando seis semanas para a viagem do Papa Francisco ao Cazaquistão, é de grande interesse o eventual encontro - o segundo depois daquele histórico em Havana, em 12 de fevereiro de 2016 - entre o Papa Francisco e o Patriarca Kirill. Por enquanto, nenhuma notícia definitiva chega de Moscou sobre a participação do Patriarca Ortodoxo Russo, que meses atrás confirmou sua presença, segundo importantes autoridades cazaques, nunca desmentidas ou negadas. Por enquanto fica em silêncio e certamente avalia com muito cuidado a informação que lhe foi transmitida pelo Metropolita Antonij que encontrou nos dias 4 e 5 de agosto, no Vaticano, D. Paul R. Gallagher e Papa Francisco, respectivamente. O metropolita de Volokolamsk mostrou-se muito interessado em saber algo sobre a possível viagem de Francisco a Kiev.
A reportagem é publicada por Il sismógrafo, 06-08-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
No caso do Pontífice, a situação é distinta: ele já decidiu ir ao Cazaquistão de 13 a 15 de setembro, mas, neste momento, está avaliando cuidadosamente as questões sobre as quais falou hoje com o embaixador ucraniano junto à Santa Sé, Andrii Yurash, que obviamente relatou o que as autoridades ucranianas pensam sobre o perfil de uma possível visita do Papa ao seu país. As conclusões dessa avaliação não devem criar obstáculos à viagem planejada para Nur-Sultan, principalmente se Kirill eventualmente decidir participar do VII Congresso de líderes das religiões mundiais e tradicionais.
Mapa do Cazaquistão. Nur-Sultan é a capital do país, antes chamada de Astana (Foto: Asia Turismo)
O governo Zelensky, naturalmente, não tem nada contra uma visita do Papa, pelo contrário, como sempre fez, desde o dia do primeiro telefonema do Santo Padre (sábado 26 de fevereiro por volta das 20 horas) dá as boas-vindas imediatamente em nome de toda a nação ucraniana, das diferentes componentes do povo ucraniano, ao Bispo de Roma, a quem agradece pela ajuda humanitária prestada desde a crise do Donbass em 2014. A Ucrânia também agradece ao Papa pelos mais de 70 apelos à paz lançados desde 27 de fevereiro, o último dos quais foi no domingo passado, quando falou de uma nação "agredida e martirizada".
Para o presidente ucraniano, a questão é outra. Ele quer ouvir o que o Papa pensa sobre a integridade territorial do país, sobre os territórios destacados no Donbass a mando de Putin, sobre o referendo fraudulento na Crimeia, sobre os direitos ucranianos não negociáveis a serem reivindicados em uma negociação de paz entre a Ucrânia e a Rússia.
Em suma, no pensamento dos governantes ucranianos em primeiro lugar está a trágica realidade atual: ser uma nação agredida e, portanto, sua prioridade é o que fazer e como colocar a nação russa - que vem agredindo há mais de cinco meses - em posição de não prejudicar novamente (direito de defesa consagrado pela doutrina católica).
Obviamente, a presença simultânea do Papa e Kirill em Nur-Sultan torna altamente provável o encontro entre os dois líderes religiosos. Muitos aguardam a decisão do Patriarca, que parece considerar fundamental, sobretudo do ponto de vista ecumênico, uma conversa com o Bispo de Roma. Mas Kirill sabe que no terreno político-geoestratégico não conta nada e deve obedecer, o que não o incomoda, pois desde o primeiro momento se apresentou como o principal promotor religioso da agressão do Kremlin. Por isso, agora, e talvez também no futuro, corre o risco de pagar um preço muito alto.
A julgar pela forma como o presidente Vladimir Putin lidou com Francisco e a diplomacia do Vaticano, de 24 de fevereiro até hoje, não parece que o chefe do Kremlin considere necessário - por enquanto - retomar relações e consultas com o Papa e com as principais autoridades diplomáticas do Vaticano. Para ele, a prioridade absoluta é a guerra. Putin aposta tudo nessa aventura sem sentido e nunca mudará, a menos que as sanções ocidentais acabem devastando a economia do país.
Neste ponto, porém, Kirill quer saber primeiro - este é o objetivo da inesperada viagem de Antonij ao Vaticano - sobre o que se concentraria uma eventual conversa com Francisco, temas e circunstâncias, e sobretudo o Patriarca quer saber se a Sé Apostólica deseja ou não uma Declaração comum após o encontro.
Certamente uma Declaração Conjunta no modelo de Cuba, de seis anos atrás, é impensável devido aos tempos e às circunstâncias radicalmente alterados pelo ataque armado da Rússia contra a Ucrânia, embora o Papa nunca tenha usado a expressão "país agressor" diante da muitas vezes em que falou do povo ucraniano "agredido e martirizado".
Atualmente, é claro, portanto, que se não houver uma declaração conjunta, haverá duas versões separadas, a do Vaticano e a do Patriarcado de Moscou, nas quais as partes darão sua própria versão e sua própria leitura do encontro como aconteceu no último dia 16 de março com a videochamada que, semanas depois (3 - 4 de maio), se tornou uma dura controvérsia entre Francisco e Kirill.
Nesse cabo de guerra pré-negociação, muito insidioso e delicado, pesado e incerto, os dois protagonistas terão que pesar aos olhos da opinião pública vantagens e desvantagens. Para os dois a aposta em jogo é relevante, particularmente para o Papa, cuja relação com os meios de comunicação e com a liberdade de imprensa é diferente daquela do Patriarca na Rússia de Putin.
É dado como certo que para Kirill o que quer que aconteça em Nur-Sultan será um sucesso, uma vitória. É algo que o Kremlin decide.
O mesmo não é dado como certo para o Papa Francisco. Nessas partes, a imprensa, pelo menos aquela séria e não cortesã do poder, funciona de forma diferente.
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Zelensky aguarda o Papa antes de sua viagem ao Cazaquistão, onde poderia se encontrar com Kirill e gostaria de conhecer diretamente algumas das posições de Francisco sobre a agressão russa à Ucrânia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU