Desde o início das tensões entre Ucrânia e Rússia no ano de 2014 um impasse travava o posicionamento europeu: como resolver um possível corte do fornecimento de gás e petróleo russo? Em 24 de fevereiro de 2022, as tentativas diplomáticas de evitar uma guerra entre os países vizinho fracassaram, e a Rússia entrou com tropas militares de norte a sul da Ucrânia. União Europeia, Estados Unidos e demais países da Aliança Militar do Atlântico Norte, embora avisassem amplamente sobre o risco iminente, 100 dias depois ainda não conseguiram dar respostas efetivas de suporte ao país potencialmente aliado. Para o doutor em física Antonio Turiel, tanto as ações quanto as inércias das grandes potências neste conflito são sinais do "salve-se quem puder" que se institui com o caos climático, e com o novo tempo, que ele denomina de "Era do Descenso Energético".
Prof. Dr. Antonio Turiel, pesquisador do Conselho Superior de Investigações Científicas – CSIC da Espanha
Para Turiel, a Era do Descenso Energético se caracteriza pela redução das fontes de energia não-renováveis no planeta, e as novas relações de poder se caracterizam pela canalização dos recursos para si ou no controle deste mercado. Para ele, desde a crise do subprime em 2008 e a subsequente crise do petróleo vive-se um "outono da civilização", conceito que dá nome ao seu último livro: "O outono é a última etapa da vida. Até o verão, viemos crescendo: tudo era fácil e abundante. Agora isto acabou. A civilização, tal como a entendemos hoje, está chegando a uma fase crucial. Que nossa civilização termine pode significar que se adapte ao novo cenário e, portanto, surja algo novo, ou pode ser o nosso final, assim como outras civilizações entraram em colapso antes", afirmou em entrevista publicada pelo IHU.
A Guerra da Ucrânia faz as primeiras vítimas diretas desse imbróglio, que por além das justificativas militares, histórico-culturais e metafísicas, como oficialmente se manifestam Vladimir Putin e o Patriarca Kirill, respectivamente, tem o controle da logística energética. Em mais de 100 dias de guerra, foram são milhares de soldados e civis mortos, tanto por mísseis de longo-alcance quanto por tiros à queima-roupa. Mas para Turiel, a crueldade vista no Leste Europeu pode ser apenas a primeira guerra deste novo tempo:
"El otoño de la civilización", de Antonio Turiel e Juan Bordera (Ed. Escritos Contextarios, 2022)
"A guerra da Ucrânia não é a última: é a primeira da Era do Descenso Energético, aquela que marca o ponto de ruptura. Um descenso que, a menos que façamos algo rápido e coordenado, será feito a cotoveladas, alguns países pisando em outros pela falta de honestidade de alguns governos que se recusam a reconhecer que colidimos com os limites biofísicos do planeta. Neste descenso energético confuso e caótico, sempre haverá uma guerra em alguma Ucrânia, seja na Europa, América do Sul, Ásia ou África. Neste momento há mais 17 guerras ativas, além daquela que ocupa as capas dos jornais do Primeiro Mundo, que às vezes parece o prelúdio do último [mundo]".
A dependência dos combustíveis fósseis afeta diretamente a produção e o fornecimento de alimentos, e as primeiras evidências de um novo período de grande fome já começam a ser vistos em partes da África e das Américas. Logo no começo da guerra, Turiel já estimava que "os alimentos básicos podem multiplicar seu preço por dois ou três. Serão mais notados em alguns países dependentes da importação de cereais, como todo o norte da África e o Oriente Próximo, onde a situação pode ser terrível. Caminhamos para uma crise humanitária de grandes dimensões. Mas, além disso, no momento, nós a notaremos mais ainda por causa da invasão da Ucrânia, que era o celeiro da Europa, um grande produtor agrícola".
Na última semana, a FAO revelou que a Guerra da Ucrânia deve jogar 378 milhões de africanos para a condição de fome aguda.
O Prof. Dr. Antonio Turiel estará nesta sexta-feira, 03 de junho de 2022, debatendo essas questões no Ciclo de Estudos Decálogo sobre o fim do mundo, promovido pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU.
A palestra intitulada A Era do Descenso Energético. Guerras, fome e crise climática começará às 10h, e terá transmissão pela página inicial do IHU, canal do Youtube e Facebook. A participação é livre e gratuita.
Antonio Turiel é doutor em Física Teórica, especialista em oceanografia e pesquisador do Conselho Superior de Investigações Científicas – CSIC da Espanha. Recentemente publicou o livro: El otoño de la civilización (Escritos Contextatarios, 2022).
A proposta do Ciclo de Estudos Decálogo sobre o fim do mundo é discutir, de modo transdisciplinar, os desafios que o novo regime climático do planeta impõe às nossas formas de pensar, conceber e habitar o mundo. Dividido em dez conferências, a programação do ciclo retoma questões políticas, filosóficas e teológicas sobre a vida no antropoceno, considerando o ocaso e, em certo sentido, o fim/esgotamento da Modernidade.
No centro da crise, o sentido e a autorreferencialidade do ser humano em um mundo em que cada vez mais somos governados pelo que nos habituamos chamar de natureza. Trata-se, portanto, de um debate que leva em conta o deslocamento da política para a dimensão cosmopolítica. Repensar a condição humana diante do novo regime climático e a ameaça da sexta extinção em massa, justamente da espécie humana, pode ser o ponto inicial da discussão aqui proposta.
O que? Conferência "A Era do Descenso Energético. Guerras, fome e crise climática".
Com quem? Antonio Turiel, doutor em Física Teórica, especialista em oceanografia e pesquisador do Conselho Superior de Investigações Científicas – CSIC da Espanha.
Onde? Transmissão on-line no site e nas plataformas digitais do IHU: YouTube e Facebook
Quando? Nesta sexta-feira, 03 de junho, às 10h
Evento: Decálogo sobre o fim do mundo