29 Março 2022
"A RDC está presa num ciclo vicioso, pois o país precisa ter crescimento econômico para reduzir a pobreza, mas não tem os meios para implementar este crescimento e nem as condições ambientais para sustentar a expansão da economia", escreve José Eustáquio Diniz Alves, demógrafo e pesquisador em meio ambiente, em artigo publicado por EcoDebate, 28-03-2022.
"Enquanto houver pobreza no mundo, nenhuma pessoa poderá ser totalmente rica mesmo se tiver um bilhão de dólares”. Martin Luther King (1929-1968)
A República Democrática do Congo (RDC) é o país mais rico do mundo em reservas de cobalto, um metal essencial para a produção de turbinas de avião, baterias de celulares, computadores, carros, etc. Mas em termos de bem-estar da população, a RDC é um país pobre, com muitos emigrantes (que geralmente são vítimas da violência física e da xenofobia) e que está preso na armadilha da pobreza.
A renda per capita (preços constantes em US$ em poder de paridade de compra – ppp) da RDC era de US$ 2,5 mil em 1980 e caiu para menos da metade nos anos 2000, conforme mostra o gráfico abaixo, com dados do WEO do FMI de abril de 2021. A queda da renda per capita é o resultado do baixo crescimento econômico e do alto crescimento demográfico. Como a renda não cresce e a poupança não cresce, o país não tem recursos para investir no aumento da produtividade econômica, consequentemente, não há avanço da renda e do bem-estar.
A RDC tem altas taxas de fecundidade e uma estrutura etária muito jovem. Assim, com alta proporção de crianças na população a razão de dependência demográfica é alta e exige alta proporção de recursos das famílias e do Estado, restringindo a capacidade de poupança e investimento, o que inviabiliza o crescimento econômico.
O gráfico abaixo mostra que a RDC tinha uma população de 12 milhões de habitantes em 1950 e passou para 90 milhões de habitantes em 2020 (um crescimento de mais de 7 vezes em 70 anos). Mesmo com a queda da fecundidade a população da RDC deve chegar a 195 milhões em 2050 e, na hipótese média da projeção da ONU, deve atingir 362 milhões de habitantes em 2100 (o dobro dos cerca de 180 milhões de brasileiros do final do século).
A projeção média da ONU de 362 milhões de habitantes da RDC em 2100 pressupõe a queda das taxas de fecundidade, como mostrado no gráfico abaixo. Atualmente, as mulheres do Congo registram cerca de 6 filhos em média e a projeção da ONU indica que a taxa de fecundidade deve alcançar o nível de reposição (2,1 filhos por mulher) no final do século.
O gráfico abaixo mostra que a população urbana da RDC era de 2,3 milhões de pessoas em 1950, representando 19,1% da população total. A população urbana passou para 40,8 milhões em 2020 (45,6% da população total) e deve alcançar 126 milhões em 2050 (63,8% da população total).
O gráfico abaixo mostra que a RDC tinha superávit ecológico de cerca de 1400% em 1961, pois tinha uma pegada ecológica per capita de 0,95 hectares globais (gha) e uma biocapacidade per capita de 14,4 gha em 1961. Por conta da armadilha da pobreza, a pegada ecológica que já era baixa caiu ainda mais e ficou em 0,75 gha em 2017. Mas como a população cresceu muito no período a biocapacidade foi reduzida para 2,52 gha por pessoa. Isto quer dizer que o superávit ecológico congolês se reduziu para 236%. Como a população da RDC deve dobrar nos próximos 30 anos, o mais provável será o desaparecimento do superávit ecológico. Na segunda metade do século XXI a RDC deve apresentar déficit ambiental, mesmo tendo uma pegada ecológica muito baixa.
Indubitavelmente, a República Democrática do Congo tem enfrentado uma redução do padrão de vida e tem um valor do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) dos mais baixos do mundo. O alto crescimento da população tem trazido empobrecimento econômico, social e ambiental. Embora a RDC tenha baixas emissões per capita de gases de efeito estufa em função da queima de combustíveis fósseis, o desmatamento tem sido um problema considerável.
A RDC está presa num ciclo vicioso, pois o país precisa ter crescimento econômico para reduzir a pobreza, mas não tem os meios para implementar este crescimento e nem as condições ambientais para sustentar a expansão da economia.
Evidentemente, a transição demográfica é uma condição necessidade (embora não suficiente) para a redução da pobreza social e ambiental. A República Democrática do Congo precisa de uma reestruturação interna e de apoio externo para sair da armadilha da pobreza e para evitar um colapso ambiental.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
A República Democrática do Congo na armadilha da pobreza. Artigo de José Eustáquio Diniz Alves - Instituto Humanitas Unisinos - IHU