21 Dezembro 2021
Depois de uma campanha eleitoral extremamente polarizada, no domingo passado os chilenos elegeram no segundo turno o representante de esquerda Gabriel Boric como novo presidente do país. Uma eleição que olha para o futuro do Chile, mas que também marca claramente o caminho para a elaboração de seu passado. O candidato de direita, José Antonio Kast, havia de fato dado a entender a sua contrariedade em relação aos trabalhos da Assembleia Constituinte para a redação de uma nova Constituição, a favor da qual os chilenos votaram com ampla maioria no referendo do ano passado.
O comentário é do teólogo e padre italiano Marcello Neri, professor da Universidade de Flensburg, na Alemanha, publicado por Settimana News, 20-12-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Boric, que aos 35 será o presidente mais jovem já eleito, foi um dos principais líderes dos protestos estudantis de 2011 que paralisaram o país por muito tempo. Eleito em 2013, foi parlamentar por duas legislações; apoiando fortemente a necessidade de escrever um novo texto constitucional na esteira de uma série de protestos populares em 2019. Além da economia liberal de mercado, são a questão da igualdade e dos direitos dos povos indígenas os aspectos centrais da reforma constitucional do país caros para o novo presidente.
Esta campanha eleitoral presidencial rompeu o equilíbrio dos tradicionais alinhamentos partidários que caracterizaram todo o período pós-ditatorial do Chile. Apresentando dois candidatos claramente posicionados à esquerda e à direita do espectro político: sobre a necessidade de uma Constituição que correspondesse aos processos de democratização iniciados com a queda do regime de Pinochet, de um lado, e na salvaguarda do que aquele regime havia derramado nos compromissos sobre os quais tais processos foram construídos, pelo outro.
Entre o primeiro e o segundo turnos das eleições presidenciais, Boric foi capaz de moderar tanto o seu programa político como sua imagem pública; angariando assim um consenso muito mais amplo do que o esperado entre o eleitorado que tinha como prioridade a elaboração de uma nova Constituição. E sua presidência será medida por isto: ou seja, pela capacidade de dissolver de uma vez por todas o elo que ainda liga o Chile de hoje ao de Pinochet.
Imediatamente após a eleição, que viu Boric alcançar inesperados 55% dos votos, os bispos chilenos divulgaram uma mensagem de saudação e congratulações ao novo presidente: “O país deu-lhe um voto de confiança e confiou-lhe uma grande missão, dirigida a guiar o destino de nosso país como sua primeira autoridade e servidor”.
Assegurando a continuação da contribuição da Igreja Católica à vida do país, os bispos vinculam-no especialmente à construção de "uma humanidade mais justa e fraterna, onde principalmente os pobres e sofredores sejam respeitados na sua dignidade". Este é um ponto que deveria ser o de maior proximidade entre a Igreja e o programa de Boric. Para o primeiro presidente de esquerda depois de Salvador Allende, os bispos garantem uma participação da Igreja Católica na vida pública do país "sempre no respeito da ordem democrática e das suas autoridades legitimamente eleitas".
Esta não é uma garantia pequena, dada a profunda divergência entre os dois candidatos e os alinhamentos políticos que estarão presentes no novo Parlamento do país. A legitimidade dos órgãos superiores do Estado, assim como foram democraticamente escolhidos pelos cidadãos chilenos, encontra o pleno reconhecimento da Igreja Católica atual. Para a qual o passo em direção a uma nova Constituição pode representar uma oportunidade para também dissolver definitivamente aqueles vínculos que ainda a prendem ao Chile do golpe que destituiu Allende ao abrir as portas ao regime militar sob a liderança de Pinochet.
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Chile: os bispos e o novo presidente - Instituto Humanitas Unisinos - IHU