19 Julho 2021
"Na dificuldade de harmonizar espontaneamente os comportamentos, as normas coletivas vinculantes tornam-se decisivas. Que já não podem mais ser apenas em nível de Estado individual, porque o clima não tem fronteiras", escreve Andrea Lavazza, especialista em ciências cognitivas e filósofo, pesquisador do Centro Universitário Internacional de Arezzo, Itália, em artigo publicado por Avvenire, 18-07-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Falar sobre o tempo sempre foi uma forma séria, mas não exigente, de iniciar uma conversa entre estranhos. Hoje, pelo menos em alguns países, não é mais assim. Na era dos 'hiperobjetos', escreve o filósofo Timothy Morton, a sombra do aquecimento global paira sobre qualquer troca de opiniões sobre o assunto e a torna polêmica. Um hiperobjeto é um fenômeno ou entidade da qual não temos realmente consciência, porque excede nossa capacidade de enquadrá-lo do ponto de vista do espaço e do tempo. É tão presente, mas evasivo, que acabamos assumindo uma atitude hipócrita de negligência. Assim surge o negacionismo ambiental. Mas também fica claro porque se trata de um problema particularmente intratável.
Não vemos a mudança climática, mas apenas algumas manifestações meteorológicas localizadas. Somos nós mesmos os motores da degradação e ao mesmo tempo somos chamados a remediá-la. Os danos causados por uma inundação, como aquela catastrófica que atingiu o centro-norte da Europa nos últimos dias, são instantâneos e devastadores. No entanto, qualquer intervenção - em ambas as direções - pouco contribui e tem efeitos de longo prazo. Em outras palavras, se desligarmos hoje o nosso ar condicionado e nos abanamos com um leque ou se decidirmos usar o carro em vez de caminhar, a consequência sobre o acúmulo de dióxido de carbono na atmosfera será tão reduzida e em qualquer caso desconhecida para nós, que qualquer escolha individual será inevitavelmente guiada pelo interesses tangíveis de curto prazo.
Embora seja um fato que grandes cidades como Houston surgiram apenas porque os condicionadores de ar existem, passar sem eles significaria, paradoxalmente, criar refugiados ambientais em uma área riquíssima do mundo. E a mobilidade individual permitida pelos motores de combustão é, sem dúvida, uma conquista da qual é difícil pensar em renunciar. E não é só para correr nas autoestradas: quantas vidas foram salvas ou transformadas com transportes rápidos e sempre disponíveis? Por outro lado, o aquecimento global hoje mata tanto os bons como os maus, os ricos como os pobres. Mesmo na eficientíssima Alemanha, onde – imagina-se - a especulação imobiliária, a falta ou o pouco cuidado dos cursos de água não são o padrão.
A ideia de sustentabilidade ambiental é bastante recente: foi proposta organicamente em um relatório da ONU de 1987. Trata-se de adequar o desenvolvimento para garantir as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazer as suas. Em teoria, uma solução ótima que não recorre a visões antiquadas ou à renúncia ao progresso, mas sim leva a promover uma tecnologia mais eficaz e menos impactante e estilos de consumo compatíveis com os recursos limitados, sem penalizar o indivíduo.
Tudo isso pressupõe uma sensibilidade moral ampliada e uma assunção da responsabilidade pelos próprios atos numa visão integrada do ser humano-natureza ou, melhor, da Criação, como o Papa Francisco não se cansa de nos convidar a fazer, autor de uma tão convincente e tão elogiada quanto pouco seguida encíclica sobre este tema-chave do nosso tempo, a Laudato si'.
É por isso que, na dificuldade de harmonizar espontaneamente os comportamentos, as normas coletivas vinculantes tornam-se decisivas. Que já não podem mais ser apenas em nível de Estado individual, porque o clima não tem fronteiras. O Acordo Verde apresentado esta semana pela Comissão Europeia parece ir efetivamente nesta direção. É um projeto drástico e oneroso para indústrias e cidadãos. Pede para adotar carros elétricos a partir de 2035 (uma enorme revolução que está logo atrás da esquina). Obriga a pagar um preço alto pelas emissões. Impõe encargos às importações que afetam o clima. Mas agora se precaver tem um preço alto e um tempo longo. O plano poderia ser melhorado, mas seria um crime truncá-lo em nome de interesses partidários míopes. Alguém dirá que a China é a principal responsável e que não podemos perder a excelência italiana, dos automóveis à construção e à energia. Tudo verdade, mas assim continuamos a olhar para o dedo e não para a lua. É algo sobre o que todos devemos tomar consciência e discutir. Deliberar para agir, imediatamente.
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Não é uma opinião. Mudanças climáticas e estilos de vida - Instituto Humanitas Unisinos - IHU