06 Abril 2021
No momento do Angelus, no Domingo de Ramos, o Papa disse: “Entramos na Semana Santa. Pela segunda vez, a estamos vivendo no contexto da pandemia. No ano passado estávamos mais chocados, este ano estamos mais provados. E a crise econômica se agravou”. Portanto, apontou a diferença entre esta segunda Páscoa celebrada em tempos de pandemia, e a primeira: este ano não somos apanhados de surpresa, mas sentimos mais o peso da provação.
O texto é publicado por Chiesa di tutti, chiesa dei poveri, 31-03-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Esta observação também nos estimula a nos perguntar o que há de novo nesta Páscoa em comparação com a anterior, da qual a imagem daquela Sexta-Feira Santa permanece indelével em nossa memória, quando o papa no irreal vazio da Praça de São Pedro subiu sozinho até o Crucifixo para colocar a dor do mundo a seus pés.
Pois bem, o que há e novo é que esta é a primeira Páscoa celebrada depois de uma novidade igualmente marcante, que chegou através da imagem de outra solidão, a do deserto de Ur, onde uma comunhão singular de cristãos, muçulmanos, judeus "junto com os irmãos e irmãs de outras religiões”, respondeu em 6 de março de 2021 à convocação de um único Deus; juntos rezaram sem medo de ofender as diferentes ortodoxias, sem temer a acusação de irenismos, sem a preocupação de escapar do risco da heresia. Tampouco foi um evento improvisado: houve uma longa história que desde as condenações e violências mútuas, passando por difíceis e polêmicos caminhos ecumênicos e diálogos inter-religiosos, chegou à solene afirmação, compartilhada pelo Papa de Roma, suspeito de infalibilidade, e pelo imã sunita do Cairo, que "a diversidade de religião", assim como aquelas "de cor, sexo, raça e língua são uma sábia vontade divina, com a qual Deus criou os seres humanos".
Este havia sido o documento solene laboriosamente concebido e depois assinado em Abu Dhabi pelos dois líderes religiosos em união "com os Muçulmanos do Oriente e do Ocidente", junto "com os Católicos do Oriente e do Ocidente" que haviam defendido a causa da paz mundial e da convivência comum de toda a família humana "em nome de Deus que criou todos os seres humanos iguais em direitos, deveres e dignidade, e os chamou a viver juntos como irmãos entre si, para povoar a terra e difundir nela os valores da bondade, da caridade e da paz”; pacto de fraternidade que devia unir também sunitas e xiitas, como o Papa Francisco teria deixado claro a todos graças à sua visita ao Grande Aiatolá Ali al-Sistani, líder espiritual do islamismo xiita. na cidade sagrada de Najaf, no segundo dia da viagem ao Iraque.
Essa é a novidade desta Páscoa em comparação com todas as que a precederam. Não tinha acontecido ao longo dos séculos que um Deus de divisão não fosse erguido nos altares, causa e ratificação da destruição de homens e dos povos entre si. Nunca havia acontecido que toda a humanidade pudesse pensar e se reconhecer como uma, unida na terra pela finitude e pela doença, unida pelo céu pela queda do discriminante divino do monoteísmo ciumento, pelo menos neste hemisfério. Perdida a oportunidade da igualdade radical e da comunhão humana, fruto da troca com o Deus que se desceu no Filho como anunciado na carta aos Filipenses, a totalidade dos homens e das mulheres da Terra nunca haviam sentido o caráter mundial de sua condição comum. até que o reconheceram no século passado, graças a duas guerras definidas pela primeira vez justamente como guerras mundiais, combinadas com o genocídio do Holocausto do gás e das bombas atômicas.
Também foi perdida a outra grande ocasião da anexação da América no início da era moderna, tornando-se, aliás, ocasião dos éditos de alto custo que sancionaram soberania e guerra, conquista e deportação, racismo e escravidão, sexismo e exploração, isto é, a cultura e o direito da nossa depravação chamada civilização. Eis agora que, nesta Páscoa, a meticulosa construção da nossa ruína, que chegou ao risco do fim, falha devido à força de uma palavra que ressoou na planície de Nínive, a cidade grande três dias de caminho que foi salva, segundo a Bíblia e o Alcorão, apenas porque habitada por cento e vinte mil pessoas e um grande número de animais.
Portanto, a partir desta Páscoa, informados que “o Deus cínico e impiedoso não existe”, palavra de papa, podemos colocar-nos à obra para reconstruir a Terra, decidir, porque podemos, que vacinas e saúde devem ser fornecidas a todos, tirar das mãos dos depredadores a Amazônia e milhões de espécies vivas, instituir poderes que garantam a efetividade dos direitos primários e colocar nas mãos do homem, guardião e não senhor, a vida, as expectativas, a Constituição da Terra.
Este é o nosso desejo, seja o que for de bom e vital que cada um pense ou acredite.
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