08 Julho 2020
Qual é o percurso que levou uma jovem "indiferente a Deus" a ir para uma missão em uma área insegura da África e depois, feita prisioneira de um entre os grupos mais cruéis do extremismo islâmico, a abraçar a mesma fé que seus carcereiros? É a primeira vez que Silvia Romano, a jovem milanesa libertada em 9 de maio após um ano e meio do sequestro na vila de Chakama, no Quênia, conta como amadureceu sua escolha de fé. Ela faz isso em uma entrevista com Davide Piccardo, chefe da Coordenação de Associações Islâmicas em Milão (Caim), no site 'La luce', que ele dirige.
A reportagem é de Antonella Mariani, publicada por Avvenire, em 07-07-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
"Antes de ser sequestrada, eu era completamente indiferente a Deus, aliás, eu poderia me definir de descrente", começa Silvia Romano, que adotou o nome de Aisha, a esposa favorita do profeta, amada pelos sunitas e detestada pelos xiitas. O voluntariado não era uma verdadeira vocação, pelo menos até a tese de graduação, quando a estudante descobriu que queria fazer algo para combater as injustiças. "Senti a necessidade de me envolver ajudando o outro de forma concreta". Do Islã, ela admite que tinha uma ideia muito vaga, até mesmo algum preconceito. Silvia fez as primeiras perguntas imediatamente após o sequestro, quando ela foi forçada a uma dura marcha:
“Comecei a pensar: vim para ser voluntária, estava fazendo o bem, por que isso aconteceu comigo? Qual é a minha culpa? É uma coincidência ou alguém decidiu isso? Essas primeiras perguntas acredito que tenham me aproximado de Deus, inconscientemente. A partir daí, iniciei uma trajetória de busca interior feita de perguntas existenciais”. Na prisão, Silvia conta que pensou que talvez Deus a estivesse punindo por seus pecados "porque eu não acreditava nele, porque estava a anos-luz de distância dele".
Transferida do Quênia para a Somália, na sala de uma prisão, ouvia o barulho dos bombardeios. “Em uma situação de tanto terror e proximidade com a morte, comecei a orar a Deus pedindo que ele me salvasse, porque queria ver minha família novamente. Pedia-lhe outra chance, porque estava com muito medo de morrer. Aquela foi a primeira vez que me dirigi a ele".
Muito foi dito e muitas polêmicas foram levantadas pela escolha de Silvia-Aisha. Alguém falou apressadamente da "Síndrome de Estocolmo", que liga um prisioneiro a seus carcereiros. Excetuando o valor de uma escolha pessoal e da liberdade de cada uma, é bem conhecida a propensão ao proselitismo dos movimentos islâmicos radicais. E, de todos, os Shabaab são os mais cruéis.
De qualquer forma, Silvia recebeu um Alcorão: "Senti imediatamente que era um livro que guiava para o bem". A jovem de 24 anos relata que leu e releu "até que eu abracei o Islã". A partir daquele momento “olhava para o meu destino com serenidade na alma”.
Quanto à sua condição atual de italiana muçulmana, entre outras coisas, Silvia-Aisha explica ao jornal on-line das Comunidades Islâmicas de Milão que "sinto por dentro que Deus me pediu para usar o véu para elevar a minha dignidade e a minha honra, porque cobrindo o meu corpo sei que uma pessoa poderá ver minha alma”.
Respeito por Silvia, ciente, porém, de que sua busca por sentido, seu percurso de fé, dificilmente poderiam prescindir do contexto de sofrimento e de constrição em que ela se encontrava e que as maneiras pelas quais Deus toca o coração de cada um de nós continuam sempre misteriosas.
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Silvia Romano: por isso, abracei o islã - Instituto Humanitas Unisinos - IHU