22 Abril 2020
Recentemente, Inés San Martín, do Crux, chamou minha atenção para uma nota na revista PC Gamer sobre um desenvolvedor de software polonês que anunciou um novo jogo de computador chamado “Pope Simulator”. Aparentemente, ele começa com um conclave em que o jogador é eleito papa e, então, apresenta vários cenários que exigem decisões.
A reportagem é de John L. Allen Jr., publicada em Crux, 20-04-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
“Nossa ideia pressupõe a possibilidade de usar, entre outros, o chamado ‘poder suave’ do papa e, consequentemente, influenciar o destino do mundo e interferir na política internacional”, afirmou o CEO da Ultimate Games, Mateusz Zawadzki, ao anunciar o jogo.
Um porta-voz da Ultimate Games me disse que eles gastaram cerca de 72.000 mil dólares para desenvolver o jogo e que ainda não estabeleceram um preço para o jogo, que está previsto para ser lançado em 2021 para computadores e, posteriormente, para videogames como Xbox e PlayStation, mas provavelmente o preço estará na faixa dos 9 aos 19 dólares.
Eu dei uma risada, porque a minha experiência há mais de 20 anos é que uma versão gratuita do “Pope Simulator” – reconhecidamente sem uma interface gráfica lisa – já é o esporte indoor favorito da Igreja Católica e existe desde quando alcança a minha memória.
Parece que quase todo católico tem uma opinião sobre o que o papa deveria fazer ou não. Especialmente na era das mídias sociais, as pessoas também têm plataformas prontas para expressar essas opiniões. Além de relatar o papa atual, grande parte do nosso tempo acompanhando o Vaticano é gasto cobrindo potenciais adeptos do “Pope Simulator” com seguidores e uma causa.
O pensamento veio à minha mente no fim de semana passado, quando eu li uma nova carta aberta ao Papa Francisco de autoria de Frei Massimo Maria Civale, um católico de Nápoles que é o “Grão-Prior” dos “Cavaleiros Cristãos Templários de Jacques De Molay”.
(Como se vê, há uma galáxia em expansão na Itália de grupos católicos que, de uma forma ou de outra, se identificam como herdeiros dos Cavaleiros Templários das Cruzadas. A maioria é pequena, embora um ramo tenha seguidores em cerca de 50 dioceses italianas e realize um retiro espiritual anual no Vaticano, incluindo as vestes brancas e as cruzes vermelhas dos Templários de outrora.)
A carta de Civale é um pedido ao Papa Francisco para que ele “reabra as igrejas” em todo o mundo, ou seja, para que ele emita uma diretriz no sentido de que todos os padres devem possibilitar que qualquer pessoa que queira receber a Eucaristia fisicamente o faça, apesar das medidas de quarentena por causa do coronavírus.
Ele começou dizendo que os decretos do governo na Itália sugerem que as igrejas podem ser abertas se respeitarem as medidas higiênicas e sanitárias necessárias para conter a pandemia, e, assim, os Cavaleiros estão “entristecidos com as disposições de fechamento adotadas pelas dioceses italianas”.
“Nós, pobres cavaleiros de Cristo católicos, desejamos combater a boa batalha da fé para receber a Eucaristia, que é o centro da nossa vida espiritual”, escreveu Civale.
“A comunhão espiritual que recebemos com os meios de comunicação não nos basta mais”, disse ele. “Precisamos do Corpo vivo e verdadeiro de Jesus para a salvação das nossas almas.”
“Com esse propósito, pedimos-lhe que convide todas as dioceses do mundo a reabrirem as portas das igrejas e a predispor que todo sacerdote preveja corredores eucarísticos no respeito às normas higiênicas sanitárias, para que cada fiel que deseje possa receber o Pão da Vida”, escreveu Civale.
Eu destaco essa carta simplesmente porque ela chegou na minha caixa de entrada ao mesmo tempo em que vi o anúncio sobre o jogo, mas comunicados semelhantes vêm e vão o tempo todo.
Para ser claro, em princípio, não há nada de errado com eles. O Direito Canônico diz que os católicos têm o direito de comunicar as suas necessidades a seus pastores, e Civale foi menos agressivo do que muitos. Ele até encerrou a sua carta dizendo a Francisco: “Queremos-lhe bem e faremos de tudo para sermos testemunhas do Senhor Ressuscitado”.
Em certo nível, esse fascínio pela maneira como um papa emprega a sua autoridade é um tributo tanto ao próprio papado, que de alguma forma permanece profundamente relevante apesar de séculos de secularização, quanto aos papas modernos, que deram exemplos convincentes de como o uso inspirado do cargo ainda pode mover montanhas.
(Suspeito que não seja por acaso que o “Pope Simulator” tenha sido desenvolvido na Polônia, onde uma geração inteira se lembra do papel de São João Paulo II na dissolução do império soviético.)
Em outro nível, esse desejo popular de dizer ao papa o que ele deveria fazer também é um tributo ao ardor dos católicos comuns, muitos dos quais são apaixonados pela Igreja e se sentem chamados a pressioná-la para realizar a melhor versão de si mesma, independentemente se ela pode entender isso.
Como o “Pope Simulator” aparentemente não estará disponível comercialmente por pelo menos um ano, teremos que esperar um pouco para jogá-lo e dar uma volta virtual no papamóvel. Quando esse momento chegar, no entanto, talvez valha a pena refletir sobre alguns pontos.
Primeiro, há um mundo de diferenças entre brincar de papa e realmente ser papa, uma das quais é que um papa não pode simplesmente desligar a tela quando fica frustrado ou entediado. Ele ainda tem que tomar decisões, quer sinta vontade de jogar ou não.
Segundo, se você quiser ter a verdadeira experiência de ser papa, tente jogar com pelo menos 100 pessoas na sala cochichando no seu ouvido sobre o que fazer e com milhares de outras enviando tuítes desagradáveis sobre aquilo que você acabar escolhendo.
Se você ainda achar divertido... Bem, agora que os videogames podem ser incluídos nas Olimpíadas de 2024, você pode estar rumo a uma medalha de ouro.
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Esqueça o videogame: “Pope Simulator” já é o passatempo favorito da Igreja - Instituto Humanitas Unisinos - IHU