02 Dezembro 2019
Não há nenhuma "invasão", nos últimos dois anos a população global de migrantes internacionais aumentou apenas 0,1%.
A reportagem é de Umberto Mazzantini, publicada por Green Report, 28-11-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
Apresentando o World Migration Report 2020 (WMR 2020) na reunião do Conselho da Organização Internacional para a Migração (IOM) em curso em Genebra, o diretor geral da IOM, António Vitorino, lembrou que "num ambiente midiático global fortemente interessado na questão da migração, a necessidade de análises fidedignas e baseadas em evidências desse problema decisivo de nosso tempo nunca foi tão urgente. Como agência das Nações Unidas responsável pela migração, foi por longo tempo imperativo da IOM promover um entendimento equilibrado da migração em todo o mundo". E a WMR 2020 continua na esteira do compromisso da organização de fornecer informações sobre migração que sejam bem estudadas, rigorosas e acessíveis, mas que infelizmente são ignoradas e/ou manipuladas por políticos que fizeram da xenofobia e das fake news a matéria-prima com o qual obter consenso e poder e intoxicar a opinião pública.
Vitorino disse que "a IOM tem a obrigação de desmistificar a complexidade e a diversidade da mobilidade humana. Como mostra este relatório, temos um conjunto de dados e informações que estão em constante crescimento e aprimoramento, o que podem nos ajudar a formar uma melhor noção das características básicas da migração em tempos cada vez mais incertos".
O WMR 2020 é a décima edição de um relatório publicado pela primeira vez há 20 anos e fornece os dados e informações mais recentes sobre a migração, bem como a análise de problemas de migração complexos e emergentes. O WMR 2018 foi baixado mais de 400.000 vezes. Em uma era de desinformação, os tópicos abordados no relatório incluem a mobilidade humana e a mudança climática, as contribuições dos migrantes nos países que os recebem e aqueles de onde eles partiram, as crianças e as migrações não seguras, a migração e a saúde, informações oportunas e relevantes que não deveriam ser lidas apenas por especialistas, mas principalmente por tomadores de decisão políticos e pelo público em geral.
O embaixador alemão na ONU, Michael von Ungern-Sternberg, enfatizou que "a migração se tornou um tema muito debatido nas sociedades de todo o mundo. Esse é um bom desenvolvimento. No entanto, devemos enfrentar o risco de uma indevida politização e da falsificação de fatos. O Relatório Mundial sobre as Migrações contribuirá para uma discussão construtiva sobre esse tema extremamente delicado e lançará as bases para a necessária cooperação internacional".
Marie McAuliffe, codiretora da WMR 2020, também enfatizou a importância das parcerias: "Para obter as evidências mais recentes sobre migração, os capítulos temáticos foram escritos por alguns dos principais pesquisadores da área e o relatório foi escrito em conjunto com um famoso estudioso, o professor Binod Khadria, da Universidade Jawaharlal Nehru, na Índia. Para garantir que o WMR 2020 forneça uma contribuição de alta qualidade como um relatório de referência importante sobre a migração, antes de editá-lo, o rascunho do relatório foi revisado pelos principais estudiosos da migração e especialistas temáticos da IOM”.
Em 2019, o número de migrantes internacionais é estimado em 270 milhões e o principal destino continua sendo os Estados Unidos da América, com 51 milhões de migrantes, outros 90 milhões de migrantes internacionais vivem divididos entre os muitos países europeus, incluindo países extra-UE (e entre estes existem centenas de milhares de migrantes italianos de nova geração). A IOM ressalta que, enquanto a neo e extrema direita soberanista em todo o mundo ocidental falam de "invasão", nos últimos dois anos a população global de migrantes internacionais aumentou apenas em 0,1%. A agência da ONU explica que "Este número representa apenas uma pequena fração da população mundial (3,5%), o que significa que a grande maioria da população mundial (96,5%) reside no país em que nasceu".
O relatório também dissipa outro mito ("todos eles são homens jovens que roubam nosso trabalho"): 52% dos migrantes internacionais são homens e 48% são mulheres, e cerca de dois terços deles procuram trabalho, ou seja, 164 milhões de pessoas.
O quanto seja distorcida e falsificada a visão da direita italiana ("todos são negros e islâmicos") sobre a migração é evidenciado pelo WMR 2020 quando trata dos componentes étnicos da população migrante: "A Índia continua sendo o maior país de origem dos migrantes internacionais, com 17,5 milhões de pessoas vivendo no exterior, seguido pelo México (11,8 milhões) e China (10,7 milhões)". Com relação ao "eles roubam nosso trabalho", outros resultados do relatório indicam que nos países de alta renda, como a Itália, o número de trabalhadores migrantes diminuiu ligeiramente - de 112,3 para 111,2 milhões -, mas aumentou em outros lugares. O aumento mais forte ocorreu nos países de renda média "mais ricos", onde os migrantes internacionais aumentaram de 17,5 para 30,5 milhões.
Se passarmos ao slogan agora obsoleto e hipócrita "vamos ajudá-los na casa deles", se descobre que os próprios migrantes se ajudam na casa deles, assim como faziam e fazem os milhões de migrantes italianos espalhados em todo o mundo. De fato, o envio de fundos para a pátria por migrantes internacionais aumentou para alcançar US$ 689 bilhões em 2018 e os principais beneficiários são a Índia (78,6 bilhões de dólares), a China (67,4 bilhões de dólares), o México (35,7 bilhões de dólares) e as Filipinas (34 bilhões de dólares). Com 68 bilhões de dólares, os EUA continuam sendo a principal fonte de remessas dos migrantes, seguidos pelos Emirados Árabes Unidos (44,4 bilhões) e pela Arábia Saudita (36,1 bilhões).
Embora, apesar de Trump e seus muros, os EUA continuem sendo o país que atrai mais migrantes, o relatório da IOM confirma que existem outros corredores migratórios importantes que vão dos países mais pobres aos mais ricos, “como aqueles para a França, Rússia, Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita, confirmando que para os migrantes a Itália permanece acima de tudo um país de trânsito".
A IOM enfatiza que "Essa tendência provavelmente permanecerá a mesma por muitos anos, enquanto as populações de algumas sub-regiões e países em desenvolvimento deverão aumentar nas próximas décadas, o que exercerá uma pressão migratória sobre as gerações futuras".
O WMR 2020 também destaca que "Na África, Ásia e Europa, a maioria dos migrantes internacionais permanece em suas regiões de nascimento, mas não a maioria dos migrantes na América Latina, no Caribe e na América do Norte”.
Na Oceania em 2019 os níveis de migração permaneceram praticamente os mesmos, mas ali é percebida a nova causa possível de futuras migrações. Como disse Doreen Debrum, representante permanente da ONU para as Ilhas Marshall, em Genebra, "a República das Ilhas Marshall está à beira de uma catástrofe. Cada relatório científico leva a nossa casa a uma exposição mais profunda e séria aos riscos, às ameaças e aos perigos iminentes representados pelas mudanças climáticas; isso colocaria em risco toda a população das Marshall e provavelmente envolveria a transferência forçada de nosso povo e a perda de nossa pátria".
Em relação ao Oriente Médio, os números do relatório mostram que, na realidade, são os países do Golfo, e não a Europa, que abrigam o maior número de trabalhadores migrantes temporários do mundo, em particular os Emirados Árabes Unidos, onde os migrantes representam cerca de 90% da população.
A WMR 2020 denuncia que, nos últimos dois anos, os conflitos e violências em curso na República Centro-Africana, República Democrática do Congo (RDC), Mianmar, Sudão do Sul, Síria e Iêmen provocaram migrações internas em massa, e o monitoramento do deslocamento interno da IOM aponta que "até o final de 2018, 41,3 milhões de pessoas haviam sido forçadas a deixar suas casas: um recorde desde o início do monitoramento em 1998".
O país com mais refugiados internos é a Síria (6,1 milhões), seguida pela Colômbia (5,8 milhões), da qual ninguém fala, e pela RDC (3,1 milhões). Após nove anos de guerra civil e internacional, a Síria também é o primeiro país de origem de refugiados com mais de 6 milhões de pessoas, seguido pelo Afeganistão (cerca de 2,5 milhões), de um total mundial de cerca de 26 milhões.
Depois, há o impacto de catástrofes climáticas e meteorológicas: o relatório observa que "o tufão Mangkhut nas Filipinas contribuiu para o fato de que, no final de 2018, 3,8 milhões de pessoas tenham sido deslocadas nessas regiões, ou seja, o mais elevado número do mundo”. Ficou-se sabendo pouco ou nada, mas é uma enormidade em relação às consequências dos desastres climáticos que afetam a Europa e a América do Norte e que transbordam nas páginas de jornais e telas de televisão, computadores e smartphones”.
Depois de ler o WMR 2020, Jacqueline Bhabha, que leciona na Universidade de Harvard, disse. “Vários capítulos do relatório são perfeitos para introduzir meus alunos a novos tópicos. O relatório está muito bem escrito e bem estudado. Como a migração continua a ser um problema de crescente interesse, a WMR 2020 é a chave para atender à crescente demanda de pesquisa sobre esse tema baseada em evidências e de alta qualidade, contribuindo também para desmascarar as notícias falsas e as desinformações, projetadas para influenciar opinião pública e debate político".
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Existem 270 milhões de migrantes internacionais no mundo e eles sustentam suas famílias com US$ 689 bilhões - Instituto Humanitas Unisinos - IHU