25 Outubro 2019
O crucifixo com a foice e o martelo doado por Evo Morales, a capa do Economist que afirmava que o papa fala como Lênin e o Papa, questionado, que primeiro se defende. A última vez que ele fez isso foi na semana passada. "Eu digo as mesmas coisas que João Paulo II, mas eles me acusam de ser comunista". Agora, porém, na Argentina, foi publicado um livro que acompanha as raízes ideológicas nas quais o jovem Mario Jorge Bergoglio buscou inspiração. "O Papa Francisco mais que comunista é peronista. É um erro enquadrá-lo na ideologia marxista. Se Perón ainda estivesse vivo, ele seria o primeiro a dizer que é Perón que é Francisquista”.
Aldo Duzdevich, jurista e afamado escritor argentino que na época de estudante fez parte da guerrilha que militava no movimento terrorista dos Montoneros durante os anos do golpe, tem poucas dúvidas sobre os fundamentos ideológicos que podem ser identificados na pregação do Papa.
Exatamente nestes últimos dias Duzdevich esteve em Santa Marta para lhe entregar seu último livro intitulado Salvados por Francisco, um livro cheio de relatos e de detalhes inéditos relacionados à ação realizada pelo jovem jesuíta em uma Argentina devastada pela violência. "Ele foi um padre que se arriscou pessoalmente para ajudar os perseguidos pela ditadura. Há provas, testemunhos, evidências de ex-militantes dos Montoneros. Muitos, se hoje estão vivos, devem isso ao que Bergoglio fez por eles”.
A reportagem é de Franca Giansoldati, publicada no jornal Il Messaggero, 23-10-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
Por exemplo, relata o escritor, a um deles, el cura, o padre, não hesitou em emprestar sua batina sacerdotal e documentos para que pudesse chegar à fronteira e atravessá-la. O papa agradeceu a Duzdevich por refrescar sua memória, já que muitos detalhes quase haviam sido esquecidos por causa do tempo, mas, depois de ler os depoimentos, as imagens daqueles momentos cheios de tensão voltaram a aparecer novamente diante dele. Respirava-se perigo. Não havia muito tempo a perder e se alguém queria proteger estudantes, sindicalistas, professores na mira da repressão, não podia titubear. Eram presos e levados, torturados, outros desapareceram. O autor lista para o Messaggero as possíveis assonâncias entre a posição teológica de Francisco e o peronismo. "Perón tinha muito claro que poderia avançar em três pilares: justiça social, independência econômica e soberania política. Também sabia que, para buscar um consenso mais amplo, precisava elaborar propostas próximas da Igreja no tema da justiça social, na busca da paz baseada no amor ao próximo. Perón sempre usou elementos da doutrina social da Igreja”.
Eduardo Horacio Garcia, por exemplo, considerado próximo a Bergoglio, no ano passado, em uma homilia, explicou que "a posição de Perón é uma proposta que supera todas as ideologias existentes porque está imbuída da doutrina social. Daí o seu valor universal". Quando Bergoglio era garoto, participou da Ação Católica e foi espectador do imenso conflito entre o peronismo nascente e a parte mais conservadora da autoridade eclesial. Posteriormente, ele teve vínculos significativas com uma série de pensadores argentinos e uruguaios, incluindo sua amiga Amelia Podetti, que lhe ofereceu uma visão complexa e atraente da Teologia da Libertação, com a opção preferencial pelos pobres e a terminologia relacionada ao povo.
Segundo Aldo Duzdevich, a exortação apostólica Evangeli Gaudium desenvolve precisamente essa direção e, em alguns pontos (222-237), fala de conceitos análogos, "especialmente quando se refere aos processos para a mudança que superam o espaço e o tempo, ou ao fato de que a unidade prevalece sobre qualquer conflito, e que a realidade é muito mais importante que uma ideia e que o todo é superior a uma parte". Até mesmo a frase de despedida que Bergoglio gosta de usar quando cumprimenta a multidão ou grupos de fiéis, por favor, orem por mim, parece a mesma que Perón dizia aos convidados que se despediam dele.
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As raízes peronistas do Papa Bergoglio - Instituto Humanitas Unisinos - IHU