Por: André | 20 Mai 2016
A presidenta das Mães da Praça de Maio, Hebe de Bonafini, referiu-se ao Papa Francisco como alguém que “exerce um papel ao lado do povo”, às vésperas da sua visita ao Vaticano.
Aos 87 anos, a mulher dos lenços brancos, com dois de seus três filhos desaparecidos, prepara sua viagem a Roma para ser recebida por seu compatriota, o ex-cardeal Jorge Mario Bergoglio, no dia 27 de maio na casa pontifícia de Santa Marta.
A dirigente humanitária admitiu ter se equivocado em suas críticas ao papa e agora o elogia, em uma entrevista que concedeu à agência AFP, publicada por Perfil, 18-05-2016. A tradução é de André Langer.
Eis a entrevista.
Por que aceitou o convite do Papa?
Fui convidada quando ele assumiu (2013). Eu dizia: para que ir tão longe? Todo o mundo estava indo. Não me parecia uma boa ideia.
Você o havia criticado quando foi escolhido papa.
Quando Bergoglio se converteu em Francisco, começamos a conhecer a outra pessoa; não sabíamos que ele ia às favelas. Creio que Francisco suplantou Bergoglio. Nas favelas me dizem que ele aparecia mesmo em dias de chuva, de botas, ajudava a dar de comer às crianças, a tirá-las quando uma epidemia se espalhava.
Equivocaram-se com ele?
Sim. Não sabíamos que ia aos bairros para trabalhar com os pobres.
E agora, o que pensa?
Se não tivesse esperanças não iria vê-lo. Não sou de fazer coisas falsas.
O que pensa em lhe dizer?
Não vou falar de coisas pessoas nem das Mães; seria uma atitude egoísta. As coisas que estão acontecendo na Argentina e na América Latina são muito sérias.
Missa pelos assassinados
O Vaticano anunciou que abrirá arquivos da ditadura.
Eu não pedi isso. Ninguém guarda coisas muito sérias que fez. Não acredito nos arquivos de ninguém, nem dos ‘yanquis’, nem da Igreja. Havia bispos que davam a bênção àqueles que jogavam os nossos filhos ao mar, isso não vão guardar.
Nunca lhe pediu nada?
Sim, que celebrasse uma missa no Vaticano por todos os padres, freiras e bispos desaparecidos do Terceiro Mundo. Algo como a canonização de Arnulfo Romero (arcebispo salvadorenho assassinado).
O Papa tem uma posição política?
Ele é peronista (movimento político fundado por Juan Perón na década de 1940). E o peronismo está com o povo, com os trabalhadores. O slogan de Francisco é teto, trabalho e terra. São slogans peronistas.
Francisco emite mensagens políticas?
Sim. Disse aos jovens para que façam barulho. Nem mesmo um padre diz isso! É uma postura bem clara. Tomem as ruas, não fiquem trancados. Ele tem poder mundial. Impediu um bombardeio da OTAN (na Síria). É o primeiro papa que exerce um papel ao lado do povo.
O papa envia sinais?
Todo o tempo. Vai a povos despossuídos da África. Lava os pés de um preso. O fato de trazer sírios para o Vaticano quer dizer que cada um pode alojar uma família.
O discurso já esta preparado?
Escrevi algumas coisas (mostra papéis que tem na mão). Logo apago uma coisa, mudo outras. Não vou contar sobre o que vou falar com ele, porque é uma reunião privada. Levo dois projetos, duas propostas. Se ele considerar que posso falar sobre eles, vou fazê-lo. Quero respeitar.
Crítica a Macri
O governo argentino mostra-se irritado com a audiência.
Eles estão irritados com tudo o que eu faço. Este governo é inimigo do povo. Desempregam 1.200 trabalhadores por dia. Reprimem as crianças e adolescentes que jogam bola nos bairros pobres. Querem impor o medo e o terror. Isto é muito perigoso. Com os governos de Néstor e Cristina Kirchner (centro-esquerda) éramos felizes. Ele mostra ódio de classe, incentiva a violência.
Teme uma explosão de violência?
Eles querem isso. Houve ataques a balas contra locais partidários. Mas nós dizemos não à violência. Defendemos a vida. Os hospitais não têm remédios. O pão subiu 40 pesos e o leito 20 pesos (30% de aumento). O que querem, saques? A população está preocupada em perder o emprego.
Vai levar um presente para o Papa?
Algo pequeno. Não vou fazer o que fez (o presidente Mauricio) Macri, que lhe deu de presente um crucifixo. É como levar laranjas para o Paraguai! E não vou comprar roupa especial para a audiência. As pessoas me ligam e me dizem que a reunião vai durar mais do que os 22 minutos que o papa deu este ano a Macri (risos).
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Hebe de Bonafini reconheceu ter se equivocado com o Papa Francisco e se diz orgulhosa: “Ele é peronista” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU