26 Julho 2019
"Um pensamento novo não triunfa, e menos em ambientes hostis ou estranhos, mas sim a força de apresentá-lo, de discuti-lo, de gritá-lo cada vez mais alto”. Isso é atual para o caso de López Obrador, que de forma quase desesperada, a fim de fazer a Nação compreender a necessária transformação que, para ele, requer o país, depois do roubo, do festim, neoliberal.
Contudo, não se trata de romper com o modelo capitalista ou sair da órbita imperial, segundo a noção de José Luis Ceceña, mas sim de ter uma sociedade mais justa, se isso ainda é possível.
O artigo é de José Luis Avendaño C., publicado por Alai, 23-07-2019. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
A globalização – fazer homogêneas as sociedades, em vista do desenvolvimento econômico baseado no mercado – não implica necessariamente desaparecer ou enfraquecer o Estado-Nação, mas sim que esse potencialize as forças do mercado, e sirvam ao capital hegemônico; forças contrárias aos interesses das sociedades ou, melhor dito, dos povos. Isso é, todos seus recursos naturais e humanos, entregues por trocados, e disponibilizados a serviço de alguns, que não utilizam de maneira soberana e independente.
Tampouco, com a globalização, desaparecem os nacionalismos que, como ideologia, se traduzem em pertencimentos a certos partidos e territórios, alheios aos interesses do povo trabalhador, como vislumbrou Rosa Luxemburgo em sua negativa ao que seria a Primeira Guerra Mundial (1914-18), guerra interimperialista pela divisão do mundo, do mercado.
Hoje no mundo, existem nacionalismos ofensivos, que chegam à ingerência e à intervenção/ocupação neocolonial, como dos EUA, hoje exacerbado com a presença de Donald Trump, e os nacionalismos de caráter defensivo, como o do México, que por geografia e história, tem de se cuidar, sobretudo, dos EUA, seu voraz vizinho do norte.
Na construção de nações são primordiais instituições fortes, começando pelo próprio Estado. Porém, temos visto, como o caso da América Latina, com uma independência mais formal que real ou limitada, ditas instituições são subordinadas e alienadas. Frente a sociedades fracas, se levantam os homens fortes ou caudilhos, que substituem tais sociedades, e creem interpretar seus desejos e falam por ela.
Isso foi o que aconteceu no México ao longo do século XIX, uma vez que alcançou, formalmente, sua independência. A lista é longa: Iturbide, Santa Anna, Porfírio Diaz, sem esquecer do mesmo Juárez. No século XX, se instaurou o presidencialismo, apontado pelo regime de partido dominante.
Hoje, entre outras coisas, se encontra a discussão, devido à personalidade de Andrés Manuel López Obrador, educado na antiga tradição do nacionalismo revolucionário, exerce seu mandato de forma autoritária, dadas suas maneiras de ser e fazer, visível em suas matutinas entrevistas coletivas. Ele é seu próprio porta-voz. Cansaço, desgaste e desespero por não ser compreendido já se somam às suas atitudes.
Assim mesmo, seu estilo deixa muito pouco ou nenhuma margem de manobra independente ao seu gabinete. E esta sua peculiar forma de entender e exercer a democracia, em mãos levantadas e com perguntas induzidas – “É verdade que sim..?” ou “É verdade que não...” –, que não deixam espaço à crítica, ainda que vinha da esquerda, aos que, ele, “liberal”, tacha de “conservadores”.
López Obrador se compara a Benito Juárez, autor da segunda transformação do país quando, depois da guerra de Reforma e Intervenção, afirmou o México como um Estado-nação, uma segunda independência. Hoje AMLO se vê como o autor da quarta transformação, que está mais no espírito de José María Morelos, media a riqueza e a indigência.
No livro El Estado laico y sus Malquerientes (UNAM/Debate. México. 2008), Carlos Monsiváis se pergunta: “Juárez se limitou a impor sua mensagem?”. E para sua resposta, recorre ao historiador Daniel Cosío Villegas: “Um pensamento novo não triunfa, e menos em ambientes hostis ou estranhos, mas sim a força de apresentá-lo, de discuti-lo, de gritá-lo cada vez mais alto”. Isso é atual para o caso de López Obrador, que de forma quase desesperada, a fim de fazer a Nação compreender a necessária transformação que, para ele, requer o país, depois do roubo, do festim, neoliberal..
Diferente das transformações anteriores (Independência, Reforma, Revolução), esta 4ªT, seria de caráter não-violento. Por isso suas constantes alusões a não confrontação, de amor e paz, ainda contra alguém como Trump que, um dia sim e outro também, busca alguma forma de molestar seus vizinhos do sul, e atiça o racismo e a xenofobia. Contudo, não se trata de romper com o modelo capitalista ou sair da órbita imperial, segundo a noção de José Luis Ceceña, mas sim de ter uma sociedade mais justa, se isso ainda é possível.
No entanto, desde seu primeiro dia de governo, López Obrador tem confrontações com meio-mundo, não unicamente representantes do capital – agência de classificação internacionais, especialmente –, mas sim igualmente com algumas comunidades indígenas, que não compreendem seu projeto de desenvolvimento, que se sentem alheios, alienados. Com os primeiros, concluiu como vozes que espreitam uma recessão. No entanto, "estamos indo bem", segundo o presidente, que obviamente está com pressa.
Sejam heranças do passado, ou não, o clima de insegurança e violência não cessa, para o qual fez reaparecer a Guarda Nacional na fronteira sul. Uma Guarda para a segurança pública para sanar insuficiências e deficiências dos corpos de polícia na luta contra o narcotráfico. Uma Guarda, cuja presença data do século XIX, como narra Guillermo Prieto, frente à intervenção estadunidense em 1846 e 1847.
“Baionetas ou desenvolvimento econômico independente. Deveríamos calar nossos mortos, chorar silenciosamente em algum rincão oculto?”, se interroga Gonzalo Martré, em Los Símbolos Transparentes 1978), novela sobre o 1968 mexicano. Situação vigente, cinquenta anos depois. Dilema que as três transformações anteriores não puderam resolver.
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México. López Obrador em seu labirinto - Instituto Humanitas Unisinos - IHU