24 Abril 2019
O Papa Francisco, conhecido por beijar os pés de muçulmanos, alertar sobre os perigos dos combustíveis fósseis e falar profeticamente sobre a morte espiritual da construção de muros, ganhou a reputação de ser anti-Trump.
Publicamos aqui o editorial do jornal National Catholic Reporter, 23-04-2019. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O que aprendemos sobre Donald Trump ao longo dos dois últimos anos é que, embora o presidente tenda a ser agressivo, seja contra as mulheres do Congresso ou ao protestar contra os jogadores de futebol americano, ele deixou o líder religioso mais poderoso do mundo em grande parte ileso.
Francisco pode muito bem ter um adversário mais temível em Steve Bannon, o ex-assessor de campanha de Trump que recentemente observou que foi a obra de Deus que gerou dezenas de milhares de votos no Wisconsin e no Michigan no triunfo eleitoral dos Republicanos em 2016 e que reivindicou crédito para a “alt right”, expressão mal definida geralmente associada aos defensores do Memorial da Confederação e trolls da internet anti-imigrantes.
Agora, Bannon está direcionando sua providencial magia ao Vaticano, apontando contra o papa, com a ajuda de ricos amigos norte-americanos e europeus. Ele até comprou um mosteiro em um vilarejo italiano nos arredores de Roma, uma espécie de contra-Vaticano, onde está programando seminários para formar uma nova geração de lideranças naquilo que ele chama de nacionalismo populista. Os italianos da região que protestam contra os seus planos preferem chamar isso de fascismo.
Independentemente de como se chame isso, o correspondente Richard Engel da NBC, em uma reportagem que foi ao ar no fim de semana do Domingo de Ramos, relata que Bannon está falando sério. Engel observa que Bannon e outros inimigos do papa o veem como “um liberal de esquerda e estão indo atrás dele”.
Bannon, buscando novos campos para conquistar após ser demitido por Trump há dois anos do seu trabalho como consultor da Casa Branca, diz ter o apoio de poderosos norte-americanos e católicos proeminentes, entre eles o cardeal Raymond Burke. Seu grito de guerra é o fracasso do papa em resolver a crise dos abusos sexuais que, segundo Bannon, ameaça levar a Igreja à falência e forçá-la a liquidar suas propriedades. Talvez tenha sido a edição da reportagem de Engel, mas Bannon se concentra nas propriedades, e não nas vítimas.
O nacionalismo populista de Bannon continua sendo um conceito desconfortável para ser enquadrado em um marco católico. Desde que Paulo convenceu Pedro de que a Igreja deveria abrir mão da circuncisão obrigatória para os convertidos, sair do seu casulo judaico e abraçar totalmente o mundo dos gentios, o catolicismo se levantou em nome do universalismo. O papado lutou por muito tempo contra reis europeus que queriam controlar a Igreja para fins nacionalistas, e, quando os católicos chegaram aos Estados Unidos, eles eram vistos frequentemente como agentes de um Estado estrangeiro hostil, acusações que descarrilaram a campanha presidencial de Al Smith, em 1928.
Agora, Bannon assumiu o manto nacionalista contra o papa. Seguindo a liderança de Trump, ele aconselhou os partidos nacionalistas europeus a continuarem sua agitação anti-imigrantes. Isso está em flagrante contraste com Francisco.
Engel também aponta para outra parte do apelo de Bannon. Francisco ainda desfruta de índices de popularidade que Trump, sozinho, só poderia rezar para obter. Mas há um segmento entre os católicos que ouviram Francisco sobre os perigos do capitalismo desenfreado, ecoando os papas anteriores, embora com um fervor ainda maior que vem de suas raízes latinas. Esse grupo não gosta do que está ouvindo.
Como diz Engel, o movimento de Bannon é financiado por aqueles “que acham que o papa é ruim para seus negócios”.
Bannon, embora acolhendo esse apoio com sua promessa de muito dinheiro, leva a visão do papa sobre o ensino católico para um nível pessoal.
“Esse é o problema. (...) Ele está constantemente jogando todas as culpas do mundo sobre o movimento populista nacionalista”, disse Bannon a Engel sobre o motivo de ele se opor a Francisco.
Embora o apoio à agenda de Bannon possa ser insignificante entre os fiéis nos bancos das igrejas, o fato de ele estar reivindicando a lealdade de uma porção de católicos influentes é aterrador. Os bispos, em particular, precisam ter clareza sobre de que lado estão: o do papa? Ou o do emergente movimento anti-Francisco de Bannon? O que está em jogo é nada menos do que a própria sobrevivência de uma Igreja Católica unificada.
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Movimento anti-Francisco liderado por Bannon ameaça a unidade da Igreja - Instituto Humanitas Unisinos - IHU