26 Março 2018
A FAO, o World Food Program e outras agências das Nações Unidas apresentam um relatório conjunto: fome e escassez de alimentos não são provocadas apenas por eventos naturais, mas, acima de tudo, por conflitos.
A reportagem é de Giampaolo Cadalanu, publicada no jornal La Repubblica, 22-03-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A FAO as chama de “crises alimentares”, ou, em seus documentos, fala de “insegurança”. Às vezes, aparece a palavra “fome”. A linguagem é a das agências da ONU, portanto, de uma necessidade fria, quase asséptica, tendencialmente imparcial. Mas palavras que permanecem abstratas no Terceiro Milênio não são mais suficientes: talvez valha a pena começar a usar termos como “esfomeadores”. Porque a mensagem que vem do “Relatório global sobre as crises alimentares 2018”, realizado pela FAO, World Food Program e outras agências da ONU é clara demais: a fome não é um destino, não vem por acaso sobre os mais infelizes da Terra. A fome vem através de responsabilidades humanas muito precisas.
Acima de tudo, ela vem com as guerras. Não é realmente uma novidade, mas, mostrado claramente em uma tabela, parece ainda mais escandaloso. Quer sejam conflitos preventivos ou defensivos, quer sejam missões chamadas de humanitárias, acertos de contas brutais ou, ao contrário, simplesmente operações de poder: para aqueles que continuam envolvidos nos combates ou são atingidos pelas consequências, isso não importa. Não importa aos 17 milhões de iemenitas, aos quase 9 milhões de nigerianos, aos 7,7 milhões de congoleses, aos 7,6 milhões de afegãos, aos 6,5 milhões de sírios, e assim por diante, do Sudão do Sul à Somália, passando pelo Iraque.
É a conta daqueles que, ainda na linguagem neutralizada dos documentos oficiais, são vítimas da “insegurança alimentar” por motivos ligados às guerras. Famintos por causa das escolhas de outros, em palavras mais simples.
Outra tabela do horror coloca em ordem as populações cuja capacidade de se alimentar é “insegura” por motivos climáticos. E aqui devemos nos perguntar: os 8,5 milhões da Etiópia, os 5,1 milhões do Malawi, os 4,1 milhões do Zimbábue, os 3,4 milhões do Quênia, e assim por diante, serão mais propensos a amaldiçoar o destino ou os poderosos do planeta?
Entre estes últimos, há vários que não acreditam no efeito estufa e nas mudanças climáticas. Ou, pelo menos, garantem um ceticismo mercenário, com conclusões que favorecem, invariavelmente, interesses industriais muito concretos. Mas mesmo se quiséssemos atribuir a responsabilidade total pela fome e pela seca à natureza, não devemos esquecer que as capacidades produtivas do planeta, se geridas adequadamente e sem guerras, são mais do que suficientes para saciar também os mais desafortunados.
Se fosse necessária uma confirmação visual para entender como funciona a distribuição das desgraças, basta dar uma olhada nos mapas publicados no relatório que a FAO desenvolveu com outras agências internacionais: as áreas indicadas com as cores da necessidade se sobrepõem às das crises políticas, com as zonas de emergência absoluta no Afeganistão, no Congo, no Chifre da África e, especialmente, no Iêmen, onde a gravidade do confronto se soma à nefasta decisão das partes, que, de fato, limitam o acesso das ajudas humanitárias.
No total, as pessoas afetadas pela “insegurança alimentar” são 124 milhões em 51 países. E a FAO sublinha: “Não devemos esperar nenhuma melhoria significativa na segurança alimentar global enquanto a paz não voltar”. Mas quem decide sobre as guerras, geralmente, está de barriga cheia.
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Escreve-se guerra, lê-se fome. Alerta da ONU sobre as crises: 124 milhões em risco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU