02 Março 2018
Nos casamentos mistos, o parceiro protestante também pode receber a comunhão, em casos individuais e em determinadas condições. Essa foi a decisão, com grande maioria e depois de um “intenso debate”, dos bispos alemães em sua assembleia de primavera, realizada em Ingolstadt, na Baviera, de 19 a 22 de fevereiro.
A reportagem é de Antonio Dall’Osto, publicada por Settimana News, 28-02-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O comunicado final diz: “Os bispos votaram uma ‘ajuda orientativa’ destinada a permitir que os parceiros evangélicos recebam esse Sacramento, em determinadas condições. O pressuposto é que os parceiros evangélicos, ‘após um maduro exame em um colóquio com o pároco ou outra pessoa encarregada pelo pastor de almas, cheguem, em consciência, a consentir com a fé da Igreja Católica, pondo fim, assim, a ‘uma grave situação espiritual e queiram satisfazer o desejo ardente de receber a eucaristia’”.
Quem explicou o significado dessa decisão foi Reinhard Marx, presidente da Conferência Episcopal Alemã e arcebispo de Munique, em uma coletiva de imprensa ao término dos trabalhos.
No fundo – esclareceu o cardeal – não se trata de uma inovação revolucionária. Nas diretrizes emitidas, a Conferência Episcopal enfatiza o que já está contido na legislação da Igreja, isto é, que, em casos individuais, os cônjuges protestantes poderão receber a comunhão, contanto que o parceiro evangélico “aceite a fé eucarística católica” e depois de um diálogo com o pároco católico.
A decisão foi tomada com grande maioria pelos bispos, mas não com a unanimidade. “Para alguns – afirmou o cardeal Marx – isso pode parecer pouco, para outros, demais.” “Zurückhaltend progressiv” (cautelosamente inovador) era o significativo título da notícia na página Katholisch.de, da Igreja alemã.
As novas diretivas são fruto de um compromisso. De fato, especificou o cardeal, tanto antes quanto depois, as opiniões entre os bispos eram muito diferentes. Na sua decisão, eles se referiram ao cânone 844 § 4 do Direito Canônico, onde se diz: “Se existir perigo de morte ou (...) urgir outra necessidade grave, os ministros católicos administram licitamente os mesmos sacramentos também aos outros cristãos que não estão em plena comunhão com a Igreja católica, que não possam recorrer a um ministro da sua comunidade e o peçam espontaneamente, contanto que manifestem a fé católica acerca dos mesmos sacramentos e estejam devidamente dispostos”.
Os bispos, no entanto, confiaram-se a uma tradução alternativa do texto latino do Código – sublinhou o cardeal Marx –, referindo-se àquilo que João Paulo II escreveu em sua encíclica Ecclesia de eucaristia, de 2003, onde ele fala, em vez de “necessidade grave”, de “séria necessidade espiritual”. E isso poderia ocorrer, dizem os bispos, nos casamentos mistos com parceiros não católicos.
Os bispos favoráveis à comunhão nesse caso específico também se referiram a uma afirmação do Papa Francisco em 2015, que, durante sua visita à comunidade luterana alemã de Roma, afirmara que, embora não havendo qualquer permissão geral para os protestantes para receberem a eucaristia, a decisão devia ser remetida à consciência pessoal do indivíduo. “Fale com o Senhor e siga em frente”, aconselhou o papa.
Mas esse problema, nas declarações do papa, não tivera ainda qualquer aplicação. O Papa Francisco, na carta apostólica sobre o matrimônio e a família Amoris laetitia, ocupou-se disso apenas em um parágrafo (n. 247), onde ele escreve: “Quanto à participação eucarística, recorda-se que ‘a decisão de admitir ou não a parte não católica do matrimônio à comunhão eucarística deve ser tomada de acordo com as normas gerais em vigor na matéria, tanto para os cristãos orientais como para os outros cristãos, e tendo em conta esta situação particular, isto é, que recebem o sacramento do matrimônio cristão dois cristãos batizados. Embora os esposos de um matrimônio misto tenham em comum os sacramentos do batismo e do matrimônio, a partilha da Eucaristia pode apenas ser excepcional e, em todo o caso, devem-se observar as disposições indicadas”.
O papa cita na carta o Diretório Ecumênico do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos, de 1993, que sublinha a complexidade do problema e em que, ao mesmo tempo, estão descritas as competências dos bispos e das Conferências Episcopais.
O cardeal Marx, na coletiva de imprensa, afirmou que a decisão tomada pelos bispos na assembleia de Ingolstadt, apesar de ter sido acolhida pela grande maioria, foi, no entanto, uma surpresa. De fato, após os debates dos últimos meses, não era previsível que se chegasse a uma decisão tão rápida, dadas as divergências existentes entre os bispos.
Basta pensar que, ainda em setembro de 2017, o cardeal arcebispo de Colônia, Rainer Maria Woelki, disse ser contrário a essa proposta. Em uma conversa com a revista Herder Korrespondenz, ele advertira contra a admissão à eucaristia de cristãos de outras confissões, enquanto não fossem esclarecidas, antes, as outras interrogações ecumênicas.
Com efeito - sublinhara – os protestantes têm posições diferentes dos católicos acerca da doutrina da Igreja e sobre Cristo. Portanto, não se pode falar de uma compreensão comum da ceia eucarística.
O arcebispo de Berlim, Heiner Koch, que também é presidente da Comissão para o Matrimônio e a Família da Conferência Episcopal Alemã, reconheceu, no ano passado, que é verdade que muitos casais de confissão mista sentem um “sofrimento existencial” , mas, ao mesmo tempo, lembrou, de acordo com o cardeal Woelki, há diferenças entre as confissões. Católicos e protestantes, na realidade, compreendem a eucaristia de maneira diferente, fato que – disse ele – não pode ser simplesmente ignorado. Além disso, ele advertia contra tomar uma decisão particular por parte da Igreja alemã, declarando-se, ao contrário, favorável a um debate em nível de Igreja universal.
Tais reservas, evidentemente, foram mantidas em mente na decisão dos bispos. Prova disso é também o fato de que o documento ainda não foi publicado e será objeto de algumas modificações. E também o fato de que os bispos deliberadamente, renunciam a formular uma decisão com efeitos jurídicos vinculantes.
O cardeal Marx lembrou que se trata apenas de “uma ajuda orientativa pastoral”, dirigida principalmente aos pastores de almas.
Quanto à necessidade de diálogo antes de receber a eucaristia, os bispos remetem a última decisão aos párocos. Isso significa, no caso individual, que a decisão não pertence mais diretamente aos bispos.
Marx, entretanto, admitiu de maneira realista: “Eu não sei se todos os párocos acolherão essas orientações”. E também explicou: “Não queremos fazer nenhuma mudança dogmática. O documento pretende apenas oferecer ao pastor de almas uma ajuda para esclarecer se, de acordo com o cânone 844 § 4 do Direito Canônico vigente, existe um caso excepcional pelo qual um não católico pode participar da comunhão”.
A “ajuda orientativa” havia sido preparada pelas comissões para os problemas da fé e do ecumenismo. De acordo com o cardeal Marx, não será necessária uma aprovação por parte de Roma, porque se trata simplesmente de uma diretriz pastoral.
A Igreja Evangélica Alemã (EKD) definiu a decisão dos bispos alemães como “um passo importante no caminho do ecumenismo”. O presidente do Conselho da EKD, Heirich Bedford-Strohm, afirmou: “Para as pessoas que não só compartilham sua fé em Jesus Cristo, mas também sua vida cotidiana, trata-se de um verdadeiro conforto”.
E o bispo regional de Munique enfatizou que “a decisão orientativa atual – embora com todos os pontos ainda a serem esclarecidos – é um encorajamento para muitos milhões de cristãos que vivem sua vida ecumenicamente uns ao lado dos outros”.
O documento aprovado deve ser publicado em algumas semanas.
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Alemanha: comunhão também aos cônjuges protestantes - Instituto Humanitas Unisinos - IHU