13 Novembro 2017
A liberação pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) do agrotóxico benzoato de emamectina, nesta quarta-feira (8), é mais uma das “doses homeopáticas” com que o governo de Michel Temer (PMDB) vem introduzindo o chamado “Pacote do Veneno“. A opinião é da dirigente nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e da coordenação da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida Nívia Regina Silva.
“Houve grande pressão sobre a Anvisa para liberar esse agrotóxico, que a própria agência havia recusado registro em 2010, por considerá-lo tóxico em relação a outros disponíveis”, diz. “E agora, em 20 dias, com apenas oito contribuições em consulta pública pouco divulgada, liberam o produto?”, questiona.
A reportagem é de Cida de Oliveira, publicada por Rede Brasil Atual – RBA, 12-11-2017.
O chamado “Pacote do Veneno” contém diversos projetos apensados, alguns já aprovados no Senado. Entre os principais, o PL 6.299/2002, apresentado pelo atual ministro da Agricultura Blairo Maggi (PP-MT) quando era senador. O projeto altera regras para a pesquisa, experimentação, produção, embalagem e rotulagem, transporte, armazenamento, comercialização, propaganda, utilização, importação, exportação, destino final dos resíduos e embalagens, registro, classificação, controle, inspeção e fiscalização. Se for aprovado, a embalagem dos agroquímicos deixará de ter, por exemplo, a presença da caveira – símbolo de veneno conhecido universalmente.
Outro é o Projeto de Lei (PL) 3.200/2015, do deputado federal Luis Antonio Franciscatto Covatti (PP-RS), que praticamente revoga a atual lei de agrotóxicos ao vetar o termo “agrotóxico”, substituindo por “fitossanitário”, além de criar a Comissão Técnica Nacional de Fitossanitários (CTNFito) no âmbito do Mapa. Na prática, deixa a Anvisa e o Ibama de fora do processo de avaliação de novos registros de venenos agrícolas.
Na avaliação de Nivia, o pacote, de interesse dos ruralistas, só não foi votado ainda porque há no Congresso outras pautas consideradas mais urgentes. “Então eles vão fazendo mudanças aos poucos”.
Como lembra a dirigente do MST, a rejeição do pedido pela agência, há sete anos, foi justificada pelos efeitos nocivos da substância já conhecidos e também pelas evidências ainda pouco estudadas.
Em 2013, porém, o produto obteve aprovação temporária para ser usado emergencialmente para conter uma praga, a lagarta Helicoverpa armígera, que infestou as lavouras na Bahia, ocasião em que o fabricante Syngenta protocolou novo pedido de registro.
De acordo com a Anvisa, o agrotóxico está na lista de produtos prioritários para análise criada por meio do Ato nº 01, de janeiro de 2016, assinada pelo Ministério da Agricultura. E que “novas evidências sobre a neurotoxicidade, que afastaram os riscos antes identificados pela Anvisa em 2010, quando o produto foi indeferido” sustentam a liberação.
A reportagem solicitou à agência os estudos que embasaram a liberação. No entanto, ainda não estão disponíveis, segundo a assessoria de imprensa do órgão vinculado ao Ministério da Saúde.
A liberação deverá ser questionada pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelo Fórum Nacional de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos.
A Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida divulgou nota em que lamenta a liberação do produto. Confira:
Anvisa apunhala sociedade e aprova agrotóxico perigoso na surdina
Sem alarde, o diário oficial publicou nesta segunda-feira (6/11) a aprovação de um agrotóxico extremamente tóxico para a saúde humana: o Benzoato de Emamectina. São vários os motivos da nossa indignação com esta decisão:
Em 2010, a Anvisa já havia negado o registro desta substância por suspeita de malformações e elevada neurotoxicidade, ou seja, causa danos elevados ao sistema nervoso. Será que nosso corpo evoluiu, e ficamos resistentes a este veneno?
Ao contrário de outras consultas públicas, desta vez não houve divulgação por parte da Anvisa ao atores interessados. Prova disso é o número de contribuições recebidas: 8. Para termos uma ideia, na consulta referente ao Carbofurano, foram 13.114 contribuições. Qual a explicação para tal discrepância, senão a falta de publicidade dada pela agência? Enquanto a consulta do Carbofurano durou 60 dias, a do Benzoato de Emamectina durou apenas 30 dias. Qual motivo da distinção?
A decisão pela aprovação do Benzoato foi dada em tempo recorde. No caso do Carbofurano, a consulta pública findou-se no dia 25 de fevereiro de 2016, e a decisão da Anvisa foi proferida há poucas semanas, no dia 18 de outubro de 2017 – 20 meses depois.
Agora, no caso do Benzoato, transcorreram-se apenas 21 dias entre 15 de outubro, quando a consulta pública terminou, e o dia 6 de novembro. Para banir o Paraquate, foram necessários 10 anos, e faltam ainda 3 anos para o seu banimento completo. Porque tamanha demora para proibir, e tamanha celeridade para aprovar?
O Benzoato de Emamectina foi centro de outra disputa em 2013. Após um surto da lagarta Helicoverpa, causado pelo uso do milho transgênico que exterminou seu predador natural, o Ministério da Agricultura importou o agrotóxico de forma emergencial, e na época sem autorização da Anvisa.
Mesmo que a substância seja aprovada para uso em outros países, somos (ou deveríamos ser) um pais soberano, livre e independente dos interesses das grandes corporações. A autorização em outros países não significa que o produto seja seguro aqui, onde grandes volumes são utilizados, onde o uso de EPI ė impensável dadas as condições climáticas, onde o congresso nacional defende os interesses dos setores ruralistas, onde os órgãos de fiscalização dos estados estão sucateados, onde o SUS esta sendo desmontado e subfinanciado e tem dificuldades em atender à demanda de doenças causadas pelos agrotóxicos. Pelos mesmos motivos, o banimento em outros países deveria ser motivo de banimento imediato no Brasil.
É inadmissível expor a sociedade a estes riscos, sem nenhuma possibilidade de participação ou interferência dos maiores afetados: nós. Pelo contrário, a Anvisa que vem promovendo “DRs” com a indústria, se mostra incapaz de dialogar com o povo.
Exigimos que a Anvisa apresente os estudos que embasaram esta súbita mudança de opinião, e que cancele o registro do Benzoato de Emamectina até que a sociedade seja ouvida e consultada se deseja correr este risco. Terminamos com um trecho do Parecer Pelo Indeferimento do Benzoato de Emamectina, publicado pela própria Anvisa em 2010 (e que subitamente sumiu do site da Anvisa):
Os efeitos neurotóxicos são tão marcantes e severos que as respostas de curto e longo prazo se confundem, isto é, efeitos tipicamente agudos são observados nos ensaios de longo prazo, e vice-versa. O produto revelou neurotoxicidade para todas as espécies e em doses tão baixas quanto, por exemplo, 0,1 mg/kg em camundongos e 0,5mg/kg em cães, mesmo em estudos onde este efeito não estava sendo investigado.
Incertezas no que diz respeito aos possíveis efeitos teratogênicos, e certezas dos efeitos deletérios demonstrados nos estudos com animais corroboram de forma decisiva para que não se exponha a população a este produto, seja nas lavouras, ou pelo consumo de alimentos.
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‘Pacote do veneno’ em doses homeopáticas: Anvisa libera agrotóxico perigoso - Instituto Humanitas Unisinos - IHU