23 Outubro 2017
Depois de pouco mais de um ano desde o esclarecimento de julho de 2016, com o qual o Papa Francisco, através de uma nota do então diretor da Sala de Imprensa vaticana, padre Federico Lombardi, deixava claro que não estavam em vista as mudanças sobre a orientação dos altares preanunciadas pelo cardeal Robert Sarah, o prefeito da Congregação para o Culto Divino recebeu uma nova “correção” por parte do pontífice. Desta vez, com um documento com a assinatura papal.
A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada por Vatican Insider, 22-10-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O objetivo do esclarecimento é o recente motu proprio Magnum principium sobre as traduções litúrgicas, divulgado em setembro passado, com o qual Francisco modificou a normativa canônica relativa à tradução nas várias línguas.
Referindo-se ao Concílio Vaticano II, o papa estabeleceu que a tradução, aprovada pelas Conferências Episcopais nacionais, não deve mais ser submetida a uma revisão por parte da Sé Apostólica (recognitio), mas à sua confirmação (confirmatio), que não se configura mais como uma intervenção alternativa de tradução, mas como um ato com o qual o dicastério litúrgico ratifica a aprovação dos bispos.
Em 12 de outubro passado, alguns sites publicaram um comentário restritivo à decisão papal que o cardeal Sarah tinha assumido e enviado a Francisco. A iniciativa pessoal do prefeito – não se tratava, de fato, de um texto do dicastério –, mais do que como uma contribuição posta sob a atenção do papa, era apresentada por aqueles que a relançaram como uma observação pública para reduzir o porte da decisão pontifícia.
Basicamente, o comentário interpretativo enviado por Sarah, considerando ainda em vigor, em tudo e para tudo, as normas contidas na instrução Liturgiam authenticam (2001), apresentava o recente documento papal afirmando que ele “não modifica, de modo algum, a responsabilidade da Santa Sé, nem, consequentemente, as suas competências em matéria de traduções litúrgicas”, colocando no mesmo plano recognitio e confirmatio.
O papa, em vista da imediata divulgação do texto que lhe havia sido enviado pelo cardeal, considerou oportuno não só responder sobre a questão, mas também pediu que Sarah tornasse imediatamente pública na internet e para todas as Conferências Episcopais essa resposta de autoridade.
Uma resposta que confirma o que está escrito no motu proprio, rejeitando a interpretação restritiva e explicando que, com esse novo documento, é revogada a práxis anterior.
“Acima de tudo, é preciso evidenciar – escreve Francisco na carta de resposta divulgada pela Sala de Imprensa vaticana – a importância da clara diferença que o novo motu proprio estabelece entre recognitio e confirmatio, bem sancionada nos §§ 2 e 3 do cânone 838, para revogar a práxis, adotada pelo Dicastério seguindo a Liturgiam authenticam e que o novo motu proprio quis modificar. Não se pode dizer, portanto, que recognitio e confirmatio são ‘estritamente sinônimos (ou) são intercambiáveis’ ou ‘são intercambiáveis em nível de responsabilidade da Santa Sé’. Na realidade, o novo cânone 838, através da distinção entre recognitio e confirmatio, assevera a responsabilidade diferente da Sé Apostólica no exercício dessas duas ações, além da responsabilidade das Conferências Episcopais. O Magnum principium não sustenta mais que as traduções devem ser conformes em todos os pontos às normas da Liturgiam authenticam, assim como era realizado no passado”.
Por isso, continua o pontífice, os números individuais da Liturgiam authenticam “devem ser atentamente compreendidos de novo, incluindo os nn. 79-84, a fim de distinguir o que é pedido pelo código para a tradução e o que é exigido para as legítimas adaptações. Portanto, fica claro que alguns números da Liturgiam authenticam foram revogados ou decaíram nos termos em que foram reformulados pelo novo cânone”.
Quanto à responsabilidade das Conferências Episcopais de “traduzir ‘fideliter’, é preciso especificar que o julgamento sobre a fidelidade ao latim e as eventuais correções necessárias era tarefa do Dicastério, enquanto, agora, a norma concede às Conferências Episcopais a faculdade de julgar a bondade e a coerência de um e outro termo nas traduções do original, embora em diálogo com a Santa Sé. A confirmatio, portanto, não mais pressupõe um exame detalhado palavra por palavra, exceto nos casos evidentes que podem ser apresentados aos bispos para uma ulterior reflexão deles. Isso vale, em particular, para as fórmulas relevantes, como para as Orações Eucarísticas e, em particular, para as fórmulas sacramentais aprovadas pelo Santo Padre. A confirmatio também leva em consideração a integridade do livro, ou seja, verifica que todas as partes que compõem a edição típica tenham sido traduzidas”.
Francisco também explica que o processo de tradução dos textos litúrgicos relevantes (por exemplo, fórmulas sacramentais, o Credo, o Pater Noster) em uma língua, da qual são consideradas traduções autênticas, “não deveria levar a um espírito de ‘imposição’ às Conferências Episcopais de uma dada tradução feita pelo Dicastério, pois isso lesaria o direito dos bispos sancionado no cânone” e, já antes, pela constituição conciliar Sacrosanctum concilium no número 36.
Portanto, é “inexato” atribuir à confirmatio a finalidade da recognitio. Certamente, conclui Francisco, a confirmatio “não é um ato meramente formal, mas necessário para a edição do livro litúrgico ‘traduzido’: ela é concedida depois que a versão foi submetida à Sé Apostólica para a ratificação da aprovação dos bispos, em espírito de diálogo e de ajuda a refletir se e quando necessário, respeitando os seus direitos e deveres, considerando a legalidade do processo seguido e as suas modalidades”.
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Papa ''corrige'' interpretação do cardeal Sarah - Instituto Humanitas Unisinos - IHU