O comentário é de José Antonio Pagola, teólogo espanhol, comentando o Evangelho da 3ª Semana do Advento – C (Lucas 3, 10-18), publicado por Religión Digital, 09-12-2024.
Apesar de todas as informações oferecidas pela mídia, é difícil para nós perceber que vivemos em uma espécie de "ilha de abundância", no meio de um mundo em que mais de 1/3 da humanidade vive na miséria. No entanto, basta voar algumas horas em qualquer direção para encontrar fome e destruição.
Esta situação tem apenas um nome: injustiça. E só admite uma explicação: inconsciência. Como podemos nos sentir humanos quando a poucos quilômetros de nós – o que é, em suma, seis mil quilômetros? – há seres humanos que não têm casa nem terra para morar; homens e mulheres que passam o dia procurando algo para comer; crianças que não serão mais capazes de superar a desnutrição?
Nossa primeira reação é quase sempre a mesma: "Mas o que podemos fazer diante de tanta miséria?" Enquanto nos fazemos perguntas desse tipo, nos sentimos mais ou menos calmos. E as justificativas usuais vêm: não é fácil estabelecer uma ordem internacional mais justa; a autonomia de cada país deve ser respeitada; é difícil garantir canais eficazes de distribuição de alimentos; ainda mais para mobilizar um país para sair da miséria.
Mas tudo isto desmorona-se quando ouvimos uma resposta direta, clara e prática, como a recebida do Baptista que lhe pergunta o que devem fazer para "preparar o caminho para o Senhor". O profeta do deserto responde-lhes com brilhante simplicidade: "Quem tem duas túnicas, dê uma a quem não tem; e aquele que tem o suficiente para comer deve fazer o mesmo".
É aqui que todas as nossas teorias e justificativas terminam. O que podemos fazer? Simplesmente não acumule mais do que precisamos enquanto houver cidades que precisam disso para viver. Não continuar a desenvolver nosso bem-estar sem limites, esquecendo quem morre de fome. O verdadeiro progresso não consiste na obtenção de um bem-estar material cada vez maior por parte de uma minoria, mas por toda a humanidade que vive com mais dignidade e menos sofrimento.
Há alguns anos, visitei Butare, em Ruanda, durante o Natal, dando um curso de cristologia para missionários espanhóis. Certa manhã, chegou uma freira de Navarra dizendo que, ao sair de casa, havia encontrado uma criança morrendo de fome. Eles puderam verificar que ela não tinha nenhuma doença grave, apenas desnutrição. Ela era um dos muitos órfãos ruandeses que lutam todos os dias para sobreviver. Lembro que só pensei em uma coisa. Nunca esquecerei: podemos nós, cristãos do Ocidente, acolher o menino de Belém enquanto fechamos o coração a estes filhos do Terceiro Mundo?