05 Julho 2016
Um especialista em leis se levantou, e, para tentar Jesus perguntou: «Mestre, o que devo fazer para receber em herança a vida eterna?» Jesus lhe disse: «O que é que está escrito na Lei? Como você lê?». Ele então respondeu: «Ame o Senhor, seu Deus, com todo o seu coração, com toda a sua alma, com toda a sua força e com toda a sua mente; e ao seu próximo como a si mesmo». Jesus lhe disse: «Você respondeu certo. Faça isso, e viverá!».
Mas o especialista em leis, querendo se justificar, disse a Jesus: «E quem é o meu próximo?». Jesus respondeu: «Um homem ia descendo de Jerusalém para Jericó, e caiu nas mãos de assaltantes, que lhe arrancaram tudo, e o espancaram. Depois foram embora, e o deixaram quase morto. Por acaso um sacerdote estava descendo por aquele caminho; quando viu o homem, passou adiante, pelo outro lado. O mesmo aconteceu com um levita: chegou ao lugar, viu, e passou adiante, pelo outro lado. Mas um samaritano, que estava viajando, chegou perto dele, viu, e teve compaixão. Aproximou-se dele e fez curativos, derramando óleo e vinho nas feridas. Depois colocou o homem em seu próprio animal, e o levou a uma pensão, onde cuidou dele. No dia seguinte, pegou duas moedas de prata, e as entregou ao dono da pensão, recomendando: "Tome conta dele. Quando eu voltar, vou pagar o que ele tiver gasto a mais’.» E Jesus perguntou: «Na sua opinião, qual dos três foi o próximo do homem que caiu nas mãos dos assaltantes?» O especialista em leis respondeu: «Aquele que praticou misericórdia para com ele». Então Jesus lhe disse: «Vá, e faça a mesma coisa».
(Correspondente ao 15º Domingo do Tempo Comum, ciclo C do Ano Litúrgico).
O texto evangélico que hoje nos é apresentado é uma parábola que ecoa permanentemente no nosso interior. Apresenta um permanente desafio para nossa vida diária.
Está enquadrada num diálogo que mantém Jesus com um especialista em Lei, que, segundo Lucas, tem como intenção tentar Jesus, mas Ele aproveita esta situação para expor o que é central da sua proposta de vida.
A atitude de Jesus, suas perguntas e respostas o revelam como um verdadeiro pedagogo. Longe de entrar numa discussão, que não levaria a nada, com o mestre da lei, conduz seu interlocutor para o coração da Lei mosaica: "Amar ao Senhor, seu Deus, com todo o seu coração, com toda a sua alma, com toda a sua força e com toda a sua mente; e ao seu próximo como a si mesmo", à novidade do amor cristão.
A chave está na resposta à segunda pergunta do mestre da lei: "quem é meu próximo?".
Como escreveu Gilvander Luis Moreira: “Amar a Deus” é uma das constantes características de todo o corpo deuteronomístico e está intimamente interligado com “amar o próximo”.
Como o levita, cada um e cada uma podemos fazer a mesma pergunta que ele fez a Jesus: quem é meu próximo?
E Jesus não responde com uma frase, mas com uma parábola que hoje se nos oferece como o texto lido nas diferentes liturgias que são celebradas.
Desde nossa situação social, política, cultural, religiosa tentemos ler detidamente esta narrativa e escutar a mensagem que Jesus nos oferece.
Um homem descia de Jerusalém a Jericó e é assaltado a ponto de ficar quase morto. Quantas pessoas podemos colocar nessa situação hoje em dia, que sofrem diferentes violências!
É uma pessoa que não aparece sem nome. Temos a ousadia de dar nome a esse "homem"?
Enquanto ele está caído à beira do caminho, várias pessoas passam a seu lado, e o impressionante é que o texto deixa claro que o veem!! Mas continuam seu caminho sem fazer nada por ele. Há uma cegueira de coração.
E quão comum é em nossos dias esse tipo de cegueira, a qual podemos chamar de indiferença, individualismo, "cada um na sua"..., os nomes podem variar, mas a consequência é a mesma: solidão, abandono, morte.
Aparece então no mesmo caminho o samaritano, que, para os judeus, é considerado um pagão. Como os outros, vê o homem à beira do caminho, mas a grande diferença é que ele, movido pela compaixão, se aproxima e cuida dele ternamente.
Outros textos do Novo Testamento nos mostram que o sentimento de compaixão, a atitude de aproximar-se correspondem a características do próprio Deus. Lembremos da parábola do filho Pródigo (Lc 15,20), ou a de Jesus com a viúva de Naím (Lc 7,13). Podemos relacionar o bom samaritano com Jesus.
Já os padres da Igreja fizeram esta identificação. Por exemplo, Clemente de Alexandria se perguntava: "Quem é o bom samaritano, senão o Salvador? Quem há tido mais compaixão de nós que ele?".
Quem senão Deus teve compaixão de nossa situação a ponto de se aproximar, fazendo-se um de nós e descendo até as profundidades do sofrimento e limite humano para desde ali curá-lo e libertá-lo. Como disse Pagola quando comenta esse texto, "o sofrimento deve ser levado a sério".
Dessa maneira o bom samaritano é aquele que "atua" como Deus, seguindo o exemplo de Jesus de Nazaré, aquele que sente o sofrimento dos homens aos quais se faz próximo para aliviar a dor, curá-los, defendê-los, dar-lhes vida.
As pessoas estão ao nosso redor, depende de nossa atitude que elas se convertam em nossos próximos! Ser como o samaritano é agir movido pela compaixão e aproximar-nos delas e praticarmos a misericórdia.
Lembremos as palavras do Papa Francisco no encontro no Vaticano com os 8 mil estudantes das escolas dos jesuítas: "Em um mundo em que temos tantas riquezas e recursos para dar de comer a todos, não se pode entender como há tantas crianças famintas, sem educação, tantos pobres... A pobreza, hoje, é um grito, todos devemos pensar se podemos nos tornar um pouco mais pobres". Ele por primeiro se pergunta: "Como posso me tornar um pouco pobre para me assemelhar a Jesus, mestre pobre?" (Cf. notícia do dia 10/06/2013).
Como escreve Frei Gilvander Luis Moreira "Não existe um amor integral a Deus se falta amor ao próximo a partir do outro mais injustiçado. O caminho que leva a Deus passa necessariamente pelo próximo. Dedicar-se a Deus e ao próximo são duas faces da mesma medalha e é significativo que Dt 6,5 e Lv 19,18 estejam em Lc 10,27 como uma “leitura” da lei que revela a íntima ligação entre amar a Deus e amar o próximo: “O que está escrito na lei? Como tu lês?” (Lc 10,26)". (Leia o comentário completo aqui)
E Lucas termina o relato com um "imperativo" de Jesus a todos/as nós: "Vá, e faça a mesma coisa". Ou seja, vá e torna-te imitador de Deus, próximo de todos/as os/as necessitados/as, porque só é possível encontrar a vida, defendendo-a, cuidando-a naqueles na qual está ameaçada. Terás já a vida eterna, porque, desde já, estarás vivendo a vida de Deus mesmo.
Senhor! Fazei de mim um instrumento da vossa paz.
Onde houver ódio, que eu leve o amor.
Onde houver ofensa, que eu leve o perdão.
Onde houver discórdia, que eu leve a união.
Onde houver dúvidas, que eu leve a fé.
Onde houver erro, que eu leve a verdade.
Onde houver desespero, que eu leve a esperança.
Onde houver tristeza, que eu leve a alegria.
Onde houver trevas, que eu leve a luz.
Ó Mestre, fazei que eu procure mais:
consolar, que ser consolado;
compreender, que ser compreendido;
amar, que ser amado.
Pois é dando que se recebe.
É perdoando que se é perdoado.
E é morrendo que se vive para a vida eterna.
Referências
KONINGS, Johan. Espírito e mensagem da liturgia dominical. Porto Alegre: Escola Superior de Teologia São Lourenço de Brindis, 1981.
MONLOUBOU, Louis. Leer y predicar el evangelio de Lucas. Santander: Sal Terrae, 1982.
SOBRINO, Jon. O Princípio Misericórdia. Petrópolis: Vozes, 1994.
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Evangelho de Lucas 10, 25-37 - Instituto Humanitas Unisinos - IHU