05 Setembro 2017
"Mas se dermos ao discernimento um significado mais íntimo, se o consideramos como uma modalidade mais consciente e atenta do viver a vida cristã, então as mulheres sempre o exerceram integralmente. Se, como escreve Bianchi, o discernimento é um dom do Espírito a todas as criaturas e para acolhê-lo é suficiente "exercitar-se a ver, escutar e pensar", como seria possível excluir as mulheres?", escreve Lucetta Scaraffia, historiadora italiana, membro do Comitê Italiano de Bioética e professora da Universidade de Roma "La Sapienza", em artigo publicado por L'Osservatore Romano, 01-09-2017. A tradução é de Luisa Rabolini.
O discernimento é um conceito amplamente utilizado na tradição cristã desde os tempos mais antigos. Refere-se à reflexão interior que cada ser humano é chamado a fazer, a fim de entender qual seria a vontade de Deus nos importantes momentos de escolha de sua vida. Isso significa fazer as escolhas junto com Deus.
Como escreve Enzo Bianchi em seu livro "o discernimento é um dom do Espírito de Deus que se une com o nosso espírito, e como tal deve ser desejado e invocado pelo cristão", um dom que devemos acolher e desenvolver usando todas as nossas capacidades humanas. Esse processo exige uma condição subjacente, a liberdade de consciência, que é - explica Nathalie Sartou-Lajus - a possibilidade que aconteça "o retorno inquieto de consciência sobre si mesma", uma consciência capaz de julgar as próprias ações e suportar o fardo de remorso pelo dano feito.
Perguntamo-nos se as mulheres, ao longo da história, tenham tido a oportunidade de exercer o discernimento, isto é, se foram livres para operar uma escolha de acordo com a própria consciência. A história de Mary Ward, no século XVII, que queria aplicar a prática inaciana do discernimento em uma ordem religiosa feminina, permite compreender como isso foi difícil. Para as mulheres, a vida sempre parecia já ter sido traçada por outros, e as escolhas, em grande parte, "obrigadas" pelas decisões dos homens aos quais estavam sujeitas.
Mas se dermos ao discernimento um significado mais íntimo, se o consideramos como uma modalidade mais consciente e atenta do viver a vida cristã, então as mulheres sempre o exerceram integralmente. Se, como escreve Bianchi, o discernimento é um dom do Espírito a todas as criaturas e para acolhê-lo é suficiente "exercitar-se a ver, escutar e pensar", como seria possível excluir as mulheres?
Reconhecer a elas essa capacidade significa abrir-se à descoberta da espiritualidade feminina, que é uma prática de discernimento mais ligada à escuta das vicissitudes da vida, das pequenas coisas. Significa abrir espaço para uma maneira de praticar o discernimento diferente, mas igualmente rica, daquela masculina. Significa sair da autorreferencialidade que tantas vezes o Papa Francisco recrimina na linguagem eclesiástica para descobrir outras fontes de inteligência espiritual.
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As mulheres e o discernimento - Instituto Humanitas Unisinos - IHU