22 Agosto 2017
O dia 15 de agosto de 2017 será lembrado como a data em que Donald Trump liberou oficialmente a alt-right. Nenhum presidente republicano jamais havia ousado tanto. A poucos dias dos violentos confrontos em Charlottesville, onde um militante de extrema direita havia matado uma jovem mulher, Trump disse: “Havia pessoas de bem na manifestação”. A absolvição presidencial aos cortejos onde tremulavam símbolos da Ku Klux Klan (KKK) e de Adolf Hitler é inédita, mas não surpreendente. É o ápice de um idílio que desabrochou na longa escalada de Trump à Casa Branca.
A reportagem é de Federico Rampini, publicada por La Repubblica, 21-08-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O estudioso Richard Fording, que está escrevendo um livro sobre esse tema, lembra que, “durante toda a campanha eleitoral, ele estava atento para não os perder, constantemente os citava”. As provas gerais para a candidatura de Trump remontam a 2012, quando ele se aproveitou da mentira sobre Barack Obama que nasceu no Quênia, sendo, portanto, um estrangeiro, inelegível, usurpador. Conquistou o consenso da extrema-direita racista. Que nunca o traiu.
Mas o que se esconde por trás da sigla alt-right, quais são os componentes dessa galáxia?
Nem todos aceitam esse termo. Quem o lançou foi uma celebridade da extrema direita, Richard Spencer, em 2008: o ano da eleição de Barack Obama.
Spencer, hoje muito requisitado pelos comitês de estudantes de extrema direita para palestras nos campi universitários (muitas vezes, canceladas por motivos de ordem pública), cunhou o termo para incluir nele toda a direita radical que se desvinculava do conservadorismo moderado demais de George W. Bush.
Muitos, à esquerda, denunciaram esse termo como uma hipocrisia, um rótulo asséptico para esconder a substância racista, pessoas com vínculos com milícias armadas, neofascistas, supremacistas brancos.
Outro especialista, George Hawley, que está prestes a publicar o livro Making Sense of the Alt-Right, adverte contra as simplificações: “Equivoca-se quem acredita que a alt-right é uma organização, um grupo com uma estrutura e uma liderança”. Ele a descreve como “uma multidão anônima que se comunica via internet e tem em comum uma agenda política racista”. Ele enfatiza a forte atração em relação aos jovens, aos millenials e até mesmo aos estudantes do Ensino Médio.
Dia 29 de março de 2016, em plena batalha pela nomeação republicana, o sítio Breitbart News, de Stephen Bannon (o ex-conselheiro da Casa Branca demitido na última sexta-feira), publicou An Establishment’s Conservative Guide to the Alt-Right. Era assinado por Milo Yannopoulos, outra estrela pop do movimento, e Allum Bokhari.
O título é irônico, os dois autores fingem querer explicar à classe política republicana o que é a alt-right. Começa como o Manifesto de Karl Marx: “Um fantasma ronda...”. Neste caso, o fantasma é a extrema direita, que paira ameaçadora sobre os “jantares para coletar fundos e sobre os think tanks do establishment”.
Os notáveis da direita “temem-no mais do que a esquerda”. Porque a alt-right é “jovem, criativa, herética”. É clara a ligação com a campanha de Donald Trump, totalmente anti-establishment, com temas como protecionismo e isolacionismo, distantes da tradição republicana. Mais o racismo explícito.
Foi a esse Manifesto que conectou, idealmente, 17 meses depois, a manifestação Unite the Right, convocada em Charlottesville. Ela foi organizada por Jason Kessler, membro dos Proud Boys, “ativista pró-brancos e pró-Trump”. Ele protestava contra a remoção da estátua de Robert Lee, general dos confederados que lutavam para preservar a escravidão na guerra civil de 1861-65. Entre os oradores de Charlottesville, apareceu Richard Spencer.
O banco de dados mais confiável sobre a extrema direita é do Southern Poverty Law Center, uma organização pela defesa dos direitos civis. Ela lista mais de 1.600 grupos extremistas. Catalogou como alt-right “aqueles que acreditam que a identidade branca está sob ataque por parte de forças multiculturais que usam o politicamente correto e a justiça social para minar a nossa civilização”.
Estas são as siglas mais importantes: o Movimento Socialista Nacional é o herdeiro do partido nazista estadunidense, refundado depois da guerra, em 1959. O chefe atual é Jeff Schoep, 43 anos, animador também do Nationalist Front, que visa a coalizar outras siglas da alt-right.
O Ku Klux Klan é a sigla mais antiga: nasceu depois da derrota sulista na Guerra Civil, na época da Reconstrução, para sabotar violentamente os direitos dos negros: praticou massacres, linchamentos (também contra outras minorias, incluindo os italianos). A sua última ressurreição remonta aos anos 1960, para combater Martin Luther King e as leis sobre os direitos civis de Kennedy-Johnson. Um dos líderes recentes, David Duke, apoiou a campanha eleitoral de Trump. O atual líder dos Cavaleiros do KKK é o pastor cristão do Arkansas, Thomas Robb.
Depois, estão os White Nationalists, dos quais Spencer é o líder. Os Neoconfederados, que teorizam uma nova secessão do Sul. As milícias patrióticas protagonistas da ocupação de terras federais em Oregon, há um ano. Os Proud Boys, nascidos em 2016, para trabalhar na vitória de Trump. Soma-se a eles a direita religiosa – embora distinta da alt-right – com o pregador Jerry Falwell Jr, que defende as palavras de Trump depois de Charlottesville.
A revista Time reproduziu uma foto de dar arrepios: 20 mil nazistas no Madison Square Garden de Nova York. O ano é 1934, na reunião dos Amigos da Nova Alemanha. O ano 1934 foi quando o romancista Sinclair Lewis imaginou que os Estados Unidos elegeriam um fascista para a Casa Branca.
Há um ano, quando a vitória de Donald Trump ainda era improvável, o intelectual conservador Robert Kagan lançou o alerta ao Washington Post: “É assim que o fascismo chega aos Estados Unidos”.
Agora, o presidente Donald Trump parece arrependido e aceitou afastar Stephen Bannon. Mas o encorajou a continuar a sua batalha de fora, usando o Breitbart News. E, na Casa Branca, continua como conselheiro outro expoente da alt-right, o jovem Stephen Miller. O autor da lei antimuçulmanos. Entre os seus mentores, há um certo Richard Spencer.
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Racista e pró-Trump: a galáxia “alt-right” sem líder - Instituto Humanitas Unisinos - IHU