Por: Jonas | 15 Setembro 2015
O catedrático italiano, consultor econômico do Vaticano e doutor Honoris Causa na Universidade Católica de Córdoba, Stefano Zamagni (foto), estuda o fenômeno da subcontratação das empresas multinacionais que, disse, sustenta o trabalho forçado. No último seminário da Academia Pontifícia de Ciências Sociais, Zamagni propôs a criação de uma autoridade mundial para combater a exploração e o tráfico de pessoas, que são consideradas atividades criminosas.
Fonte: geopoliting.com |
“Em 1944, em Bretton Woods, perto de Washington – explica -, foi organizada a primeira grande cúpula mundial que definiu a organização mundial do comércio para regulamentar os fluxos de importações e exportações. Hoje, há duas agências mundiais para o comércio e a atividade bancária. Por que criar uma “World Trade Organization” para enfrentar a exploração e o tráfico de pessoas? Alguém pode dizer que é difícil, mas é uma necessidade urgente.
A entrevista é de Marcelo Larraquy, publicada por Clarín, 13-09-2015. A tradução é do Cepat.
Eis a entrevista.
Que organizações internacionais protegem, hoje, as vítimas do trabalho escravo?
No momento, há duas organizações de proteção aos refugiados com sede em Genebra e o escritório das Nações Unidas contra a Droga e o Crime, com sede em Viena. Porém, em suas intervenções não possuem o poder de execução. E as diretrizes estabelecidas pela ONU para evitar o trabalho escravo e defender os direitos humanos têm um fundamento econômico, não moral. As empresas com sanções econômicas podem continuar violando os direitos humanos.
Como se conformaria a agência anti-tráfico e que função teria?
Deve partir da ONU e dos países do G20. Se eles estão (presentes), depois os outros se somam. A ONU é que deveria organizá-la. É indispensável para monitorar o fenômeno do tráfico de pessoas e elaborar tratados que sejam cumpridos.
Em quais aspectos considera mais urgente a intervenção?
A cadeia de ofertas das multinacionais. Hoje, o fenômeno dominante são as multinacionais que utilizam o trabalho forçado. Pagam muito pouco e colocam o produto em suas subsidiárias na Índia e Argentina. É uma consequência do fenômeno da externalização da produção, que se iniciou nos anos 1980 com a Nike, Levi Strauss, Apple e continuou com um crescimento exponencial do lucro. A partir disto, começou a decrescer a responsabilidade das multinacionais pelos direitos humanos.
Dê-me um exemplo.
Suponhamos que uma empresa da Califórnia vende um aquecedor que é fabricado na China, que tem um custo de produção mais baixo. A lei chinesa não protege os direitos humanos fundamentais como a lei americana, e não se pode obrigar uma pessoa a trabalhar quatorze horas na China e oito na Califórnia para fabricar um produto que é vendido no mundo inteiro. Isto deve ser avaliado como uma violação dos direitos humanos, pois as pessoas são iguais em todos os lugares.
Então, você conclui que com este esquema de produção, as multinacionais promovem a exploração e o tráfico de pessoas.
Não o promovem, sustentam-no. Eles não o fazem, mas se beneficiam. As multinacionais sustentam o trabalho forçado, obtêm os serviços de trabalho a um custo mais baixo. Na Itália, em setembro, acontece a colheita do tomate. Quem faz a colheita? Os africanos. E como chegaram? Tráfico humano. O mesmo vale para trabalhadores chineses em Prato, na Toscana: trabalham em condições de escravidão com os tecidos.
Por que a partir das ciências econômicas não são realizados estudos sobre o tráfico de pessoas?
Porque o subestimam. Há uma enorme quantidade de estudos sobre crime organizado, máfias, drogas, mas não sobre o tráfico de pessoas e os mercados ilegais. Se quisermos ser sérios do ponto de vista econômico e enfrentar o desafio, temos que falar do papel das multinacionais e da violação aos direitos humanos.
O Papa alerta sobre a nova escravidão. Quem são?
Hoje a nova escravidão é o excesso de pessoas que não são incluídas no mercado. Está tendo um efeito devastador. Por exemplo, o imigrante paga mil dólares para entrar na Itália. Não é um pobre extremo. As pessoas gastam dinheiro, fazem viagens longuíssimas e depois morrem no mar, ou, se chegam, são tomadas por organizações criminosas e são escravizadas.
Como é possível incorporar no mercado os milhares de imigrantes que chegam da África e Ásia?
Para reduzir o tráfico de pessoas, o trabalho escravo, é necessário reduzir o fluxo migratório, mas é preciso trabalhar sobre as causas que os impulsionam a escapar de seus países. Os líderes políticos são escandalosos, porque choram, mas não fazem nada para modificar a situação. Obviamente, existem aqueles que dizem que os líderes políticos não são os mesmos que antes, como no período de De Gasperi, Adenauer, Schuman e outros.
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“A nova escravidão são as pessoas que não estão incluídas no mercado”, afirma economista italiano Stefano Zamagni - Instituto Humanitas Unisinos - IHU