11 Junho 2015
Após a viagem a Sarajevo, o Pontífice retorna ao argumento das visões na homilia em Santa Marta e, embora sem nunca citar Medjugorje, critica “quem sempre necessita de novidades da identidade cristã” e quem espera por aqueles que anunciam ‘a hodierna carta de Nossa Senhora: “Não transformeis a fé cristã numa religião soft”.
A nota é de Giovanni Panettiere, publicada pelo jornal La Repubblica, 09-06-2015. A tradução é de Benno Dischinger.
O Papa volta a falar de aparições e videntes na homilia da Missa em Santa Marta e critica “aqueles que sempre necessitam de novidades da identidade cristã e esqueceram que foram escolhidos, ‘ungidos’; aqueles que têm a ‘garantia’ do Espírito”. Critica, com uma interrogação irônica, aqueles que se perguntam: ‘Mas onde estão os videntes que nos revelam hoje a carta que Nossa Senhora enviará às quatro horas da tarde?’. “Esta não é uma identidade cristã – sublinha o Papa – A última palavra de Deus se chama Jesus e nada mais”. Ele anunciara no avião que o trazia de volta de Sarajevo que logo faria conhecer a orientação da Igreja sobre as aparições de Medjugorje. Na espera do veredito da Congregação para a Doutrina da fé, todavia, na homilia hodierna durante a missa em Santa Marta, o Papa Francisco pareceu fazer clara referência ao que acontece em torno do santuário mariano da Bósnia.
De retorno de Sarajevo, o Papa, entretendo-se com os jornalistas, havia explicado: “Sobre o problema de Medjugorje o Papa Bento XVI, a seu tempo, havia criado uma comissão presidida pelo cardeal Camillo Ruini; havia também outros cardeais, teólogos e especialistas. Fizeram o estudo e o cardeal Ruini veio a mim e me entregou o estudo, após vários anos, não sei, mais ou menos 3-4 anos. Fizeram um belo trabalho. O cardeal Müller (prefeito da congregação para a doutrina da fé, ndr) me disse que teria feito uma ‘quarta-feira’, ou seja, uma reunião específica, naquela época”. Francisco havia concluído: “Estamos ali, ali, para tomar as decisões. Depois se dirão. De momento se dão somente algumas orientações aos bispos, mas sobre as linhas que serão seguidas”. Palavras que induziram alguns observadores a considerar que esteja próxima uma abertura vaticana sobre as controversas aparições do Santuário, onde três dos seus videntes sustentam ver Nossa Senhora todos os dias.
Hoje, sem citar explicitamente Medjugorje, Francisco parece, ao invés, ter corrigido esta interpretação ‘de abertura’ que lhe foi atribuída. Pelos mesmos motivos hoje foi anulado também o encontro público, em Sestola (Modena), com a vidente de Medjugorje, Vicka Ivanovic. A arquidiocese de Modena difundiu um a nota para esclarecer os motivos da anulação, decidida pelos organizadores do evento “de comum acordo com a sig.ra Ivankovic”, depois que lhes foi recordado, “por solicitação da Congregação para a Doutrina da fé, que até hoje ulterior disposição da parta da Santa Sé deve ater-se somente ao que foi estabelecido pelos bispos da ex-Iugoslávia na declaração de Zara de 10 de abril de 1991: ‘na base das investigações até agora realizadas, não é possível afirmar que se trate de aparições ou de revelações de natureza sobrenatural”. Portanto, “não é permitido ao clero e aos fiéis de nenhuma diocese de participarem de encontros ou celebrações públicas nas quais seria dado por descontada a sua atendibilidade”.
Mas, nas passagens da homilia matutina, o Pontífice – refere a Rádio Vaticana – colocou em guarda quem quer transformar o cristianismo numa “bela ideia”, como quem, ao invés, tem sempre necessidade “de novidades da identidade”. Portanto, acentuou que outro risco para o testemunho cristão é a mundanidade de quem “alarga a consciência” a ponto de fazer-nos entrar em tudo. Não “liquidificar”, disse Francisco, a identidade cristã numa religião “soft”. Francisco desenvolveu a homilia partindo das palavras de São Paulo aos Coríntios, onde fala da identidade dos discípulos de Jesus. É verdade, disse, que “para chegar a esta identidade cristã”, Deus “nos levou a fazer um longo caminho de história” até quando enviou o seu Filho. “Também nós – acrescentou – devemos fazer na nossa vida uma longa caminhada, para que esta identidade cristã seja suficientemente forte “para podermos dar “testemunho”. “É verdade, existe o pecado – disse ele -, e o pecado nos faz cair, mas nós temos a força do Senhor para nos erguer e andar com a nossa identidade”.
Fundamental, acrescentou, “é ser fiel a esta identidade cristã e deixar que o Espírito Santo, que é precisamente a garantia, o penhor do nosso coração, nos leve adiante na vida”. Não somos pessoas que vão “atrás de uma filosofia”, advertiu, “somos ungidos” e temos a “garantia do Espírito”. “É uma bela identidade – disse ele ainda – que se torna visível no testemunho. Por isso Jesus nos fala do testemunho como a linguagem da nossa identidade cristã”. E isto também se a identidade cristã, já que “somos pecadores, é tentada, vem sendo tentada; as tentações chegam sempre e a identidade “pode debilitar-se e pode perder-se”. O Papa pôs em guarda sobre duas vias perigosas: “Antes aquela do passar do testemunho às ideias, liquidificar o testemunho. ‘Eh sim, sou cristão. O cristianismo é isto, uma bela ideia. Eu oro a Deus’. E assim, do Cristo concreto, porque a identidade cristã é concreta – nós o lemos nas Bem-aventuranças; esta concretude está também em Mateus 25: a identidade cristã é concreta – passamos a esta religião um tanto soft, na atmosfera e na estrada dos gnósticos. Por trás está o escândalo. Esta identidade cristã é escandalosa. E a tentação: “Não, não, sem escândalo”. “A cruz – disse, é um escândalo” e por isso há quem procura Deus “com estas espiritualidades cristãs um pouco etéreas”, os “gnósticos modernos”. Outra estrada para darmos passos para trás na identidade cristã, acrescentou, é a mundanidade: “Alargar tanto a consciência que ali entra tudo. ‘Sim, nos somos cristãos, mas isto sim... ’ Não só moralmente, mas também humanamente. A mundanidade é humana. E assim o sal perde o sabor. E vemos comunidades cristãs, também cristãos, que se dizem cristãos, mas não podem nem saber dar testemunho de Jesus Cristo”.
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Papa Francisco sobre aparições: à fé não servem videntes - Instituto Humanitas Unisinos - IHU