Por: André | 30 Janeiro 2015
Guillaume Zeller é jornalista e redator-chefe de DirectMatin.fr. Ele também foi responsável de pesquisa no Serviço Histórico do Exército. Seu novo livro La Baraque des prêtres, Dachau, 1938-1945, acaba de ser publicado pela Éditions Tallandier.
Fonte: http://bit.ly/1wzjrwn |
A entrevista é de Guillaume Perrault e publicada no jornal francês Le Figaro, 27-01-2015. A tradução é de André Langer.
Eis a entrevista.
Como explicar o número de padres, seminaristas e monges deportados para Dachau?
De 1938 a 1945, 2.579 padres, seminaristas e monges católicos foram deportados pelos nazistas, bem como cerca de 141 pastores protestantes e sacerdotes ortodoxos. Tratando-se de católicos, o Vaticano é impotente para impedir a sua deportação. A Santa Sé consegue apenas que sejam agrupados em Dachau. Esses homens de Igreja vêm de toda a Europa: Alemanha, Áustria, Tchecoslováquia, Polônia, Bélgica, Holanda, Luxemburgo, França ou ainda da Itália.
Eles não estão presos como padres católicos stricto sensu, mas por diferentes razões. Os alemães pagam muitas vezes o preço por sua oposição ao programa de eutanásia hitlerista, o Plano T4. Os padres poloneses são considerados como elites eslavas pelos nazistas e figuram entre os seus alvos, como testemunham os relatórios enviados por Heydrich sobre as prisões efetuadas pelos Einsatzgruppen na Polônia, em 1940. Os padres franceses, por sua vez – eles são 156 em Dachau –, são deportados por causa da sua participação ativa na resistência interna.
Como se organiza a resistência moral e espiritual dos padres e seminaristas deportado para esse campo?
Os religiosos de Dachau conhecem os mesmos sofrimentos que os seus camaradas leigos. Dos 2.720 religiosos, 1.034 – dos quais 868 são poloneses – morrem no campo até a sua libertação. Mas eles conseguem, no seu conjunto, conservar uma surpreendente dignidade, enquanto tudo é feito pela SS, apoiada pelos kapos, para desumanizar e degradar prisioneiros. Primo Levi, ainda ateu, observou em É isto um homem? a notável obrigação intelectual e moral de rabinos deportados para Auschwitz. Se as circunstâncias são diferentes, a situação é comparável com os padres de Dachau. Esses clérigos se esforçam para manter as virtudes da fé, esperança e caridade. A oração, os sacramentos, a ajuda concedida aos doentes e moribundos, a organização de formações teológicas ou pastorais clandestinas e a reconstrução da hierarquia eclesial são uma estrutura que lhes permite manter a sua humanidade. O precedente das perseguições da Igreja nos primeiros séculos do cristianismo também está presente em suas mentes e corações.
Seu livro está cheio de histórias individuais chocantes...
A perversidade da obra concentracionista reside principalmente no fato de que os SS jogavam os prisioneiros uns contra os outros. O pior inimigo do deportado acaba sendo, muitas vezes, o próprio deportado. No entanto, a grande maioria dos padres de Dachau não cede a este mecanismo. Em vez disso, os episódios heróicos são abundantes. Durante o inverno de 1944-1945, os deportados são dizimados por uma epidemia de tifo. Enquanto a SS e os kapos fogem dos pavilhões contaminados, dezenas de padres expõem-se consciente e voluntariamente à doença para cuidar e consolar os moribundos. Alguns acabam morrendo.
Um outro episódio: a ordenação clandestina de um seminarista alemão às portas da morte, Karl Leisner, por um bispo francês, dom Gabriel Piguet, bispo de Clermont-Ferrand, deportado para Dachau por seu apoio ao alojamento de judeus, e que hoje faz parte dos Justos do Yad Vashem. A ordenação clandestina desse jovem seminarista alemão condenado à morte, única na história da Igreja, foi celebrada em uma autêntica capela, alojada em um dos pavilhões reservados aos religiosos. Por decisão de João Paulo II, de Bento XVI e de Francisco, 56 clérigos mortos em Dachau foram beatificados após o processo que confirmou a prática das virtudes naturais e cristãs, de maneira exemplar ou heróica. E o campo de Dachau continua a ser o maior cemitério de padres católicos do mundo.
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"Mais de 2.500 padres e seminaristas católicos foram deportados para Dachau". Entrevista com Guillaume Zeller - Instituto Humanitas Unisinos - IHU