12 Mai 2016
O vice-presidente Michel Temer vem conversando com interlocutores desde o início do ano, quando percebeu que o impeachment de Dilma Rousseff parecia uma realidade. Às vésperas do afastamento da presidenta depois da votação do processo no Senado, Temer já tem nomes estratégicos para integrar seu Governo, que deve começar nesta quinta. O atual vice, e futuro presidente do Brasil deixou claro que sua prioridade número um, dois, três e quatro para os seus dois anos e meio de Governo é a economia. O novo presidente do Brasil a partir desta semana empenhou-se em montar um time dos sonhos (dream team) para enfrentar a recessão econômica que sangra o país, com o ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles dos dois Governos Lula (2003-20-10) comandando uma das pastas mais críticas, a Fazenda. O atual economista-chefe do Itaú, Ilan Goldfajn, deve lhe fazer companhia na equipe econômica como titular do BC, para deleite do mercado financeiro.
A reportagem é de Afonso Benites e Carla Jiménez, publicada por El País, 11-05-2016.
A alegria dos investidores contrasta com a angústia gerada com a indicação de nomes para pastas que esbarram em questões sociais delicadas. Alexandre de Moraes, atual secretário de Segurança de São Paulo (PSDB-SP), é cotado para substituir Eugênio de Aragão, na Justiça, e o senador e empresário do agronegócio Blairo Maggi (PR-MT) pode assumir a pasta da Agricultura. Bilionário, maior produtor individual de soja do mundo, Maggi gerou arrepios entre ambientalistas ao atuar como relator de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que praticamente elimina a exigência de licenciamento ambiental para obras públicas.
A PEC foi aprovada no final de abril na Comissão de Constituição Justiça e Cidadania do Senado. “Se essa PEC prosperar, vai transformar a legislação ambiental brasileira, que já foi uma das mais avançadas do mundo, em uma legislação medieval”, afirmou o deputado Sarney Filho (PV-MA) na ocasião. Sarney Filho é coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista. Maggi também carrega em seu currículo o título de campeão de desmatamento da chamada Amazônia Legal – Estados que comportam a floresta amazônica – enquanto governou seu Estado entre 2003 e 2010 – em 2005 o Greenpeace o premiou como o Motosserra do Ano.
Já o atual secretário de Segurança paulista, Alexandre de Moraes é outro nome que vem gerando críticas principalmente entre movimentos de direitos humanos. Advogado constitucionalista que estava sendo moldado pelo PSDB e pelo PMDB para ser prefeito de São Paulo, já advogou para o deputado Eduardo Cunha, que estaria fazendo pressão para indicá-lo à pasta da Justiça, justamente o órgão a quem a Polícia Federal é subordinada. A mesma PF que investiga Cunha e dezenas de políticos na Lava Jato, entre eles, o senador Romero Jucá (PMDB-RR), que será ministro do Planejamento de Temer.
O futuro presidente da transição já disse que não há a menor chance de haver interferência nas investigações da Lava Jato ou no Ministério Público, e sua equipe garante que a escolha de Moraes tem mais a ver com o fato dele ser um constitucionalista respeitado, do que por sua eventual proximidade com Cunha.
No comando da Segurança em São Paulo, o virtual ministro obteve mais derrotas do que vitórias. Reduziu a taxa de homicídios dolosos por 100.000 habitantes no Estado (caiu de 10,06 para 8,73), mas viu a letalidade policial aumentar consideravelmente. Das 12 vítimas diárias de homicídios dolosos em 2015 no Estado de São Paulo, ao menos 2 morreram nas mãos de policiais.
Para alguém que teria de representar a Justiça, Moraes começaria com algumas dívidas sociais, avaliam alguns observadores. Como no caso da chacina em Carapicuíba, na grande São Paulo, no mês de setembro do ano passado, segundo noticiou a Folha de S. Paulo. Na ocasião, ele apontou que quatro jovens foram assassinados na cidade da região metropolitana de São Paulo, por vingança de um policial que entendia que os rapazes haviam roubado a bolsa de sua mulher. As investigações mostraram que essa versão estava equivocada, os jovens eram inocentes e as famílias cobram desculpas formais do secretário, que não informou se vai reabrir o caso.
Até o momento, só revelou um lado repressivo com movimentos sociais, como o dos estudantes que cobram melhores condições de educação. A polícia militar, comandada por ele, tem sido severa em reprimir os atos. Nesta terça, Moraes classificou os protestos contra o impeachment da presidenta que aconteceram na cidade de São Paulo de “atos de guerrilha” em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo. “Vamos identificar [os manifestantes] porque há atitude criminosas, inclusive colocando em risco outras pessoas onde pneus foram queimados”, afirmou.
Há outros nomes que são uma verdadeira incógnita, como o do deputado Mendonça Filho (DEM-PE) que deve ir para a educação, uma pauta recorrente de manifestações nas ruas, seja à esquerda ou à direita. Vice-líder de seu partido na Câmara, o deputado pernambucano foi um dos mais aguerridos parlamentares em defesa do impeachment da presidenta Dilma. A pasta deve acumular, ainda, a área de Cultura.
Para especialistas na área, sua falta de conhecimento específico leva a crer que ele seguirá mais a agenda dos empresários do setor de educação, do que os compromissos do Plano Nacional de Educação, que prevê, por exemplo, a valorização do salário do professor e o aumento dos investimentos na sua área. Para Daniel Cara, Coordenador Geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, é difícil acreditar que ele seguirá esse projeto que significa justamente aumentar os recursos para a área num momento em que o novo Governo assume voltado para o compromisso com o ajuste fiscal.
Renato Janine Ribeiro, que foi ministro da Educação da presidenta Dilma no ano passado, acredita que tanto educação quanto saúde deveriam ser pastas blindadas de loteamento político. “Nos últimos 24 anos o Brasil teve nove ministros na área, de diferentes linhas de pensamento, mas todos trabalharam pela valorização da educação pública”, afirma. Para ele, é fundamental que Temer mantenha esse mesmo critério na hora da escolha do titular da pasta ou “corre o risco de arrumar novos problemas em vez de resolver o que precisa ser resolvido”.
A saúde, porém, deve ser ocupada por outra indicação política: o paranaense Ricardo Barros, vice-presidente do PP, legenda que estava na base do Governo de Dilma e se bandeou para o lado de Temer. O apoio ao vice – ou a traição a Dilma, segundo a leitura da presidenta – foi premiada. Em entrevista ao jornal Zero Hora no dia 17 de abril, o deputado Osmar Terra (PMDB-RS) deu uma declaração nesse sentido. “O nosso maior patrimônio é essa articulação que fizemos para aprovar o impeachment. É natural que os partidos que derrotaram Dilma agora se incorporem à base de um governo Temer”, explicou. Terra, aliás, um dos primeiros representantes do PMDB a romper com a presidenta que será afastada, vai assumir a pasta do Ministério Social, uma pasta que ganhou visibilidade nos anos do PT no poder.
Os nomes dos titulares e o número final de ministérios só serão conhecidos quando Temer for confirmado o presidente da transição ao final da votação da admissibilidade do impeachment no Senado. Inicialmente, o plano do Governo Temer era reduzir as atuais 32 pastas para 22, mas voltou atrás para acomodar interesses de aliados. Segundo seus assessores, serão entre 25 e 27 ministros, alguns que só serão conhecidos quando ele já tiver tomado posse. Até lá, o campo das especulações e a desconfiança vai continuar.
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Temer agrada com nomes de equipe econômica e frustra nas demais áreas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU