15 Março 2016
Na quinta-feira passada, Sandro Magister informou que o Papa Francisco teria enviado o nome de Dom Christophe Pierre ao governo dos EUA para aprovação, antes de nomear o arcebispo como o próximo núncio apostólico para os Estados Unidos. Pierre é atualmente o núncio para o México.
A reportagem é de Michael Sean Winters, publicada por National Catholic Reporter, 11-03-2016. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Nem todas as informações fornecidas por Magister acabam resultando verdadeiras, mas eu venho escutando o nome de Pierre com um novo núncio potencial há meses. O outro candidato mais discutido, Dom Celestino Migliore, atualmente núncio apostólico na Polônia, fazia bastante sentido, dados os seus dois últimos cargos nos EUA, como conselheiro da nunciatura apostólica americana na década de 1980 e, mais tarde, como núncio para as Nações Unidas em Nova York. Mas Migliore está organizando uma viagem papal à Polônia neste verão, e diante da oposição ao Papa Francisco expressa por alguns bispos poloneses durante o Sínodo do ano passado, fazer desta viagem um sucesso não é tarefa fácil e pode sobrecarregar os talentos de um núncio novo em folha.
Também o Vaticano não tem tempo para esperar. Dom Carlo Maria Vigano, o atual núncio apostólico, atingiu a idade obrigatória de aposentadoria em janeiro e o seu mantado foi, um pouco, controverso, em particular na decisão infame de convidar a senhorita Kim Davis para se encontrar com o papa durante a visita dele aos EUA em setembro passado. Dadas a atmosfera política incrível no país e a necessidade de preencher alguns cargos-chave na hierarquia, o Vaticano quer um homem renovado o quanto antes.
Mês passado, Pierre hospedou o Papa Francisco na visita que este fez ao México. Então tenho certeza de que eles tiveram tempo para discutir o novo cargo.
Independentemente de se a nomeação de Pierre vai, de fato, se confirmar, é válido tirarmos um momento para explicar por que um novo núncio apostólico é tão importante. Primeiro, o núncio, como todos os embaixadores, está encarregado de manter relações com o governo dos EUA. O Vaticano e o governo americano colaboram em uma série de questões ao redor do mundo, mesmo quando existem tensões entre a Igreja local e o governo.
Nos últimos sete anos, o Vaticano manteve uma relação de trabalho muito melhor com o governo americano do que com a Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos – USCCB (na sigla em inglês). O Vaticano desempenhou um papel-chave nas negociações que levaram à restauração das relações diplomáticas entre EUA e Cuba. No começo de sua carreira, Pierre teve um cargo em Havana. Assim, ele está bem familiarizado com este país e pode ajudar a diminuir qualquer solavanco que possa se desenvolver nesta nova relação.
Segundo, o Vaticano está com certeza preocupado a respeito da candidatura de Donald Trump. Os diplomatas vaticanos tendem a vir das mesmas famílias, a frequentar as mesmas escolas e ler as mesmas revistas e jornais, assim como as suas contrapartes seculares.
Não é nenhum segredo que os governos da Europa estão revoltados e assustados com a perspectiva de uma presidência com Trump no poder, e esses sentimentos são, sem dúvida, compartilhados pelo Vaticano. Porque a oposição aos imigrantes é uma parte central na ascensão política de Trump, e porque a preocupação com os imigrantes vem sendo um foco central da articulação da doutrina social católica sob a liderança do Papa Francisco, certamente ocorreu ao Vaticano que um arcebispo que passou os últimos nove anos no México pode ser singularmente valioso a esta altura. Além disso, a imigração não só é um dos temas que unem os bispos americanos, mas também os coloca em total sintonia com o Vaticano.
Além de se relacionar diretamente com o governo americano, um núncio apostólico é também encarregado de manter as relações entre a Igreja local e a Santa Sé. É claro que cada bispo tem certos direitos canônicos para apelar diretamente a Roma, e o presidente da USCCB faz uma viagem anual ao Vaticano para se reunir com as autoridades do topo da hierarquia. Existe a visita ad limina também. Grande parte dos trabalhos de rotina é conduzida ou pelo núncio.
Por exemplo, quando o povo da Arquidiocese de St. Paul, em Minnesota, precisou manifestar a sua frustração com o seu arcebispo anterior, a primeira pessoa a quem apelaram foi o núncio. Ele encaminhou petições e outras informações ao Vaticano, mas estava livre para comentar e modelar, com estes seus comentários, a reposta que o Vaticano daria. Desse modo, a remoção de Dom John Nienstedt foi, segundo me contaram, feita contra a vontade do núncio apostólico e teria sido realizada muito tempo atrás se o núncio tivesse visto a situação de forma diferente.
Em nenhum outro lugar a influência do núncio é mais óbvia – e mais duradoura – do que na escolha dos novos bispos. Quando uma diocese fica vacante, o núncio se torna encarregado de investigar as necessidades da diocese e então propor nomes de três candidatos que poderão atendê-las.
Esta lista de candidatos, chamada “terna”, é enviada à Congregação dos Bispos, que pode passá-la adiante ao papa como tal, pode mudar as qualificações dos três nomes na lista ou mesmo rejeitá-la e pedir uma nova. Diferentes núncios lidam com esta tarefa de maneiras diferentes, com níveis variados de atenção às reais necessidades de uma dada jurisdição. Na década de 1980, o arcebispo, e mais tarde cardeal, Pio Laghi, insistia numa análise em profundidade das necessidades de uma dada diocese e, então, saia em busca, como ele dizia, do santo certo para o nicho certo.
Laghi nem sempre acaba tendo os resultados que quer. Ele foi a Roma para se queixar de que muitas destas ternas estavam sendo rejeitadas ou alteradas. Dom Gabriel Montalvo, pessoa a quem conheci muito bem, era um homem adorável com uma propensão a remover Dom Raymond Burke da Arquidiocese de St. Louis. Mas, aso assim fazer, acabou se tornando um desastre, na medida em que Burke, hoje cardeal, mostrou-se ser uma pedra no sapato no lado do Papa Francisco.
E, sob o anual núncio, Vigano, houve uma série de nomeações importantes nos últimos anos do reinado de Bento XVI, quando os cardeais Burke e Justin Rigalil estavam na Congregação para os Bispos. Somente quando o Papa Francisco removeu Burke e Rigali desta Congregação, substituindo-os pelo Cardeal Donald Wuerl, cessou a nomeação de guerreiros culturais para dioceses importantes, de forma mais evidente no caso de Dom Blase Cupich à Arquidiocese de Chicago. Essa nomeação veio direto do papa, que sempre mantém os seus próprios métodos de coleta de informações sobre candidatos potenciais para dioceses de grande relevância.
Nem todas as dioceses são como Chicago, no entanto, e em muitas jurisdições eclesiásticas menores papa algum saberia os nomes dos candidatos. É por isso que o núncio, que produz a primeira lista de nomeações potenciais, é tão essencial.
Há cerca de um terço dos bispos americanos que apoiam decisivamente o Papa Francisco, e um terço que mantém reservas quanto à sua liderança, além de um terço de prelados que não têm certeza do que acham.
Certamente, a maneira e o conteúdo das palavras colocadas pelo papa ao Congresso americano foram diferentes daquela linguagem sobre política e cultura que ouvimos de alguns bispos americanos inseridos nas guerras culturais.
Se o papa quer uma Conferência Episcopal que o apoie, então ele precisa que o seu novo núncio nomeie cerca de 20 a 30 bispos que estão juntos com ele em seu programa. A mim, é revelador que, nos últimos anos, ao ler as listas das nomeações mostradas no sítio eletrônico do Vaticano, os novos bispos no México eram todos pastores. Se Pierre vier mesmo para Washington, então poderemos esperar que ele vá nomear pastores para liderar as dioceses dos EUA também.
Atualmente, existem duas grandes dioceses vacantes que precisam ser preenchidas. A Arquidiocese de St. Paul, em Minnesota, está sendo gerida magistralmente pelo administrador apostólico, Dom Bernie Hebda, porém Hebda deve assumir como prelado a Arquidiocese de Newark, em julho, o que significa que St. Paul deverá ter uma nomeação em breve. O mesmo acontece com o Rockville Center, em Nova York, que, embora não sendo uma arquidiocese e nem possua alguma significação histórica especial, é enorme: a Diocese de Rockville Center é a sexta maior do país. Além destas duas principais nomeações, a USCCB está prestes a ver dois de seus mais importantes bispos – Robert Lynch (de St. Petersburg, na Flórida) e Jerry Kicanas (de Tucson, no Arizona) – atingirem a idade de aposentaria obrigatória neste ou no próximo ano. E, além da necessidade de preencher dioceses particulares, há a necessidade de encontrar candidatos latinos para o episcopado. Foi um pouco chocante ver três bispos auxiliares nomeados em Los Angeles e todos eles eram irlandeses! A Igreja nos EUA está rapidamente tornando-se majoritariamente latina e nós precisamos desesperadamente cultivar sacerdotes latinos de destaque de forma que possam assumir papéis de responsabilidade e liderança nos próximos anos.
Em grande parte do mundo, os embaixadores não desempenham o papel fundamental que certa vez desempenharam na condução das relações exteriores. O uso de emails e as viagens aéreas permitiram que os legisladores nas capitais nacionais conduzam estas relações diretamente. Mas a Santa Mãe Igreja geralmente se encontra um pouco desatualizada na relação com os recentes desenvolvimentos. Os núncios apostólicos são importantes. Pierre parece idealmente a pessoa certa para suprir as necessidades da Igreja neste país. Se esta for, realmente, a escolha do papa, deveremos todos nós orar por em seu nome enquanto ele dá início a estas tarefas monumentais e consequentes.
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Núncio do México promovido para os EUA? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU