14 Julho 2015
"O papa pede que a Igreja seja um agente de mudança, uma enzima capaz de pôr em relação as diferenças. E pede que ela esteja perto das pessoas." O padre Antonio Spadaro, diretor da revista La Civiltà Cattolica, que acompanhou cada passo de Francisco na América Latina, sintetiza assim, nesta entrevista ao Vatican Insider, a mensagem que emerge dos gestos e das palavras de Francisco no Equador, Bolívia e Paraguai.
A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada no sítio Vatican Insider, 11-07-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
Na sua opinião, o que o Papa Bergoglio pede aos bispos latino-americanos?
Acima de tudo, que sejam homens de oração, expressão daquela fé que aqui é transmitida como o leite materno e que contribuiu para a identidade desses povos. Depois, parece-me que ele os convida a serem pastores próximos do povo, que cuidam das feridas do povo, evitando o rigorismo que impede de ver as pessoas na sua concretude, porque olha abstratamente para a teoria. Só um pastor que não seja rigorista impede que o bispo se transforme em um funcionário. O papa fala do "perigo da estola", isto é, de assumir um poder e de ver a estola como um poder que coloca o pastor em uma posição de superioridade e da separação.
O que ensina o modo com que Francisco se encontrou com os movimentos populares?
É um exemplo de discernimento. O papa sabe reconhecer o valor humano e espiritual de cada realidade humana com a qual entra em contato. A relação com os movimentos populares demonstra isso: eles representam uma realidade variada, há de tudo dentro. Há reivindicações positivas, mas também excêntricas. Francisco é capaz de "inspirar" os melhores desejos de todos e, depois, "expirá-los", dando-lhes uma forma que, em seguida, as pessoas reconhecem como própria. O papa absorveu as tensões dos movimentos populares, "digeriu-as" à luz da doutrina social da Igreja e as "expirou", restituindo-as como respiro. Francisco nos ensina que não há lugares certos e lugares errados, cada ser humano deve ser valorizado ao máximo.
Esse é o modelo da Igreja "em saída"?
O papa pede que toda a atividade pastoral também seja apostólica, isto é, que cada atividade pelo cuidado dos fiéis tenha uma dimensão missionária, voltada para aqueles que estão fora. Mesmo quando se cuida do próprio rebanho, tudo deve ser, ao mesmo tempo, missionário. É um setting mental, tudo deve ser aberto à missão. Mesmo as festas patronais e populares – apenas para dar um exemplo – não devem ser consideradas como festas da comunidade, mas ocasião de encontro com os outros.
Existe uma dimensão "jesuítica" dessa viagem latino-americana?
Certamente. Particularmente, me chamou a atenção aquilo que o papa disse à sociedade civil em Quito, quando citou Santo Inácio de Loyola para dizer que o amor se demonstra mais com obras do que com as palavras. Isso implica duas consequências: a concretude e a importância dos processos. A obra não é apenas um fato, mas uma energia, um processo que se desenvolve. Esse, na minha opinião, é um critério claro para entender o papa: para ele, é importante para iniciar processos, isto é, acompanhar o que acontece no mundo, não dominar. E isso nos faz entender como a Igreja deve estar presente no mundo. Nos Exercícios Espirituais de Santo Inácio, quem acompanha não é quem guia, mas quem ouve a voz de Deus e como Deus se move para acompanhar esses processos.
Francisco falou da interdependência dos países latino-americanos.
Nenhum Estado da América Latina pode estar de pé sozinho. O papa gosta de propor a figura do poliedro e, por isso, preferiu visitar aqueles países onde esses processos são mais visíveis. Esses conteúdos não valem apenas para a América Latina, mas representam também critérios de ação universal, por exemplo, para compreender o que a União Europeia está vivendo.
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''O papa convida a Igreja a acompanhar a mudança.'' Entrevista com Antonio Spadaro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU