01 Mai 2015
"Os males da injustiça social sofrida historicamente pelas/os trabalhadoras/es é certo serão denunciados novamente nesse dia, sem ocultação das suas causas. Mas é certo também estarem elas/es muito menos interessadas/os na pirotécnica dos shows organizados pelas centrais sindicais do que nas propostas a serem discutidas por elas, pelos movimentos populares aliados, no efetivo empoderamento da defesa dos direitos humanos fundamentais sociais conquistados no passado, agora sob risco iminente de violação", escreve Jacques Távora Alfonsin, procurador aposentado do Estado do Rio Grande do Sul e membro da ONG Acesso, Cidadania e Direitos Humanos.
Eis o artigo.
Datas comemorativas de acontecimentos históricos, dignos de serem relembrados, quase sempre são marcadas por dor, sofrimento e mortes heróicas. Se o natal foge a essa regra, até a páscoa é precedida de uma sexta-feira de cruz.
Geralmente essas datas lembram gente sacrificada em defesa de direitos, na sua época considerados subversivos da ordem e da segurança, posteriormente reconhecidos como devidos e introduzidos em lei, provocando sentimentos de nojo da repressão sofrida no passado e pasmo diante do atraso em serem respeitados.
Assim como 20 de novembro marca o dia nacional da consciência negra, por ser o dia do assassinato de Zumbi, em 1695, no quilombo de Palmares, como 8 de março foi consagrado como dia internacional da mulher, para recordar a morte das mulheres que, ainda no século XIX reivindicavam melhores condições de trabalho e direito ao voto, em Nova York, como 17 de abril foi reconhecido como o dia internacional da luta camponesa, em memória do massacre de Eldorado do Carajás em 1996, 1º de maio não foge a essa “regra”.
A data lembra um protesto de trabalhadores, em Chicago, no ano de 1886. Um dia depois a polícia dispersou outro, matando um dos manifestantes. Em reação a um terceiro, no dia seguinte, reunindo multidão de trabalhadoras/es inconformadas com aquela morte, a policia matou mais doze e feriu outros tantos.
Passado tanto tempo, existe alguma novidade nas freqüentes passeatas, manifestações de rua, aqui mesmo no Brasil, relacionadas com greves, reivindicações salariais, ameaças de desemprego, perda de direitos conquistados a custa de tantas mortes no passado?
A marca permanente desses protestos, por mais que se queira pintar as motivações com outras cores, mais “civilizadas”, mais “pacíficas”, é a da velha e conhecida luta de classes, com o capital de um lado, indisposto a qualquer concessão subtraída ao seu lucro e o trabalho de outro, indisposto por sua vez a prosseguir sendo explorado injustamente.
O mar de ideologias e conveniências políticas aliadas de um e outro desses lados, as divisões externas e internas presentes neles, ainda são incapazes de esconder o fato de que as tentativas legais de disciplinar a liberdade concentracionista de dinheiro do capital, em defesa da libertação da pobreza e até da miséria presente nas vidas das/os trabalhadoras/es, ainda estão muito longe de conseguir uma partilha equitativa da nossa riqueza, eliminando as causas econômico-políticas da nossa escandalosa desigualdade social.
Luiz Carlos Bresser-Pereira deixou muita gente preocupada por ter desvelado e condenado publicamente uma dessas causas, talvez a principal delas. Na entrevista concedida à Zero Hora de domingo passado, embora mostrando flagrantes erros presentes na política econômica do segundo mandato da Presidenta Dilma, responsáveis, segundo sua opinião, pela crise atualmente vivida no país, Bresser bateu no fígado do capital, à uma pergunta sobre corrupção:
“Os ricos nunca gostaram e temem a democracia”. (...) Eu disse que a classe capitalista teme a democracia, e precisa controlá-la. E como faz isso? Desmoralizando o Estado e o político e comprando o político. E é isso que a classe capitalista faz com essa coisa escandalosa que é o financiamento de campanha por empresas.” (...) Porque a corrupção é inerente ao capitalismo. A lógica do capitalismo é a lógica do lucro, e o critério de êxito é a riqueza.”
Não há necessidade de se transpor uma tal lição para as relações entre o capital e o trabalho, para se provar a razão daquelas mortes acontecidas no passado levarem tantas/os trabalhadoras/es para as ruas no dia 1º de maio. Elas/es não querem a repetição dos efeitos desse lucro sujo, aí denunciado, nem no presente, nem no futuro, como a terceirização do trabalho, por sinal, ameaça impor.
Os males da injustiça social sofrida historicamente pelas/os trabalhadoras/es é certo serão denunciados novamente nesse dia, sem ocultação das suas causas. Mas é certo também estarem elas/es muito menos interessadas/os na pirotécnica dos shows organizados pelas centrais sindicais do que nas propostas a serem discutidas por elas, pelos movimentos populares aliados, no efetivo empoderamento da defesa dos direitos humanos fundamentais sociais conquistados no passado, agora sob risco iminente de violação.
Se alguma festa o lazer de 1º de maio vai garantir, portanto, será a de um abraço entusiasmado de união de todo esse povo, consciente e disposto a não continuar sendo enganado por Estados de direito e democracias aparentes, sufocadas por liberdades econômicas impeditivas de libertação social. Se são graves os efeitos da corrupção política, com justa razão atualmente sob rigorosa investigação no país, a multidão de oprimidas/os por um sistema econômico visceralmente corrupto merece ser defendida com muito maior empenho e rigor, pois além de integrar a causa da primeira, seu efeito mais injusto e perverso está presente na segunda.
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1º de maio: Uma data nada festiva este ano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU