11 Março 2015
Numa carta à Ordem, o Ministro Geral dos Franciscanos Conventuais analisa um problema global de justiça.
O alimento? Não só “carburante” para o metabolismo do corpo humano, preferivelmente instrumento privilegiado de comunhão fraterna, ocasião para estar junto, para falar e conversar e, sobretudo momento de “bênção” para conectar-se com Deus e os irmãos.
Mas, dar comida – aliás, nutrientes e alimentação – significa simultaneamente dirigir a atenção aos graves desequilíbrios existentes hoje no mundo.
A reportagem é de Maria Teresa Pontara Pederiva, publicada por Vatican Insider, 06-03-2015. A tradução é de Benno Dischinger.
É uma bela e profunda reflexão aquela que o padre Marco Tasca, ministro geral dos Frades menores conventuais, enviou hoje, quase uma “Carta de Quaresma”, a mais de 4.000 frades em 63 nações dos cinco continentes, nas quatro línguas oficiais da Ordem (italiano, inglês, espanhol, polaco).
A carta, que será apresentada oficialmente em Assis no dia 28 de março, estigmatiza desde as primeiras linhas “os graves problemas ligados de uma parte à chaga da fome e, de outra parte aos excessos da superalimentação, como também às injustiças que se consumam na produção, distribuição e fruição de quanto deveria servir para satisfazer as necessidades de todos”, problemas, todos ocidentais, ligados à obesidade e ao escândalo do desperdício, associados à dramática situação de milhões de famintos e mal nutridos.
“Educar-nos ao alimento, ao seu valor e aos perigos conectados ao seu abuso, poderá ser de ajuda para obter comunidades mais sãs e ao mesmo tempo mais santas” se lê no texto que declara enviar à iminente abertura da Expo de Milão, dedicada precisamente ao tema do “Nutrir o planeta”.
Mas, é acima de tudo o magistério do Papa Francisco que constitui o ponto de referência. Se um dos temas recorrentes de Bergoglio é aquele da Igreja em saída – que abandona toda auto-referencialidade para assumir o passo dos homens e das mulheres do nosso tempo – Tasca recorda como os religiosos sejam “homens de fronteira, chamados a viver criativamente os desafios de todos (e o do alimento é um dos mais importantes) com autêntico compartilhamento e audácia profética”.
Mas, aqui surge espontânea a pergunta sobre quem é chamado ao papel de guia: “O povo considera os Franciscanos como pessoas frugais, também na mesa, e acima de tudo irmãos universais atentos às necessidades de todos, em particular dos pobres. Estamos nós na altura desta fama? Podemos de algum modo repensar de forma criativa os nossos estilos de vida, de alimentação, os critérios com os quais usamos os bens da terra?”
Um sério exame de consciência que chama em causa estilos de vida pessoais e comunitários. Se entre as linhas se pode ler o “Capítulo das esteiras” em vida do Santo Padre Francisco, em 1221 quase um retorno às origens do franciscanismo, declarado é o intento do Ministro:
“Esta minha Carta quer ser a primeira de uma série dedicada à solidariedade e aos estilos de vida. Não só para testemunhar ao mundo que a seqüela profética transforma a existência e a abre ao dom de si, mas também para que entre nós, em qualquer nível (frade individual, convento, província, circunscrição, Ordem) haja a devida atenção às necessidades dos mais “pequenos”, indivíduos e coletividades“, como de resto tinha sido o sentido da prioridade da Ordem para os anos 2013-19, brotadas do último Capítulo geral de 2013 “Viver o Evangelho”.
Crua, mas realista, a análise da situação atual que mostra uma relação negativa e negada da humanidade com o alimento (“fome e obesidade são sintomas de um único problema”) que amplia o raio fino para compreender toda injustiça sobre o planeta agora presa do mercado e que compartilhou em duas: “Quanta justiça e quanta injustiça, quanta paz e quanta violência, quanto trabalho e quanta rapina no gesto natural, espontâneo e necessário de nutrir-se?”.
Mas, quantos crêem no Pai que “dá o alimento a todo vivente” (Salmo 136, 25) e ao Filho que estendeu a todos o convite para participar da mesa comum e invocar o dom do pão cotidiano, sabem bem que a comida desperdiçada ou jogada fora é um “insulto a quem padece a fome” e um “desperdício da criação que torna a terra mais pobre e inospitaleira para as gerações futuras”.
O modelo ainda hoje extraordinariamente atual – em primeiro lugar para a Ordem, mas a ser estendida aos leigos – é aquele de Francisco de Assis que, se conhecia o jejum e a abstinência e vivia a pobreza, também apreciava a convivência reconhecendo como prioridade o compartilhamento fraterno da mesa com os pobres.
“Louvado sejas, meu Senhor, pela nossa mãe Terra, a qual sustenta e governa, e produz diversos frutos com coloridas flores e ervas” (Cant 20: FF 263).
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O alimento entre solidariedade e estilo de vida - Instituto Humanitas Unisinos - IHU