10 Março 2015
Velasio De Paolis lecionou por 40 anos filosofia moral e direito canônico nas universidades católicas. No dia 13 de março de 2013, estava naquele conclave que votou como papa Jorge Mario Bergoglio. Foi criado cardeal por Joseph Ratzinger: "No Vaticano, falava-se de uma iminente renúncia de Bento XVI. Eu não pensava que fossem notícias válidas. Ratzinger estava passando por um período difícil para a Igreja sob muitos aspectos. Ele não sentia em si a força para enfrentá-los. A saúde não tem nada a ver. Talvez era preciso uma carga de energia. Houve alguns que tentaram, mas sem sucesso, fazê-lo desistir."
A reportagem é de Carlo Tecce, publicada no jornal Il Fatto Quotidiano, 09-03-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
Bergoglio vai repetir a escolha de Ratzinger?
Não acredito, os dois são muito diferentes.
Agora, a temível Cúria parece mais disciplinada.
Os jornalistas estavam obcecados pelos escândalos no Vaticano, reduzidos em extensão e número. Digamos que, com Francisco, as atenções se voltaram para outra parte.
Não existe mais a luta de poder?
Quem por toda a vida serviu a Igreja pode ter legítimas ambições de carreira, mas tais ambições não podem ser sustentadas a todo custo. O que deve ser condenado são os subterfúgios e a arrogância de quem pensa em si mesmo e ignora a própria missão.
Depois do papa polonês e do papa alemão, não era o momento para um italiano?
No conclave, éramos 115, muitos de nós nem se conheciam. A idoneidade de um cardeal para ser papa não deveria dizer respeito à nacionalidade ou ao continente ou ao âmbito cultural, mas a sua capacidade de ajudar a Igreja universal.
O cardeal Angelo Scola era o candidato favorito.
O velho ditado diz: você entra papa e sai cardeal por um motivo elementar.
Qual?
O nome que é pronunciado com antecedência pede reflexões. Aquele cardeal é examinado, descobrem-se limites, é descarnado até ser retirado da competição.
Com o argentino Bergoglio, não foi assim.
Era uma possibilidade entre tantas. No quarto ou quinto escrutínio, não me lembro bem, foi eleito o Papa Francisco. Vê-se que era uma possibilidade difusa.
O Papa Francisco respeitou as expectativas?
O próprio Bergoglio afirmou várias vezes que está implementando a mensagem recebida do conclave.
O Sínodo não seguiu Francisco nos projetos de abertura aos divorciados em segunda união. A que ponto vocês chegaram?
Ainda estamos no tempo dos aprofundamentos. O tema nodal está no fato de que os coabitantes, casados civilmente ou não, enquanto estão ligados por um matrimônio contraído perante a Igreja, não observam um mandamento de Deus. Por isso, não podem receber a Eucaristia.
O papa admitiu que não podia julgar os casais homossexuais. Isso significa que o Vaticano vai aceitá-los?
Eu concordo com o papa, não podemos expressar um juízo de condenação. O juízo pertence a Deus. Mas não podemos omitir as avaliações de tipo objetivo para compreender se eles são conformes com uma lei moral, com uma visão cristã da vida, com o ensinamento da Igreja. Cito o Gênesis: Deus criou o homem à sua imagem, macho e fêmea. As crianças devem crescer com o amor materno e paterno.
O que o senhor pensa do sacerdócio feminino?
A Igreja sempre afirmou, com particular insistência, que o sacerdócio não pode ser conferido às mulheres. A justificação traz a vontade de Jesus. Não se vê uma mudança em perspectiva. As razões que são trazidas para compreender tal vontade divina são múltiplas. Certamente, não são aquelas que questionam a dignidade da mulher. A doutrina da Igreja sobre a igual dignidade do homem e da mulher é igualmente firme e remonta ao próprio Senhor.
O sacerdote deverá permanecer célibe?
Isso é mais do que uma simples conveniência. Não um dogma. Não é um dogma, porque, em alguns casos, a Igreja não o exige. E não é uma simples conveniência, porque remonta aos primeiros tempos da Igreja, que sempre reiterou a sua validade. O problema é a relação entre o sacerdote e os paroquianos. O padre está sempre à disposição dia e noite. A sua família é a dos fiéis. Como deveria viver se tivesse uma esposa e filhos? Os sacerdotes são úteis porque existem os fiéis, e não vice-versa.
Dos divorciados aos homossexuais, por que a Igreja exclui? Não é anacrônico?
O relativismo coloca qualquer coisa em suspenso, e a Igreja não pode seguir esse caminho. Cada comunidade tem as suas próprias regras, ressaltam o senso de pertença. Justamente para cumprir essa sua missão de salvação eterna, a Igreja não pode não chamar a atenção do fiel inobservante.
E a relação entre o Vaticano e a política mudou?
A Igreja não deve fazer política, ao menos de maneira direta. A nossa tarefa é a de anunciar o Evangelho e ter repercussões também sobre a política.
Hoje, como está a política italiana vista daqui, de uma janela que se assoma à colunata de São Pedro?
Ela é apressada, é indecifrável. Fala muitas vezes de reformas sem especificar a direção. Faltam à política as referências éticas. É dada mais importância às pesquisas do que a uma ideia de sociedade.
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''O conclave sempre descarna os favoritos.'' Entrevista com Velasio De Paolis - Instituto Humanitas Unisinos - IHU