18 Fevereiro 2015
"É um absurdo o que estão fazendo com a empresa, tanto as oligarquias partidárias e seus cúmplices corruptores do empresariado como os ataques para liquidar a companhia, vindos dos porta-vozes oficiosos do capital especulativo e do "mercado", escreve Bruno Lima Rocha, professor de ciência política e de relações internacionais.
Segundo ele, "tivéssemos uma base sindical ainda autêntica e com independência de classe e já haveria uma grande greve de ocupação na Petrobrás, como a de 1995 e a luta dos demitidos de 1992-1993. Na ausência desta ação soberana por um período prolongado, esta luta dos trabalhadores petroquímicos é um alívio e uma possibilidade de resistência".
Eis o artigo.
Diante do quadro complexo da maior empresa do Brasil, entendo ser necessária a produção de uma análise com maior profundidade, para além das posições de defesa e ataque do governo de turno. Este texto começo no ponto em que a direção da Petrobrás pedira renúncia e o “mercado”, sua mídia oficiosa e os algozes do desenvolvimentismo (de qualquer tipo) se juntaram para comemorar a possibilidade de vitória à frente da petroleira nacional.
Vamos começar constatando o óbvio. A renúncia de Graça Foster e o esquema de corrupção na Petrobrás são temas indiscutíveis e indefensáveis. Não há manobra ou malabarismo governista que possa defender esta posição e o modo como os agentes econômicos líderes do Brasil atravessaram os negócios da companhia. Sejamos francos, não se trata de uma novidade, a não ser o fato de vir à tona e trazer a alta direção das empreiteiras para as páginas policiais.
Mas, de fato, existe outro jogo simultâneo, que tampouco é defesa do governo, mas é a constatação de que há o interesse real de quebrar a empresa e modificar o sistema de exploração do pré-sal. Na noite da renúncia, na 4ª dia 04 de fevereiro, a mídia eletrônica brasileira foi bombardeada por especialistas pregando a necessidade de emplacar um "alto executivo com livre trânsito no mercado" para comandar a empresa mais importante do capitalismo brasileiro. Também houve a recomendação para sanear o endividamento da empresa a revisão do modelo de exploração do pré-sal, aliás, modelo este que já conta com a participação de transnacionais do petróleo.
Este jogo tem várias rodadas simultâneas e vai passar por uma aceleração de ataques (contra a Petrobrás) e um jogo de defesa do alto empresariado brasileiro, de modo que as empresas a ocupar o topo da cadeia alimentar no setor não sejam punidas. Do exterior, o famigerado The Economist já mostra suas garras, assim como as agências de "análise de risco", como Fitch e Moody's. Vem mais por aí. A meta agora é criar o ambiente propício para retirar o grau de investimento da Petrobrás e criar perdas artificiais que somadas às reais, tornem impossível o endividamento necessário para a exploração do pré-sal.
São vários conflitos e arenas simultâneas em torno da Petrobrás
Para dar continuidade, vamos desenvolvendo poucas ideias básicas. Primeiro, o debate dicotômico e maniqueísta, onde quem investiga e denuncia o Petrolão é da oposição e quem entende que há um ataque contra a empresa é governista, é algo limitado e que entendo temos de ir além. Houve no período do lulismo e no co-governo de centro-direita um acerto entre as oligarquias políticas de sempre (como PMDB e PP) e a chegada de um novo jogador. Este, no caso, a direção nacional do PT e a alocação de cargos em comissão e, ao que tudo indica, no tráfico de influência e advocacia administrativa, ambas as ações proibidas no Brasil.
Já o ataque contra a empresa é visível, pois se trata de um problema clássico dos "valores de mercado" X "a tecnocracia de Estado". A indicação do novo diretor-presidente Aldemir Bendine implica uma vontade política de controle por parte do Planalto sobre a empresa mais estratégica do país e não uma entrega para operadores de mercado ou executivos. A evocação do "mercado", este maldito sujeito oculto que sobre tudo opina e ninguém vê, é a vontade de que a Petrobrás sofreria alguém do tipo Joaquim Levy para comandá-la. Ainda nesta maldita evocação, existe uma confluência de interesses e visões de sociedade de que um Estado como o brasileiro não deveria comandar uma petrolífera e endividar-se ao ponto de arriscar sua solvência para garantir a exploração de recurso estratégico de longo prazo como o Pré-Sal.
Voltando às mazelas da gestão do lulismo à frente da empresa, nota-se que o país como ele é governou a empresa. Na divisão de cargos e dotações orçamentárias, houve a farra das empreiteiras e contratistas, regando interesses privados, partidários e empresariais através de relações privilegiadas. Este modus operandi é indefensável e deve ser severamente atacado.
A arena que ainda está oculta – ou parcialmente silenciada – é a da retomada da mobilização sindical dos petroleiros e no esforço para democratizar a empresa por dentro, como a célebre luta do antigo sindicato dos petroleiros do norte fluminense e a organização dos embarcados em plataformas de petróleo como a única saída com um corte menos voltado para o andar de cima - seja tecnicista ou neoclássico - para resguardar o patrimônio do povo brasileiro.
O sinal de alerta da (ex)-esquerda, conclamando novamente a esquerda restante para socorrer ao governo
O alerta está soando na (ex)-esquerda restante, aglutinada em torno da Carta Maior. Sei que estou devendo uma análise do caso Petrobrás mais fechada, mas com esta postagem eu agrego a constatação de que CartaCapital (capa da edição número 836, semana de 07 de fevereiro de 2015) tem razão ao colocar a ameaça de impeachment como concreta embora ainda improvável e que, voltando para a Carta Maior, o juiz Sergio Moro está impondo uma agenda republicana em nome de um jacobinismo (reconhecidamente presente desde os tempos da Operação Chacal e da Satiagraha) muito semelhante ao caso Falcone e o fim da moribunda ex-esquerda italiana. Trata-se do mesmo reconhecimento, já reincidente, com o apelo permanente de Emir Sader e cia. para uma concertação por esquerda na defesa deste governo de direita (o texto tem o título de “Urgente, falta uma ponte entre o apelo e a rua", Carta Maior, assinado por Saul Leblon, de 08/02/2015)
Com este comentário concluo o que resta para juntar os pedaços de análise e tentar interpretar em rasgos gerais o que pode estar ocorrendo no plano federal. A legitimidade do governo Dilma em sua segunda edição passa por um momento delicado. É óbvio que a direita derrotada em outubro aproveita a oportunidade para fortalecer esta campanha. O chamado 3o turno não terminou em dezembro, sendo 2014 o ano que insiste em não terminar. Este foi retro-alimentado pela CPI da Petrobrás e agora pela difusão das audiências e inquéritos da Lava-Jato. Se algo concordo com Emir Sader (surpreendentemente), é o fato de quem impõe a pauta e a agenda é o juiz Sergio Moro, titular da investigação. Infelizmente não é Fausto De Sanctis e a causa está atravessada dos oportunismos políticos de sempre.
O tema do impeachment de Dilma só pode vir a ocorrer se houver uma prova material contundente responsabilizando diretamente a presidente por alguns dos desmandos ou roubos ocorridos na Petrobrás quando de seu governo. Do contrário, vai reforçar ainda mais as direitas - dentro e fora do Planalto - e tornar a ex-esquerda que hoje ainda governa uma parcela do Poder Executivo em mera guarda-costas de um governo de coalizão, combalindo com o fogo amigo da "base aliada" e de correligionários da própria legenda de Lula e José Dirceu.
A única saída para a Petrobrás é o protagonismo de quem nela trabalha
Finalmente chegou ao caso da Petrobrás quem estava ausente ou tornado invisível. Espero que a manifestação dos funcionários do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), realizada contra as demissões no setor e ocupando metade da Ponte Rio-Niterói no dia 10 de fevereiro seja o início de alguma reação da força de trabalho dentro da empresa mais importante do país.
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A crise da Petrobrás e a agenda do 3º turno não terminado - Instituto Humanitas Unisinos - IHU