Por: André | 13 Fevereiro 2015
“Viemos para ver o Papa, porque ele é o nosso pai. E um pai não pode abandonar os seus filhos”. Nesta quarta-feira, quando Francisco falou na audiência sobre o vínculo sagrado que une pais e filhos, o palestino Nael Salman, prefeito cristão de Beit Jala, também recorreu ao léxico da família para explicar a missão que o levou a Roma, em companhia de Vera Baboun (a resoluta prefeita de Belém) e do prefeito de Beit Sahour Hani al-Hayek. Três prefeitos daquele que tempos atrás era considerado o “triângulo cristão” da Cisjordânia reuniram-se brevemente com o Papa, ao final da audiência geral. Em seguida, tiveram uma conversa de uma hora com o cardeal secretário de Estado Pietro Parolin, durante a qual lançaram um grito de alarma: “Se a política das expropriações decidida por Israel para construir o muro de segregação no Vale do Cremissan não se detiver – disse Vera Baboun ao Vatican Insider –, dentro de poucos anos toda a zona viverá sufocada pelo muro, e os primeiros a deixarem a área serão os cristãos. Não estamos falando somente de terrenos, de pedras e árvores: estamos falando da Igreja viva, na terra em que Jesus nasceu. Chegamos a um ponto limite, e todos, inclusive o Vaticano, devem assumir as próprias responsabilidades pelo que está acontecendo em uma terra que está no coração de todos os cristãos do mundo. Mostramos ao cardeal Parolin os mapas e as fotos que trouxemos. Ele nos ouviu com atenção e com muita preocupação”.
Fonte: http://bit.ly/1AlYv2G |
A reportagem é de Gianni Valente e publicada no sítio Vatican Insider, 11-02-2015. A tradução é de André Langer.
O que angustia os prefeitos cristãos da Cisjordânia é a situação que se vive no Vale do Cremissan. Segundo Vera e os demais prefeitos, não se trata apenas de uma das tantas sacudidas locais do conflito entre israelenses e palestinos: “se prevalecer a política do que o governo israelense já fez”, explicou Vera Baboun, “em nossas cidades já não haverá cristãos dentro de 20 anos. Nós estamos apenas indicando uma linha vermelha para a sobrevivência de uma presença cristã na zona de Belém. É uma questão que, creio, deveria interessar não apenas a nós”.
O Vale do Cremissan representa o principal “pulmão verde” para a população que vive na região de Belém. Há dois conventos e uma escola de salesianos, além de vinhedos e campos de oliveiras nos terrenos que pertencem a 58 famílias cristãs de Beit Jala. O traçado do muro de separação arquitetado por Israel, após ter dividido o território de Belém agora ameaça devastar toda a região, famosa por uma das paisagens mais bonitas de toda Terra Santa. É evidente, repetem os prefeitos em uníssono, que o plano do traçado “não responde a nenhuma exigência de segurança, e pretende apenas separar as pessoas das suas terras para podê-las confiscar e ampliar a zona das colônias israelenses que já ocuparam, nesse quadrante, a maior parte dos territórios palestinos”.
Nos últimos quase oito anos, existe uma disputa legal sobre o destino do Vale do Cremissan, que chegou à Suprema Corte de Justiça israelense. A Igreja local teve que desmentir em diversas ocasiões os rumores sobre a existência de um suposto “semáforo verde” vaticano para as escavadeiras israelenses. Todo o muro de separação construído por Israel foi condenado pelas resoluções da ONU, e a Corte Internacional de Justiça de Haia definiu a construção do muro e seus efeitos no dia a dia da população local “contrários ao direito internacional”.
No traçado do muro que ameaça o Vale do Cremissan, os efeitos da construção afetam diretamente as comunidades cristãs mais consistentes entre as que vivem nos territórios submetidos à Autoridade Palestina. “50% da população de Belém”, explicou Vera Baboun, “tem menos de 29 anos. Prender todos os cristãos dessa zona e separá-los de seu vínculo natural com Jerusalém tem um efeito direto em sua vida de fé. O muro entre Belém e Jerusalém é como uma barreira que divide o nascimento de Jesus de sua Ressurreição. E, se a zona do Cremissan for cercada e confiscada, a densidade populacional em nossa região atingirá níveis insustentáveis, entre os mais elevados do mundo, impelindo todo o mundo que puder a fugir”.
As razões dos camponeses cristãos do Cremissan encontram apoio inclusive entre os israelenses: o Council of Peace and Security, organismo que congrega os membros aposentados do aparelho militar israelense, propôs a criação de percursos alternativos para o traçado do muro e denunciou ao mesmo tempo a absoluta inadequação das propostas de “ajuste” ventiladas até agora pelo Ministério israelense da Defesa. Mas está se aproximando o tempo do veredicto definitivo das Cortes de Israel. E os apelos ao bom senso parecem não mudar a obstinação dos aparelhos governamentais.
“A verdadeira pergunta”, repete Vera Baboun, “é perguntar-se qual futuro queremos para Belém e para as outras cidades cristãs da Palestina. O Papa representa para nós a última possibilidade. Fazemos um apelo à sua responsabilidade de pai”.
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Prefeitos palestinos visitam o Papa: ajuda-nos a deter o muro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU