12 Fevereiro 2015
Um importante participante africano no iminente Sínodo dos Bispos sobre a família de outubro, disse na terça-feira que está aberto a permitir que os católicos divorciados e recasados civilmente recebam a Comunhão, desmentindo impressões de uma postura africana uniformemente hostil em relação à mudança sobre essas questões.
A reportagem é de John L. Allen Jr., publicada no sítio Crux, 11-02-2015. A tradução é de Claudia Sbardelotto.
O arcebispo Charles Palmer-Buckle (foto), de Accra, Gana, disse em uma entrevista que apoia a permissão de que bispos locais tomem essas decisões numa base de caso-a-caso, e também acredita que esse é o resultado que Papa Francisco deseja para o encontro de outubro.
Palmer-Buckle, 64 anos, é um dos quatro diretores do Simpósio das Conferências Episcopais da África e Madagascar (SECAM), grupo de bispos católicos do continente africano que se reuniu com o Papa Francisco no último sábado, em Roma.
No final de janeiro, Francisco confirmou a eleição de Palmer-Buckle por seus colegas bispos em Gana como um dos participantes do Sínodo dos Bispos, que será realizado no Vaticano de 04 a 25 de outubro.
Quando isso acontecer, Palmer-Buckle diz que está disposto a votar "sim" para a proposta do cardeal alemão Walter Kasper de permitir que católicos que se divorciaram e se casaram novamente fora da Igreja possam retornar à Comunhão sob certas circunstâncias.
"Quando uma pessoa vem a mim, eu acho que posso ser capaz de sentar-me com ele ou ela, ou com a família, e descobrir qual é a situação e dar soluções para casos individuais, sem fazer uma extensa declaração", disse Palmer-Buckle.
"Não é uma questão de emitir uma nova lei", disse ele. "Quanto à doutrina [sobre o casamento], eu não acho que a Igreja vai mudar. É uma questão de como podemos ajudar as pessoas".
Durante o Sínodo de outubro do ano passado, que preparou o debate que está acontecendo agora, profundas divisões surgiram sobre a proposta de Kasper. Em geral, os participantes africanos, como os cardeais Robert Sarah, da Guiné, uma autoridade do Vaticano, e Wilfrid Napier, da África do Sul, foram identificados com a oposição conservadora.
Famosamente, em um ponto, Kasper foi citado dizendo que "os africanos não devem nos dizer muito o que temos de fazer". Mais tarde, ele pediu desculpas se o comentário pareceu desrespeitoso, mas ele simbolizava o que foi visto como uma divisão nítida entre africanos e europeus.
Palmer-Buckle disse ao Crux, no entanto, que essa é uma avaliação excessivamente simplista.
Os pastores na África, disse ele, na verdade, enfrentam uma grande variedade de situações conjugais, e alguma flexibilidade para lidar com elas lhes seria útil. Ele disse que a paisagem não inclui apenas o divórcio convencional, mas também o levirato - o casamento onde a viúva é obrigada a se casar com o irmão de seu marido morto - e a poligamia.
"Eu vou te dizer, a Igreja na África não está apenas dizendo 'divórcio, não'", disse ele. "Se olharmos para os nossos próprios desafios pastorais, deve haver espaço para ouvir e ver como podemos acompanhar pastoralmente quem quer pertencer cada vez mais a Cristo".
Palmer-Buckle descreveu o caso de uma mulher casada com o mesmo homem por 35 anos, criou os filhos com ele, mesmo ele tendo uma ou duas outras esposas.
"Se eu quiser aplicar a lei como está, devo dizer a ela para sair do casamento", disse ele. "Mas se eu fizer isso, ela e seus filhos vão dizer: 'A Igreja destruiu a minha família". Como bispo, eu lhe confesso, tem noites que não consigo dormir".
Nesse contexto, disse ele, um bispo deve ser capaz de agir como um médico, olhando para todos os "medicamentos que a Igreja tem na prateleira", e decidir qual deles funciona melhor para um determinado paciente. Ele sugeriu que esse parece ser o resultado que o Papa Francisco deseja.
"A verdade da questão é que o Santo Padre está falando nesse sentido, quando fala sobre a colegialidade", disse ele.
"O Santo Padre deixou claro que a doutrina da Igreja continua a ser o ponto de perfeição, o ponto de chegada, mas todos nós estamos feridos", disse Palmer-Buckle. "É por isso que Cristo veio, para os doentes, os feridos e os necessitados".
"Se uma pessoa está ferida em seu casamento e está tendo dificuldade, o que você faz?", disse. "É sobre isso que a Igreja está debatendo".
Palmer-Buckle repudiou impressões de que haverá uma linha uniforme africana no sínodo, hostil a todo e qualquer desvio da tradição sobre a família ou a moralidade sexual.
"Esta é a mentalidade do mundo, tudo tem que ser preto e branco", disse ele. "Eu não acho que nós [africanos] somos tão dogmáticos e rígidos".
Em outros assuntos, Palmer-Buckle afirmou que aquilo que o Papa Francisco recentemente descreveu como "colonialismo ideológico", ou seja os esforços de organizações não-governamentais (ONGs) e agências internacionais para forçar o mundo em desenvolvimento a adotar uma ética sexual liberal em questões como o aborto e contracepção, não é apenas uma hipótese.
"É muito real, 100% real. A pressão definitivamente existe", disse ele. "Ela está vindo do Banco Mundial, do Fundo Monetário Internacional, do Fundo de População [das Nações Unidas] ... todos eles vêm com essas ideologias".
"É tão secular, é quase anti-religiosa, e é defendida por todas essas agências e ONGs", disse ele.
Palmer-Buckle, disse que, quando ele era bispo da pequena diocese de Koforidua, em Gana, na década de 1990, ele era responsável por quatro hospitais e 11 clínicas, com uma base de clientes que tinha 85% de não-católicos e concentrava-se entre as pessoas mais pobres e rurais do país. No entanto, ele não conseguiu obter o apoio das Nações Unidas, disse ele, porque suas instalações não distribuíam contraceptivos ou ofereciam aborto.
"Eu não conseguia obter dinheiro para cuidar da malária porque não tínhamos as 'posições corretas' sobre a questão do gênero e assim por diante", disse ele.
Palmer-Buckle disse que o Papa Francisco tem um carisma especial na África, e previu que a sua viagem à Uganda e à República Centro Africana no final de 2015 será um sucesso.
"Ele parece ser muito um pastor. Ele fala a língua de um pai, de modo simples e direto", disse ele. "As pessoas comuns na África amam os papas, e este em particular".
Como um dos quatro diretores executivos da SECAM, Palmer-Buckle disse que a organização está solicitando o status de observador junto à União Africana, que tem sua sede em Addis Abeba, na Etiópia. Ele disse que os bispos do continente querem que a SECAM seja reconhecida como uma organização autoritária, em parte para dar à Igreja africano uma maior voz.
"A África tem amadurecido, e está gradualmente tomando o seu lugar com uma igualdade plena, tanto no cenário internacional quanto na Igreja Católica internacional", disse ele.
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Importante prelado africano apoia comunhão para divorciados e recasados - Instituto Humanitas Unisinos - IHU