Por: André | 02 Fevereiro 2015
A pessoa que atende seu telefone fala grego, mas na segunda tentativa de comunicação Costas Isychos responde com cordialidade no castelhano que falou desde a infância. O novo vice-ministro da Defesa do governo formado pelo Syriza e liderado por Alexis Tsipras, nasceu em Quilmes em 1957, deixou a Argentina durante a última ditadura com sua família – seus pais eram militantes comunistas – e já passou mais da metade da sua vida em Atenas, onde consolidou sua trajetória política. Da Argentina conserva alguns costumes, como seu gosto pelo mate e pelo doce de leite. Cultiva seu fanatismo pelo Independiente e reivindica que “no século passado [a Argentina] recebeu milhões de refugiados econômicos que vinham da Europa”.
Fonte: http://bit.ly/1zmQeJB |
Acaba de nomeado para trabalhar em uma carteira cuja condução compartilhará com o ministro Panos Kammenos, líder do partido de direita Gregos Independentes, que deu ao Syriza os votos necessários para que formasse governo. Isychos representa a Corrente de Esquerda dentro do governo, o setor mais combativo da força conduzida por Tispras.
A entrevista é de Gustavo Veiga e publicada no jornal argentino Página/12, 30-01-2015. A tradução é de André Langer.
Eis a entrevista.
Como será sua convivência na Defesa com Kammenos, um político vinculado à Igreja ortodoxa, que questiona o casamento homossexual e defende um discurso anti-imigrante?
Teremos que conviver com respeito, embora isso não signifique que sejamos um casamento ideológico e programático. O Gregos Independentes tem estratégias sobre imigração que não compartilhamos, mas apóia o programa do Syriza na sua totalidade. Nós precisávamos de mais duas cadeiras no Parlamento para ter maioria e foi um apoio fundamental.
Por quê?
Porque não podíamos ir a novas eleições dentro de 30 ou 40 dias com o risco que isso trazia embutido, o de que não pudéssemos formar governo. Não podíamos, além disso, submeter o povo grego a uma incerteza como essa. Agora temos que trabalhar e lutar.
Você é um especialista em Relações Internacionais. Além disso, foi mencionado para ocupar o cargo de vice-chanceler. Por que, no final das contas, foi nomeado para a Defesa?
Assume-se a função que lhe é designada como soldado e não como general. É verdade, eu era responsável pela Política Internacional no partido, mas também tinha sido designado para os temas da Defesa e da Segurança Pública.
Quais são as principais hipóteses de conflito que ventila em seu ministério?
A primeira coisa que devemos fazer é trabalhar muito e lutar para conservar a precária estabilidade que existe em uma região muito complicada do mundo como esta. Uma zona onde há muitas disparidades, com guerras internacionais, guerras civis e um mapa de conflitividade que vai do Oriente Médio até quase todo o norte da África. O papel que a Grécia deverá exercer nesse contexto é de paz.
Em que medida se expressa na área da Defesa a gravíssima situação econômico-social em que se encontra a Grécia?
Vou lhe dar um exemplo. Do ministério dependem sete fábricas com milhares de pessoas que foram atacadas e maltratadas de todas as maneiras possíveis por políticas ultraliberais que as converteram em fábricas sem trabalho, sem futuro, sem projeção estratégica. Agora queremos criar emprego digno, que as pessoas se sintam identificadas novamente com o que faziam. É uma grande responsabilidade para o Syriza cumprir o programa votado pela maioria do povo grego.
Como qualificará a situação em que a sua força política recebeu o país?
Como uma catástrofe que durou quatro anos, uma bomba econômica que explodiu sobre as massas mais empobrecidas, os trabalhadores, os comerciantes, os camponeses, todos aqueles que viviam de um salário ou renda que já não têm. A Grécia perdeu grande parte da sua soberania e nós tentaremos recuperá-la em base ao programa do Syriza. Temos que realizar uma auditoria sobre a dívida pública, aumentar o imposto das grandes empresas, combater o segredo bancário e a evasão de capitais e, no que tange ao meu ministério, diminuir drasticamente o gasto militar.
Acredita que o povo grego, inclusive quem não votou em vocês, estará com vocês?
Há muita esperança no nosso povo, percebo isso nas ruas, desde antes de assumir o governo e agora mais ainda. Estou no cargo de vice-ministro desde terça-feira, isto apenas está começando.
Você morou na Argentina até 1980, quando sua família deixou o país rumo ao exílio no Canadá. Que laços você ainda conserva com a terra onde nasceu?
Para começar, meus afetos. Ainda tenho muitos parentes por parte do meu pai em Quilmes, Avellaneda, Lanús e Banfield. Estou orgulhoso de ser argentino e grego, para mim é muito especial. Também tenho muitos amigos, companheiros em partidos políticos de esquerda, a quem tive a oportunidade de ver na minha última viagem há dois anos, quando acompanhei Tsipras na visita a Buenos Aires e ao Congresso.
Que costumes não perdeu da sua vida na Argentina, mesmo com a passagem dos anos?
Continuo tomando meu mate com naturalidade, gosto do doce de leite, embora a minha mulher se queixe dizendo que me faz engordar. E, evidentemente, acompanho o time de toda a vida; sou fanático pelo Independiente.
Na imprensa nacional e internacional saiu publicado que você abandonou o país em 1980, durante a última ditadura civil-militar. O que poderia nos dizer sobre essa história?
Peço-lhe desculpas, mas prefiro não falar do passado e sim do futuro, onde temos muitas coisas para fazer. A Grécia tem que sair desta situação dramática, é o que nos ocupa neste momento.
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“Agora queremos criar emprego digno”. Entrevista com membro do novo governo grego - Instituto Humanitas Unisinos - IHU