05 Dezembro 2014
A presidente Dilma Rousseff participa nesta sexta-feira da reunião de chefes de Estado dos países da União Sul-americana de Nações (Unasul), em Quito, no Equador, em meio a críticas de que o Brasil teria perdido interesse nesta integração - que começou por iniciativa brasileira.
O cientista político argentino Rosendo Fraga, do Centro de Estudos Nova Mayoría, disse que o papel do Brasil "como potência global" acabou deixando sua política regional "um pouco no segundo plano".
A reportagem é de Marcia Carmo, publicada por BBC Brasil, 04-12-2014.
Para Fraga, a Unasul foi "instrumento prioritário" na política exterior brasileira na primeira década do século XXI, mas depois perdeu importância.
"O Brasil impulsionou a Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos) os Países, que reúne todos os países da América Latina, e o âmbito global passou a ter maior peso na política exterior brasileira, com seu papel nos Brics e no G20".
O cientista político chileno Ricardo Israel, ex-candidato presidencial, diz que a Unasul "foi uma criação do Brasil", mas que o país "não quis exercer a liderança que lhe correspondia e a deixou nas mãos dos bolivarianos", em uma referência a Venezuela, Equador e Bolívia.
O professor de ciências políticas e estudos internacionais da universidade Torcuato Di Tella, de Buenos Aires, Juan Gabriel Tokatlian, compartilha dessa visão. "Apesar de o Brasil ter sido decisivo para a criação da Unasul, passou a lhe dar menor relevância desde a mudança presidencial de Lula para Dilma", afirmou.
No entanto, o professor da Universidade Untref, de Buenos Aires, Félix Peña, disse que percebe o Brasil "bastante envolvido" na Unasul, principalmente após o primeiro dia de reunião, um encontro de chanceleres e ex-chefes de Estado em Guayaquil, onde o ex-presidente Lula fez um discurso sobre a integração regional e foi bastante aplaudido pelos presentes.
"Eu acho que o fato de o Brasil ser Brics e impulsionar a Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos) não diminui em nada seu interesse e decisão de levar a Unasul cada vez mais adiante."
"Uma coisa não prejudica a outra, um grupo não limita o outro. Ao contrário. E para mim esse interesse do Brasil ficou claro no encontro em Guayaquil", disse Peña, falando da capital argentina.
Segundo ele, as palavras de Lula "refletem o mesmo apoio" da presidente Dilma à Unasul. Procurado pela BBC Brasil, o Itamaraty não respondeu às críticas dos outros analistas.
Na quarta-feira, em Guayaquil, ao lado do ex-secretário-geral da Unasul, o ex-presidente colombiano Ernesto Samper, Lula disse que a região tem conseguido resolver seus próprios problemas e sem interferência externa, como a dos Estados Unidos. "Se não podem ajudar, que não atrapalhem", disse.
E acrescentou: "A integração é uma solução e não um problema", afirmou. Ele fez elogios ao processo de paz liderado pelo atual presidente colombiano Juan Manuel Santos com o grupo guerrilheiro Farc, elogiou ainda a postura da Argentina na disputa com financistas internacionais e recordou os ex-presidente Hugo Chávez, da Venezuela, e Nestor Kirchner, que morreram, pelo apoio que deram à Unasul. Seu discurso foi transmitido ao vivo pelas TVs equatorianas.
Democracia
Os analistas argentinos, chilenos e uruguaios ouvidos pela BBC Brasil concordaram que a Unasul mostrou ser "efetiva" em vários momentos na hora de "defender a democracia", mas que o mesmo empenho não ocorreu em questões como a integração física e de infraestrutura, por exemplo.
"A Unasul foi eficiente para preservar as democracias, como demonstrou nos casos do Paraguai, da Bolívia, da Venezuela e do Equador (que viveram diferentes turbulência políticas)", disse o professor uruguaio de história e de ciências políticas da Universidade da República, de Montevidéu, Gerardo Caetano.
"Mas a Unasul poderia ter avançado em outras áreas como a infraestrutura", afirmou.
Na mesma linha, falando de Santiago, no Chile, o professor de ciências políticas da Universidade de Valparaíso Guillermo Holzmann afirmou que ocorreram avanços na área de defesa, com a criação e desenvolvimento do Conselho Sul-americano de Defesa, que possibilitou a "transparência dos orçamentos de defesa e metodologias de comparação de gastos no setor", mas, ressalvou, com avanços "tímidos" na área de energia, entre outras.
"A verdade é que a Unasul tem tarefas pendentes", disse Holzmann.
Num artigo no jornal espanhol El País, Tokatlian afirmou que a criação da Unasul foi "transcendental" na América do Sul, mas nos últimos anos, disse, ela "parece estar perdendo o norte".
A Unasul reúne Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai, Venezuela, Colômbia, Peru, Chile, Bolívia, Equador, Suriname e Guiana. Uma união que inclui tanto países do Mercosul, ancorado na união aduaneira, como da Aliança do Pacífico, baseado no livre comércio.
Dilma
A presidente Dilma desembarcará diretamente em Quito, nesta quinta, e não participou das atividades com chanceleres e outros presidentes na cerimônia de transmissão da presidência temporária da Unasul do Suriname para o Uruguai em Guayaquil, a trinta e cinco minutos de voo da capital equatoriana.
Nesta sexta, ela participa da reunião com os presidentes da Unasul e da inauguração da sede da Unasul - um edifício moderno que teria custado ao governo equatoriano US$ 38 milhões e se chamará Nestor Kirchner, em homenagem ao ex-presidente argentino morto em 2010, de acordo com o jornal La Nación, de Buenos Aires.
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Dilma chega a Quito em meio a críticas de 'perda de interesse' na Unasul - Instituto Humanitas Unisinos - IHU