05 Dezembro 2014
Enquanto mais de 190 países se reúnem em Lima, no Peru, para discutir como superar o desafio das mudanças climáticas, bancada ruralista tenta votar nesta quarta-feira (3) duas propostas que visam paralisar a demarcação de Terras Indígenas e outras áreas protegidas – um dos mecanismos mais eficientes para a proteção da floresta.
A reportagem é publicada pelo Greenpeace Brasil, 03-12-2014.
Duas propostas que restringem drasticamente os direitos territoriais das populações tradicionais podem entrar em votação no Congresso Nacional nesta quarta-feira 3 de dezembro. Se aprovadas, as medidas abrirão caminho para o maior golpe político da história recente contra os direitos dos povos tradicionais, inviabilizando na prática a demarcação de novas Terras Indígenas (TIs), a criação de Unidades de Conservação (UCs) e a titulação de Territórios Quilombolas, instrumentos fundamentais para o combate ao desmatamento.
Ao comprometer o modo de vida de populações locais e negar os direitos dos povos tradicionais sobre seus territórios, as propostas colocam em risco também o enfrentamento às mudanças climáticas e o futuro do planeta.
Para o Greenpeace, o projeto é baseado em ideias preconceituosas e promove uma perigosa e falsa oposição entre a manutenção dos direitos indígenas e o crescimento do agronegócio nacional.
A Mobilização Nacional Indígena, rede de organizações coordenada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, promove um tuítaço nesta quarta, a partir das 10h30, contra as propostas. Participe!
O parecer da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/2000, apresentado pelo deputado ruralista Osmar Serraglio (PMDB-PR), deve ser apreciado na Comissão Especial que analisa a matéria, às 14h30, no Plenário 12 da Câmara Federal. Já a Comissão Mista de regulamentação da Constituição deve votar o Projeto de Lei (sem nº) que regulamenta o Art. 231 da Constituição Federal, de autoria do senador Romero Jucá (PMDB-RR), às 14h, no Plenário 13 da Ala Alexandre Costa do Senado.
Representantes da Sociedade Civil e indígenas das etnias Ava-Canoeiro, Apinajé, Krahô, Tapuia, Kanela do Tocantins, Xerente e Karajá de Xambioádo, todas do Tocantins, estarão em Brasília para realizar mobilização contra as propostas.
Abrindo as portas para o desmatamento
Apresentado por Serraglio como um substitutivo, o novo relatório da PEC 215 propõe uma ampla gama de exceções ao direito de posse e usufruto das terras por parte dos povos indígenas, além de inviabilizar novas demarcações e legalizar a invasão, a posse e a exploração de terras indígenas demarcadas. O projeto transfere, ainda, do Executivo para o Legislativo a prerrogativa de aprovar a oficialização de TIs, UCs e territórios quilombolas e adota a data de promulgação da Constituição (5/10/1988) como “marco temporal” para comprovar a posse indígena. Ou seja: a comunidade teria direito à terra apenas se puder demonstrar que ocupava o território nessa data (saiba mais).
A outra proposta que pode entrar em votação, o Projeto de Lei Complementar que regulamenta o Art. 231 da Constituição Federal,éassinado pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR), ex-líder do governo no Senado – que também é relator do controverso parecer sobre a regulamentação da PEC do Trabalho Escravo. A proposta classifica propriedades rurais como “área de relevante interesse público da União”. Como consequência, o projeto estabelece que essas áreas poderão ser excluídas da delimitação das terras indígenas se seus títulos de ocupação forem “considerados válidos” ou poderão ser objeto de desapropriação ou de compensação com outra área ofertada pela União. Dessa forma, o projeto transforma interesses privados em “de relevante interesse público da União”.
Jogo de interesses
Em agosto deste ano a Polícia Federal interceptou uma ligação que indicaria interferência indevida de ruralistas no processo de elaboração da relatoria da PEC 215. Segundo a investigação, que culminou na prisão de Sebastião Ferreira Prado, líder da Associação de Produtores Rurais de Suiá-Missú (Aprossum), na gravação Prado pede contribuição para uma “vaquinha” de R$ 30 mil, que seria usada para pagar um advogado ligado a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) para produzir o relatório e “colocar as coisas de interesse nosso”, como disse o ruralista.
Na época, a Justiça Federal em Mato Grosso considerou que os fatos representavam “um desvirtuamento da conduta do parlamentar responsável pela elaboração da PEC, eis que a CNA é parte política diretamente interessada no resultado da mencionada PEC”.
Pasto fértil para engorda da bancada ruralista
O governo de Dilma Rousseff foi o que menos demarcou TIs, desde a redemocratização do Brasil. Enquanto a média de demarcações do governo de José Sarney foi de 13 TIs por ano de governo, o governo Dilma tem média pífia de 3,6 TIs/ano.
Em outubro passado, no auge da campanha eleitoral, Dilma Rousseff garantiu em carta aberta que, se reeleita, se empenharia para mudar este cenário e que considerava a PEC 215 inconstitucional. “Nada em nossa Constituição será alterado com relação aos direitos dos povos indígenas! De todas as justas reivindicações apresentadas não tive dúvidas sobre a questão da inconstitucionalidade da PEC 215”, afirmou.
De acordo com o Rômulo Batista, da campanha da Amazônia do Greenpeace, se no cenário atual as propostas já possuem forte chances de passar no Congresso, graças a força da bancada ruralista, com a nova configuração das casas legislativas, a costura política do agronegócio se tornará ainda mais intensa.
“A única possibilidade de isso não acontecer é a presidente Dilma se empenhar para que a PEC não seja aprovada, honrando sua promessa de campanha. Agora é preciso que o governo mostre sua força e tenha uma atuação incisiva para que este tipo de proposta não siga adiante”, afirma Batista. Saiba mais aqui.
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Para manter a floresta em pé, PEC 215 deve cair - Instituto Humanitas Unisinos - IHU