26 Novembro 2014
O Papa Francisco disse que se, por um lado, o autodeclarado Estado Islâmico no Iraque e outros grupos extremistas representam um perigo real, por outro o “terrorismo de Estado” também representa um perigo que, segundo ele, gera uma “anarquia de alto nível”.
A reportagem é de John A. Allen Jr., publicada por Crux, 25-11-2014. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Em observações feitas a jornalistas a bordo do avião papal após a viagem de um dia a Estrasburgo, Francisco não apontou nenhum Estado em específico como culpado de praticar terrorismo. Os seus comentários, no entanto, claramente constituíram uma nota de precaução a respeito dos ataques militares unilaterais contra o ISIS e outros grupos, sejam estes liderados pelos EUA ou por qualquer outro país.
Papa Francisco, ao lado do Pe. Lombardi, na entrevista concedida a bordo do avião que o levou até Estrasburgo, no dia de ontem, 25-11-2014.
Foto: AP
Na mesma ocasião, Francisco também abordou um novo escândalo de abuso sexual, desta vez na Espanha, envolvendo 10 padres no mínimo. Disse que “a verdade é a verdade, e nós não devemos escondê-la”.
Os comentários desta terça-feira vieram depois que o papa proferiu dois discursos importantes: um ao Parlamento Europeu e outro ao Conselho da Europa.
O pontífice definiu o terrorismo de Estado como “quando cada Estado se sente no direito de massacrar os terroristas”.
Quando um país lança uma reposta indiscriminada, falou, “caem muitos que são inocentes”. Disse que “nenhum Estado tem o direito, por si próprio, de deter um agressor injusto”, na falta de um “consenso internacional”.
Tais observações pareceram calculadas para reformular uma resposta anterior do pontífice dada no último mês de agosto a respeito dos ataques aéreos liderados pelos Estados Unidos contra o Estado Islâmico, na viagem de volta da Coreia do Sul. Na ocasião, Francisco disse ser “legítimo deter um agressor injusto”, o que foi interpretado como uma aprovação papal limitada da ação norte-americana.
Embora Francisco não tenha apontado nenhum país em particular como culpado de praticar terrorismo de Estado, trata-se de uma acusação que, há muito, os palestinos dirigem às políticas de segurança israelenses, e que outros aplicaram às intervenções militares norte-americanas em várias partes do mundo.
O pontífice também insistiu que “a porta está sempre aberta”, apesar de parecer “quase impossível” um diálogo com o autoproclamado Estado Islâmico que, atualmente, ameaça grande parte do Oriente Médio.
Num outro fronte, Francisco disse também que recebeu as acusações criminais recentes contra vários padres na Espanha com “grande pesar”, mas que “a verdade é a verdade, e nós não devemos escondê-la”.
Segundo relatos da imprensa espanhola, neste caso Francisco teria desempenhado um papel na exposição de uma rede criminosa de pedofilia em Granada, Espanha, que envolve 10 padres pelo menos.
Em agosto, uma das supostas vítimas, hoje professor universitário identificado apenas como “Daniel”, teria escrito ao papa para descrever o abuso sofrido e buscar aconselhamento. Francisco encorajou-o a seguir em frente, notificando as autoridades civis. Isto conduziu tanto a uma investigação policial quanto a procedimentos disciplinares por parte da Igreja contra os padres acusados.
Nesta terça-feira, Francisco confirmou esta versão dos eventos.
“Recebi e li a carta”, disse o Papa Francisco a respeito da correspondência da vítima. “Telefonei para a pessoa e disse: ‘Amanhã, vá até o seu arcebispo’. Escrevi ao arcebispo de forma que ele pudesse dar início ao seu trabalho, investigar, ir adiante”.
O histórico deste papa relativo aos escândalos de abusos sexuais vem atraindo opiniões diversas.
Por um lado, uma nova comissão antiabuso criada por ele está pondo em prática uma variedade de projetos, e o próprio papa lançou uma investigação sobre Dom Robert Finn, da Diocese de Kansas City-St. Joseph, até o momento o único bispo americano criminalmente condenado por não notificar às autoridades civis um caso de abuso infantil em sua jurisdição.
Por outro lado, nesta semana o jornal The Boston Globe informou que o nomeado do papa para ser o promotor de justiça no departamento doutrinal do Vaticano, com efeito o principal procurador para casos de abusos sexuais, era um dos vários jesuítas que, por mais de uma década, permitiram que um notório abusador permanecesse no ministério.
Na esteira da forte retórica papal desta terça-feira no Parlamento Europeu e no Conselho da Europa, que incluiu incisivos apelos em nome dos imigrantes, dos desempregados e do meio ambiente, bem a sua crítica do “culto à opulência, o que se tornou insustentável”, Francisco foi perguntado se ele é um “papa social-democrata”.
Na política europeia, os social-democratas tendem a ser a principal formação de centro-esquerda, por vezes sendo o equivalente aproximado dos democratas americanos.
Sorridente, o pontífice descreveu a questão como “reducionista”.
Disse que não quer representar nenhum segmento político. Pelo contrário, quer representar “a mensagem do Evangelho” e o “ensino social da Igreja”.
O papa limitou o escopo desta troca com os jornalistas ao conteúdo de sua viagem a Estrasburgo, diferentemente das coletivas realizadas na volta de outras viagens internacionais.
O líder religioso disse também que, embora nenhuma visita à França esteja agendada, ele planeja, sim, fazer uma em algum momento. Além de Paris e do santuário de cura em Lourdes, falou, ele pediu para ir a “alguma cidade a que um papa nunca chegou a ir”.
Sobre a questão do tráfico humano, um problema social central para o papa, ele disse que “a escravidão é uma realidade que se insere em nossa realidade social de hoje”, e que “não devemos fechar os olhos para ela”.
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Papa fala sobre “terrorismo de Estado” e pedofilia em coletiva de imprensa a bordo do avião papal - Instituto Humanitas Unisinos - IHU